Boa parte de um vasto material recolhido em muitos anos de pesquisas está disponível nesta página para todos os que se interessam em conhecer o futebol e outros esportes a fundo.

sexta-feira, 30 de maio de 2008

O clube mais poderoso do mundo

Com toda certeza vai ser uma tarefa difícil para qualquer campeão continental derrotar o Manchester United Football Club, o clube de futebol mais poderoso do mundo. É o campeão da Europa e grande favorito a colocar seu nome no seleto grupo de clubes campeões do mundo da Federação Internacional de Futebol Associação (FIFA). Até agora somente S.C. Corinthians Paulista (2000), São Paulo F.C. (2005), S.C. Internacional (2006) e A.C. Milan (2007) conseguiram a proeza. Em dezembro, os clubes campeões dos seis continentes e mais o campeão japonês, têm encontro marcado nos gramados do Japão.

Por enquanto, três participantes do Mundial são conhecidos: Pachuca Club de Fútbol, do México, vencedor da Confederação de Futebol da América do Norte, Central e Caribe (Concacaf), Waitakere United de Nova Zelândia, campeão da Confederação de Futebol da Oceania (OFC) e o Manchester United, representante da União das Associações Européias de Futebol (UEFA) tem vagas asseguradas na competição. Falta saber quem irá representar a América do Sul, África, Ásia e Japão.

O Manchester United, que este ano comemora 130 anos nasceu modestamente, como outros grandes clubes do mundo. Foi fundado em 1878 com o nome de Newton Heath LYR (abreviatura para Lancashire e Yorkshire Railway) Football Club. Não existem dados oficiais que confirmem o dia e o mês da fundação do clube. O que se sabe de concreto é que era o time dos operários do depósito da Cia. Ferrovia de Lancashire e Yorkshire, que trabalhavam em Newton Heath, para jogos contra outros departamentos da empresa e companhias do ramo.

Em 1888, quando foi criada a Football League, a principal do futebol inglês na época, o Newton Heath abdicou de disputar o campeonato, por não se achar em condições de enfrentar equipes mais fortes. Somente em 1892 se filiou a Liga, já com o nome de Newton Heath Football Club e sem o patrocínio da companhia.

Em 1902, com a profissionalização enfrentou graves problemas financeiros e quase fechou as portas. Foi quando surgiu à figura salvadora de John Henry Davies, dono de uma cervejaria e que decidiu investir no clube. De cara fez algumas mudanças estruturais, entre elas a troca do nome da agremiação. Em 26 de abril de 1902 surgiu o Manchester United F.C.. As cores do uniforme também foram modificadas: o amarelo e verde do Newton Heath deram lugar ao vermelho e branco.

Depois de disputar alguns campeonatos da segunda divisão, o Manchester United subiu para a primeira divisão inglesa na temporada 1905/1906. E já em 1908/1909 se sagrava campeão inglês e da Supercopa da Inglaterra. Em 1910/1911, repetiu o feito. Depois veio a decadência. A paralisação do futebol inglês, em razão da Primeira Guerra Mundial (1914/1919) foi determinante para isso. No retorno das competições, o time, que já vinha mal, acabou caindo para a segunda divisão na temporada 1921/1922. O retorno à elite do futebol inglês aconteceu em 1924/1925. Em 1930/1931, um novo rebaixamento.

A falência era iminente. E mais uma vez surgiu alguém para evitar a catástrofe. Dessa feita foi um empresário chamado James Gibson que salvou o Manchester United da extinção, investindo 30 mil libras esterlinas. Apesar da resolução dos problemas financeiros, o desempenho dentro de campo não se mostrou satisfatório. Em 1933/1934, por pouco não foi parar na terceira divisão.

Em 1935/1936, depois de uma série sensacional de 19 jogos invictos na segunda divisão, voltou a integrar a categoria principal. Mas não conseguiu se firmar e caiu mais uma vez. Na temporada seguinte garantiu novo retorno a elite. Com a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) o campeonato inglês foi paralisado. Em 1946/1947 a competição recomeçou e o Manchester United foi vice-campeão, atrás apenas do campeão Liverpool.

Seguiram-se anos de calmaria e conquistas. Em 1948, a Copa da Inglaterra. Em 1951/1952 o campeonato Inglês, feito que não conseguia desde 1911. Em 1955/1956 e em 1956/1957, o primeiro bicampeonato. O time da década de 50 foi um dos melhores da história do Manchester. Em 6 de fevereiro de 1958, aconteceu o inesperado: um acidente que ficou conhecido como o desastre aéreo de Munique. Um avião que levava atletas do clube caiu, e 22 pessoas morreram entre elas sete jogadores.

Depois disso o time teve que ser remontado. Os bons resultados não demoraram para reaparecer: em 1962/1963, a conquista da Copa da Inglaterra. Na temporada 1964/1965, o campeonato inglês e o direito de participar da Copa Européia, atual Liga dos Campeões que dava os primeiros passos. Os anos de ouro da década de 60 não duraram muito. Em 1974, o time foi mais uma vez rebaixado para a segunda divisão, onde passou uma temporada. Em 1977, foi campeão da Copa da Inglaterra.

A partir daí o Manchester se mantém entre os grandes. Se na década de 1980 não teve conquistas importantes – o domínio foi do Liverpool – nos anos que se seguiram não teve motivos para reclamar. Destaque para o título de Campeão da Copa Toyota, antigo Mundial de Clubes, ganho em 1999 com uma vitória de 1 X 0 sobre o brasileiro Palmeiras. Até este ano de 2008, ganhou quase tudo que um clube pode aspirar, culminando com duas conquistas históricas: campeão inglês de 2007/2008 e também da Liga dos Campeões de 2008, com uma vitória nos pênaltis sobre o Chelsea, no jogo final.

O popular clube inglês é dono de muitos títulos: campeão inglês por 17 vezes, nos anos de 1907/08, 1910/11, 1951/52, 1955/56, 1956/57, 1964/65, 1966/67, 1992/93, 1993/94, 1995/96, 1996/97, 1998/99, 1999/00, 2000/01, 2002/03, 2006/07 e 2007/08. Copa da Inglaterra em 11 oportunidades: 1908/09, 1947/48, 1962/63, 1976/77, 1982/83, 1984/85, 1989/90, 1993/94, 1995/96, 1998/99 e 2003/04. Copa da Liga Inglesa por duas vezes: 1992 e 2006. Super Copa da Liga Inglesa, em 16 oportunidades: 1908, 1911, 1952, 1956, 1957, 1965, 1967, 1977, 1990, 1983, 1993, 1994, 1996, 1997, 2003 e 2007. Supercopa Européia (Atual Copa da UEFA), duas vezes, 1968 e 1991. Recopa Européia (Supercopa da UEFA), uma vez, 1991. Liga dos Campeões, em três oportunidades, 1968, 1999 e 2008 e Campeão Intercontinental em 1999.

O estádio do Manchester United é o Old Trafford, apelidado pelo ex-jogador e maior ídolo da história do clube, Bobby Charlton, como o “Teatro dos Sonhos”. O terreno onde se localiza o estádio foi comprado pela cervejaria de John Henry Davies e arrendado ao clube. Ele também foi o financiador da construção do estádio, iniciada em 1908. Com capacidade para 80 mil pessoas, o Old Trafford foi inaugurado em 19 de fevereiro de 1910, com uma derrota do Manchester United para o Liverpool por 4 X 3.

O Old Trafford foi bombardeado durante a 2ª Guerra Mundial e só voltou a receber jogos em 1949, após ser reconstruído, com capacidade para receber 67 mil torcedores. Nesse período, o clube mandou os jogos no estádio do rival Manchester City. No ano passado foram inauguradas novas reformas, que tornaram o Old Trafford o segundo maior estádio da Inglaterra, podendo receber 76 mil pessoas sentadas. O novo estádio de Wembley, com capacidade para 90 mil assistentes é o maior de todo o Reino Unido.

O Manchester United praticamente não vende ingressos para seus jogos no Old Trafford, onde a média de público, a maior do mundo, não baixa de 75 mil torcedores por partida. Os ingressos são adquiridos basicamente no início da temporada pelos sócios mais antigos. Existem filas de sócios com mais de quatro anos para aquisição de um “season ticket” (ingresso válido para uma temporada inteira), que pode valer até 2.000 euros.

O maior ídolo e artilheiro da história do Manchester United foi o atacante Bobby Charlton, que atuou pelo clube de 1954 a 1973 e disputou 752 jogos, marcando 249 gols. Nesse período, conquistou três Campeonatos Ingleses (1956/57, 1964/65 e 1966/67), uma Copa da Inglaterra (1962/63) e uma Liga dos Campeões da Europa (1967/68), além de ganhar a Copa do Mundo de 1966 pelo país.

Em 1964 um diabinho vermelho chamado Fred, foi escolhido para ser mascote do clube, que é conhecido na Inglaterra e em todo o mundo como os “Red Devils”, ou “Os Diabos Vermelhos”. O símbolo faz alusão justamente a isso: as cores do time e ao diabo que segura um tridente.

Em 1991 o Manchester United colocou ações na Bolsa de Valores de Londres. Ao começo da década de 2000, o empresário norte-americano Malcolm Glazer, dono do time de futebol americano, Tampa Bay Buccaneers, iniciou um processo de compra das ações do clube inglês. O milionário americano possui participações em empresas de petróleo, indústria de embalagens, planos de saúde, construtoras e bancos. Ele partiu da compra de 3,17% das ações do Manchester em setembro de 2003 e ao final do ano, já possuía 15%. Em maio de 2005, fez o ataque final e comprou 98% das ações, obrigando que os 2% restantes fossem vendidos a ele. Com isso o Manchester United se transformou em empresa de um único dono, que pagou pelo clube mais de 800 milhões de libras.

Além de ser um dos maiores e mais populares clubes da Inglaterra, com cerca de 150 mil associados, o Manchester United é tido atualmente como o clube mais rico do mundo, valendo 3 bilhões de dólares. Também tem um dos maiores patrocínios do mundo: fechou um acordo com o grupo de seguros AIG (American International Group), com duração de quatro anos e valor de 56,5 milhões de libras esterlinas. A AIG é a terceira empresa que patrocina o Manchester United na história do clube. A empresa japonesa Sharp foi a primeira, associada ao time por 18 anos, entre 1982 e 2000, seguida pela Vodafone.

Hoje o Manchester United é um dos poucos clubes de futebol do mundo a ter seu próprio avião para transportar os jogadores e comissão técnica. O modelo é um Airbus A320, mais conhecido como Red Devil A320. A aeronave é toda pintada de vermelho com imagens dos craques do elenco. Além de ter seu avião particular, o Manchester United fechou um convênio com a AirAsia para ter uma linha de aviões, com destino ao continente asiático. (Texto e pesquisa: Nilo Dias)
Jogadores festejam título da Copa dos Campeões da Europa (Foto: Site oficial do Manchester United FC)

terça-feira, 27 de maio de 2008

Fecha na Prochaska

Eu sei que esta historinha não tem nada a ver com esportes, mas não resisti a tentação de contar. Nos anos 80 a TV Bandeirantes transmitia aqueles bailes de Carnaval bem da pesada. Os repórteres Otávio Mesquita e Cristina Prochaska foram escalados para um baile no Clube Monte Líbano, em São Paulo. Cristina, quase ao fim da transmissão entrevistava um folião, quando uma garota totalmente nua resolveu dançar em cima de uma mesa bem perto da repórter.

Vendo aquilo, o câmera desviou a filmagem e surgiu na tela o bonito e ereto par de peitos que balançava ao som da música. Eram tempos da ditadura, e preocupado com a censura o diretor mandou a ordem para focar somente na entrevistadora, que foi ouvida nitidamente por todos os telespectadores: “Fecha na Prochaska! Fecha na Prochaska!". E o inesperado aconteceu. O câmera não teve a menor dúvida, abaixou a imagem, e todos se deliciaram ao ver por inteiro a parte inferior da garota, com tudo a que tinham direito. Dizem que o diretor teve um troço.

Lá pelos anos 60 jogava no Fortaleza um zagueiro chamado Sapenha, um daqueles verdadeiros “guarda-roupas”, que dentro de campo não dava moleza para os atacantes. Mas em frente a um microfone era um desastre. Antes de um jogo contra uma equipe de Recife, na capital pernambucana, concedeu uma entrevista a uma emissora de rádio local.

O repórter perguntou: “Sapenha como está o time para o jogo contra o Sport? O zagueiro respondeu: “Ah, o time está foda”. Mesmo preocupado, o repórter resolveu continuar perguntando: “E você? Está bem preparado?” E Sapenha, sem titubear: “Ah, eu estou fodinha”. Já gaguejando o repórter perguntou para encerrar a entrevista: “Você quer mandar algum recado para o pessoal lá de Fortaleza? E Sapenha, inocentemente disse: “Quero! Benção mãe!”.

O grande compositor brasileiro Ary Barroso, autor de verdadeiras obras primas musicais, como “Aquarela do Brasil”, foi também narrador de futebol nos anos 40. Torcedor apaixonado do Flamengo, Ary puxava o som de uma gaitinha de boca, antes de gritar o gol. Se o Flamengo estivesse jogando mal, a transmissão era triste, lenta, difícil de ouvir.

Um lance narrado por Ary Barroso entrou definitivamente para o folclore do rádio. Era um clássico Fla-Flu que decidia o Campeonato Carioca. Foi assim: “Zizinho passa a Pirilo. Pirilo recua para Biguá. Biguá estende para Zizinho, lá vai ele entrando na área, mas o juiz dá impedimento. Agora é a vez deles. Olhaí, eu não disse? Didi dribla Biguá, passa a Carlyle, que vai entrando, Orlando recebe. Pronto. Nem quero mais ver". Ary silenciou, ouviu-se claramente o grito da torcida festejando, e ele deu dois soprinhos na gaita. Foi gol do Fluminense.

No dia 11 de novembro de 2001, o locutor Júlio Sales, da Rádio Assunção, de Fortaleza, num jogo em Natal, entre o ABC local e Fortaleza, indignado com a atuação do bandeirinha que não marcava os impedimentos do time da casa protestou em plena narração: "Esse bandeirinha não levanta mais o pau, assim não é possível".

Essa me fez lembrar de um narrador de uma das rádios de Pelotas (RS), que transmitia um clássico local entre Brasil e Pelotas, o famoso Bra-Pel. Isso foi na década de 60. Não vou citar o nome do locutor porque ainda está vivo e somos amigos. No Brasil jogava um goleiro uruguaio de quase dois metros de altura, de nome Gióvio. Lá pelas tantas um ataque do Pelotas que o narrador com vibração contou: “Lá vai Deraldo, arrisca o chute de fora da área, uma bomba, no pau de Gióvio”. Claro que foi na trave.

No livro "Histórias de Sandro Moreyra", encontrei esta “judiaria” com nossos irmãos portugueses: Durante um jogo entre Vasco e Americano, os já mal-humorados vascaínos que estavam sendo derrotados, ouviram pelos alto-falantes de São Januário esta notícia dada em voz triste pelo locutor: "Em Lisboa, no Estádio da Luz, a União Soviética vence Portugal por 2 X 0". Um burburinho correu pelas sociais e um conselheiro, de nome Pacheco, interpelou o presidente vascaíno.

”Oh, Calçada, como é que podemos perder hoje um jogo a se realizar amanhã?” Calçada foi saber e pouco depois o locutor corrigiu e os alto-falantes anunciavam: “Atenção: o jogo que acabamos de noticiar será realizado amanhã. E está 0 X 0”.

No Rio de janeiro tinha um locutor que se autodenominava “o que sabe falar com os craques”. Certa ocasião ele inventou de entrevistar um jogador do Vasco, de nome Genuíno, analfabeto de pai e mãe e avesso a microfones. Sabedor da “alergia” do jogador arriscou: “Genuino, só duas palavrinhas”. E o craque respondeu: “Ôce é doido mermo. Si ieu num falo nem uma palavrinha, comu é qui ôce qué qui eu fale duas?”.

O locutor Alexandre Costa, da Rádio Clube, de Pernambuco, durante o programa "Bola ao Centro" dia 22 de julho do ano passado, ao analisar as possibilidades do Náutico, num jogo contra o Corinthians no Pacaembu, disse o seguinte: “Se conseguirmos vencer, sairemos de lá vitoriosos”.

Essa aconteceu com o radialista Carlos Farinha, também pernambucano, durante uma solenidade em sua terra natal: “Neste momento, a Primeira Dama da Cidade está sendo homenageada com um omelete de flores”.

Quando eu morava na cidade gaúcha de Rio Grande ouvi o mais conhecido narrador local nos brindar com esta preciosidade: “Falta perigosa contra o Rio Grande. É junto à linha da grande área. Chance de ouro para o Rio-Grandense que tem bons batedores. Barreira compacta do Rio Grande, ‘não tem brecha’. Autoriza o árbitro, correu Bocanha, atirou, na brecha. É gooooool”.

Do mesmo narrador, torcedor ardoroso do São Paulo, time da cidade: “Fulano, o São Paulo quer levar o gol. Não é possível, uma falta bem perto da meta e os jogadores não fazem barreira”. E o repórter informou: “Não pode fulano. É pênalti”.

O locutor Vasconcelos Lima, de uma rádio de Maceió fazia a cobertura de um almoço em que estavam sendo homenageadas figuras representativas de várias atividades no Estado, inclusive do futebol. No meio da transmissão saiu com esta beleza: “Neste salão registramos a presença de ilustres homens públicos. Enquanto não é servido o almoço, eles pegam um aperitivo, comem um tira-gosto e no outro salão reservado às mulheres, estão comendo as suas senhoras”. (Texto e pesquisa: Nilo Dias)
Ary Barroso era torcedor doente do Flamengo (Foto: Site Ary Barroso)

sábado, 24 de maio de 2008

Seu Edevair morreu sem ver sonho realizado

Vitimado por um infarto, morreu na tarde de quinta-feira, 22, aos 77 anos, Edevair de Souza Farias, pai do ex-jogador Romário. Ele estava internado no hospital Barra Do’r, na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio de Janeiro, desde a semana passada em razão de uma infecção urinária generalizada. Seu Edevair não vinha bem de saúde e há três anos fazia hemodiálise.

O sepultamento aconteceu ontem à tarde (23) no cemitério de Inhaúma, em Del Castilho, na zona norte da capital fluminense, num clima de muita emoção e tumulto, devido à presença de um grande número de admiradores do “Baixinho”. A confusão foi enorme. Vários torcedores se aglomeraram para participar da cerimônia e alguns acabaram perdendo o equilíbrio e caindo em covas abertas.

Durante o enterro, Romário, que carregava uma bandeira do América (RJ), time de coração de Edevair, chorou bastante ao lado de sua mãe, Manuela Ladislau Faria, a dona Lita. O pai do ex-atacante tinha como sonho ver o filho atuando no time americano. O presidente do Vasco da Gama, Eurico Miranda, que foi levar sua solidariedade a Romário, acenou com a possibilidade de ajudar o América a sair da segunda divisão do futebol carioca, ano que vem.

Seu Edevair, sempre quis que o filho se tornasse jogador de futebol. Ainda de colo, nos tempos em que residiam na comunidade do Jacarezinho, Romário ganhou a primeira bola de futebol. Quando tinha três anos de idade, a família mudou-se para a Vila da Penha. Lá Romário jogou no time do Estrelinha, fundado por seu pai.

Em 1979, um olheiro o levou para fazer testes no infantil do Olaria, onde foi destaque. Dali ao Vasco da Gama, onde chegou em 1980 foi um pulo. Depois de passar pelas categorias de base do clube da Cruz de Malta, Romário subiu ao time de profissionais pelas mãos do técnico Antônio Lopes. Sua estréia na equipe principal se deu no dia 6 de fevereiro de 1985, num jogo do Campeonato Brasileiro em que o Vasco venceu o Coritiba por 3 X 0. Romário entrou no segundo tempo, no lugar de Mário Tilico.

O primeiro gol do “Baixinho” pelo Vasco foi marcado no dia 18 de Agosto de 1985, em um amistoso contra o time do Nova Venécia. Nesse mesmo ano foi vice-artilheiro do Campeonato Carioca. Em 1986 assinou o primeiro contrato profissional, ano em que fez dupla de ataque com Roberto Dinamite. Mesmo ao lado do goleador, foi artilheiro do Campeonato Carioca, com um gol a mais que o companheiro.

Em 1987, Romário foi convocado para a Seleção Brasileira pela primeira vez, para um jogo amistoso contra a seleção da Irlanda. Mas seu primeiro gol com a camisa canarinho só aconteceu meses depois, numa vitória por 3 X 2 contra a Finlândia. Em 1987 e 1988, foi bi-campeão carioca. Ainda em 1988 foi medalha de prata nas Olimpíadas de Seul com a Seleção Brasileira. Depois de conquistar o título do Campeonato Carioca, transferiu-se para o clube holandês PSV Eindhoven, por US$ 5 milhões.

Em 1989 ajudou o Brasil a se classificar para a Copa de 1990. Mas devido a uma fratura no tornozelo, sua participação na Copa foi prejudicada: na única partida como titular, contra a Escócia, foi substituído no segundo tempo. Ao longo de 1990 e 1991, Romário continuou como principal jogador do PSV, sendo artilheiro do Campeonato neerlandês e da Copa dos Países Baixos. Em 1993, se transferiu para o FC Barcelona.

Em 1993, já na condição de melhor jogador do mundo foi chamado para salvar a Seleção Brasileira nas Eliminatórias da Copa de 1994. Seu desempenho contra o Uruguai, quando fez dois gols foi decisivo para que a Seleção alcançasse classificação. O ano de 1994 foi um dos melhores da carreira de Romário, culminando com a conquista do tetra-campeonato mundial para o Brasil; E no final do ano ganhou o título da FIFA de melhor jogador do mundo.

Em 1995, Romário retornou ao Brasil e para o Flamengo, que completava 100 anos. O “Baixinho” foi artilheiro do Carioca, mas o Flamengo ganhou apenas um turno do campeonato, a chamada Taça Guanabara, perdendo o título para o Fluminense. No Campeonato Brasileiro a campanha também não foi boa, o que abalou o prestígio do atacante. Em 1996 as coisas melhoraram e o Flamengo foi campeão carioca invicto e Romário mais uma vez o artilheiro do estadual. O rubro-negro ainda papou a Copa Ouro Sul-Americana.

Em 1997 Romário foi emprestado ao Valencia da Espanha, depois que o Flamengo perdeu a Copa do Brasil para o Grêmio e o Torneio Rio-São Paulo para o Santos. No Campeonato Brasileiro de 1997 só jogou quatro partidas pelo Flamengo, que foi quinto colocado. Pela Seleção Brasileira, conquistou a Copa América, realizada na Bolívia, mas não participou do jogo final, por lesão. Ainda foi campeão da Copa das Confederações, realizada na Arábia Saudita.

Em 1998, depois de uma temporada frustrante no Valência voltou ao Flamengo. Um mês antes da Copa da França, se lesionou num jogo contra o Friburguense, o que provocou seu corte da Seleção. Em 1999 foi campeão carioca jogando apenas 18 minutos no primeiro tempo da partida decisiva contra o Vasco da Gama. E mais uma vez artilheiro do estadual. Também foi o goleador da Copa Mercosul com 8 gols.

Romário foi dispensado do clube por indisciplina durante a última rodada do Campeonato Brasileiro de 1999, ao participar de uma festa em Caxias do Sul depois de uma derrota para o Juventude.

Em 2000, devido a atrasos no pagamento de salários, e a dívida do Flamengo com ele, Romário se transferiu para o Vasco. Nesse mesmo ano foi campeão da Copa Mercosul, numa final inesquecível contra o Palmeiras, que vencia por 3 x 0 e não conseguiu conter a reação vascaína, que virou para 4 x 3. Ele marcou 3 gols. Depois ajudou o Vasco a vencer a Copa João Havelange, em final contra o São Caetano.

Em 2002, Romário foi para o Fluminense, que festejava o centenário. Suas boas atuações no tricolor recomendavam a convocação para o Mundial do Japão/Coréia. Embora a pressão da imprensa, o técnico Luis Felipe Scolari não o convocou. Romário ficou nas Laranjeiras até 2005, quando retornou ao Vasco da Gama. Romário novamente surpreendeu, sagrando-se um dos artilheiros do Campeonato Carioca.

Em 27 de abril, Romário fez o jogo de despedida da Seleção, na comemoração dos 40 anos da Rede Globo. Foi um amistoso no Pacaembu, em São Paulo contra a Guatemala, em que ele jogou 38 minutos e marcou um dos gols da vitória brasileira de 3 X 0. Em 2005 foi artilheiro do Campeonato Brasileiro com 22 gols.

Em março de 2006, Romário foi para o Miami FC, dos Estados Unidos, time filiado a uma liga secundária. Sem fazer boas atuações, voltou ao Brasil e foi impedido de jogar o campeonato mineiro pelo Tupi Football Club de Juiz de Fora. Isso fez com que aceitasse jogar pela equipe australiana do Adelaide United.

No retorno ao Brasil, novamente o endereço do Vasco. No dia 20 de maio de 2007, em São Januário, ele fez seu milésimo gol num jogo contra o Sport Club do Recife, de pênalti, assim como havia feito Pelé. O feito mereceu uma estátua de bronze, atrás da mesma baliza do milésimo gol, inaugurada em 19 de agosto do ano passado, no jogo Vasco da Gama X América (RN).

Romário ainda tentou começar a carreira de técnico, mas desistiu logo em seguida. No dia 6 de fevereiro, no jogo válido pelo Campeonato Carioca de 2007, pediu demissão do cargo, por interferência do presidente Eurico Miranda, que mandou escalar o atacante Alan Kardec, para poder vendê-lo ao exterior. Romário havia optado por Abuda.

Em Fevereiro de 2008, o jogador anunciou que se aposentaria no dia 30 de Março. No dia 14 de Abril, em um evento realizado no Rio de Janeiro, organizado para o lançamento de um DVD sobre sua carreira, acabou oficializando sua aposentadoria do futebol, sem concretizar o maior desejo de seu pai, que era vê-lo vestir a camisa do América.

Romário nasceu em Jacarezinho, bairro do Rio de Janeiro em 29 de janeiro de 1966. Foi o segundo maior artilheiro da Seleção Brasileira com 71 gols marcados e um dos maiores centroavantes brasileiros de todos os tempos. (Texto e pesquisa, Nilo Dias).
Seu Edevair, pai de Romário (Foto: Super Vasco)

sexta-feira, 23 de maio de 2008

O lado divertido da imprensa esportiva

O “besteirol” no esporte não é primazia de jogadores e dirigentes de times de futebol. Tem muita gente boa por aí que anda colaborando com o anedotário da área. Eu colhi algumas “jóias” de nossos narradores, comentaristas e repórteres esportivos, espalhadas por esse Brasil afora. Para começar, nada melhor do que o mais famoso locutor esportivo do país, Galvão Bueno, da Rede Globo. Antes de um jogo amistoso entre Brasil e Inglaterra, houve uma falha na iluminação do Estádio de Wembley e o nosso entusiasmado sentenciou: “O juiz deverá adiar a partida para depois...”.

Nos anos 50 e 60 jogava no Brasil de Pelotas (RS) um lateral esquerdo chamado Tibirica. Dia de clássico e o repórter Edmar Allan, da Rádio Cultura, ao informar a escalação da equipe, saiu com esta: “O desfalque no Brasil é Tibirica, que está lesionado no joelho esquerdo da perna esquerda”.

Esta também aconteceu no Rio Grande do Sul e faz muito tempo. O locutor Aloísio Parente, descrevendo a inauguração do Estádio Olímpico, do Grêmio Portoalegrense: “O estádio é suntuoso com uma vista belíssima. Fica quase no centro da Capital. À sua direita, o belo Rio Guaíba, à esquerda, uma das principais avenidas, e, na parte sul, o mais procurado de todos os cemitérios de Porto Alegre, onde “vivem” os mortos mais ilustres da cidade”.

Ainda no Rio Grande do Sul. Hugo Schmidt era um repórter do velho e querido jornal “A Folha da Tarde Esportiva”, encarregado de cobrir o campeonato de Bolão, um esporte aos moldes do “bolicho”. Ficou para a história da imprensa a legenda que ele fez para uma foto em que aparecia uma respeitável senhora, campeã individual de bolão, num torneio do 4º Distrito, em Porto Alegre: “Fulana de Tal, a maior derrubadora de paus do quarto distrito”.

Na inauguração do Autódromo de Brasília o narrador de uma das rádios locais transformou ouvidos em olhos: “Estamos assistindo à inauguração do Hipódromo de Brasília”. Em seguida, mostrou seu “enorme conhecimento” sobre automobilismo: “Primeira pole-position para Fittipaldi, segunda pole-position para Nicky Lauda, terceira pole-position, para José Carlos Pace, e assim por diante, até a 15 pole-position”. Mas não pensem que ficou só nisso. Ao atender o chamado do repórter, que informou estar ao lado do padock, o narrador completou a felicidade dos ouvintes, que certamente chegaram ao delírio: “Então aproveita, e pergunta ao “padock” o que ele acha da corrida”.

Paulo Léro, um dos mais famosos repórteres do rádio paranaense foi chamado de o “Pelé das Asneiras”. Em uma entrevista com o presidente do Matsubara, clube interiorano, perguntou: “Presidente, é verdade que o senhor está “domesticando” o seu filho para ser o próximo presidente do clube?” Outra do nosso querido repórter: “O zagueiro Vica ficará afastado alguns dias, pois está com um “floco” dentário.” Acham pouco? Tem mais? Num jogo no Canindé, em São Paulo, entre Portuguesa de Desportos e Colorado, extinto clube paranaense houve um apagão no estádio. Depois de verificar o que tinha acontecido, Paulo Léro informou: “Olha Fernando, um gato entrou no meio do transformador, e veja só, ele se transformou numa verdadeira tocha humana”.

Conhecido locutor de uma das rádios de Brasília foi a Goiânia, transmitir um jogo entre Goiás e Ceub. Devido a um violento aguaceiro, o jogo foi adiado para a noite seguinte. Ao dar a notícia, o locutor largou esta pérola: “A nossa Rádio Alvorada vai permanecer em Goiânia, e o jogo será realizado sem falta, amanhã à noite, chova ou faça sol”. De um outro locutor de Brasília, transmitindo uma prova de remo no Lago Paranoá: “Vai ganhando cada vez mais “terreno” o barco do Saldanha da Gama”.

Decisão do campeonato paraense entre Remo e Tuna Luso, no Estádio Mangueirão. As duas equipes em campo batendo bola e os repórteres fazendo as tradicionais entrevistas. Depois que as equipes posaram para aquelas fotos que nunca são publicadas nos jornais, um repórter de rádio perguntou ao atacante Ageu Sabiá, do Clube do Remo e principal artilheiro do campeonato: “Essa foto vai para a posteridade?”. Sem vacilar o jogador respondeu: “Não, essa eu pretendo mandar para a minha família que está lá na minha terra natal, Monte Alegre”.

O ex-árbitro de futebol José Roberto Wright, agora comentarista de arbitragem de um canal de televisão, ao analisar um lance duvidoso, fez esta “esclarecedora” intervenção: “Nós, aqui, temos a máquina, por isso eu não crucifixo o auxiliar”.

Escrevo este artigo, mas tenho todo o direito de não acreditar que isto seja verdade. O falecido radialista Valdir Gentil, da Rádio Cacique, de Sorocaba (SP) foi sozinho a Ribeirão Preto para transmitir um jogo do São Bento contra o Comercial. Lá, ele conseguiu que um repórter local lhe ajudasse na transmissão. Chovia muito e em dado momento, Valdir Gentil narrou: "Chove nos quatro cantos do gramado". O repórter, querendo demonstrar que estava em cima da jogada, completou: “Valdir, eu estou melhor colocado do que você e posso lhe assegurar que chove também no centro do gramado".

Isso me fez lembrar de algo parecido que aconteceu lá na querida cidade de Rio Grande, terra do mais antigo clube de futebol do país, o S.C. Rio Grande. A Rádio Cultura fazia uma transmissão dupla: de Rio Grande o jogo Rio-Grandense X Brasil de Pelotas. E de Pelotas, Farroupilha X São Paulo. Bola no centro do gramado e jogo por começar. O narrador, de olho no relógio anunciou: “Em Rio Grande, 15h30 minutos”. E o narrador do outro jogo, completou: “Em Pelotas também, 15h30min”. Por certo foi para não haver dúvidas quanto ao fuso horário.

Algumas do locutor Cléber Machado, da Rede Globo, que dá de goleada no Galvão Bueno. Ao descrever o perfil do técnico Osvaldo de Oliveira: “Ele tem aquela calma meio nervosa”. Antes de começar um jogo da Seleção Romena, pela Copa do Mundo: "Todos os jogadores da Romênia tingiram os cabelos de amarelo, exceto o goleiro, que é careca". Numa tarde fria, jogo do Campeonato Brasileiro e o Estádio de Parque Antártica lotado: "Taí a torcida do Palmeiras esquentando o frio”. Depois corrigiu, mas já era tarde.

Essa eu garimpei lá em São Gabriel, cidade onde eu morava antes de ir para Brasília. Jogo da Segunda Divisão entre o time do São Gabriel e do Cruzeiro de Santiago. Uma das rádios locais fazia a costumeira transmissão. Metade do primeiro tempo e o repórter informou: “Fulano, entrou um cachorro em campo”. E o narrador, rapidamente perguntou: “No lugar de quem?”.

O repórter Sílvio Luiz, da rádio Jovem Pan, na época Rádio Panamericana, chamou o narrador Pedro Luiz, para informar: “Pedro, a bandinha aqui no campo está tocando uma marchinha”. E Pedro Luiz respondeu: “Silvio, a "bandinha" é a Banda Marcial da Força Pública, e a "marchinha" é o Hino Nacional”.

É claro que Portugal não poderia ficar de fora. O locutor Nuno Luiz, da TVI ao comentar os movimentos do jogador Augusto Inácio, do Sporting, num jogo contra o Salgueiros, pelo campeonato português nos brindou com esta maravilha: “Inácio fechou os olhos e olhou para o céu”. E um outro narrador, da mesma emissora, João Tomás falando das qualidades do jogador Pedro Mantorras; “Uma das armas do Pedro é a técnica e a velocidade”.

O gaúcho Osvaldo Brandão foi um dos grandes técnicos do futebol brasileiro, mas não gostava de dar entrevistas. Certa feita, um repórter lhe perguntou: “Seu Osvaldo, como o time do Corinthians vai jogar?” E Brandão respondeu: “Ora, com calções, camisas e chuteiras”. (Texto e pesquisa: Nilo Dias)

Horácio disse...
Amigo Nilo: Tem aquela do "Zé Adão", quando morreu o Ildefonso Poester e foi observado um minuto de silêncio na Linha do Parque. Antes que o árbitro apitasse, o Zé lascou: "Os senhores acabaram de ouvir um minuto de silêncio". Horácio Gomes
27 de maio de 2008 17:08
Galvão Bueno, mesmo sendo o melhor narrador de futebol da TV, de vez em quando dá suas gafes(Foto: Rede Globo)

terça-feira, 20 de maio de 2008

De “Biriba” a “Perivaldo”

Se superstição ganha títulos, o Botafogo carioca pode estar perto de uma nova fase vitoriosa, como aquela do final dos anos 40, quando era presidido pelo até hoje lembrado Carlito Rocha, que se tornou famoso por adotar um cãozinho fox paulistinha como mascote do clube. No jogo da semana passada contra o Atlético Mineiro, quando o Botafogo se classificou para as semifinais da Copa do Brasil, o time entrou no gramado acompanhado de um cão beagle preto e branco de nome “Perivaldo” (referência a um ex-jogador do clube).

Até aí, nada de mais, não fosse o fato de “Perivaldo” ter nascido com uma estrela nas costas que lembra a “Estrela Solitária” do escudo botafoguense. Foi a grande sensação do jogo, levantando a torcida presente ao Estádio Engenhão. Seu dono o torcedor alvinegro Aldo Souza de Araújo, um carioca que mora em João Pessoa (PB) acabou de arrumar um problema: a partir de agora terá de dar um jeito de levar “Perivaldo” a todos os jogos do Botafogo. Pelo menos enquanto estiver vencendo.

Ainda não está garantida a presença de “Perivaldo” nos dois jogos contra o Corinthians. Mas uma coisa é certa, se ele entrar em campo, que se cuide o treinador Mano Menezes, pois com certeza terá muitos problemas para anular uma jogada que se acredita, tem efeitos sobrenaturais. Mas o Botafogo também tem que ficar com um pé atrás. Em 1950, “Biriba” foi seqüestrado a mando de um delegado de Polícia, torcedor corinthiano e só foi devolvido depois do jogo. Resultado: Corinthians 2 X 1 Botafogo.

O “cãodidato” a novo mascote tem até página no Orkut. O perfil diz o seguinte: “Caros botafoguenses. Por incrível que pareça nasci com a estrela solitária, não só no coração, mas também no meu pêlo. Meus donos e minha família inteira são botafoguenses. Sou da raça beagle nas cores preto e branco. Meu nome é “Perivaldo”, em homenagem aquele lateral do “Fogão” e da Seleção Brasileira, o único que conseguiu a expulsão do Zico nos anos 80. Na nossa família só tem botafoguense. Dá-lhe “Peri”. Dá-lhe “Fogão”. Por favor, me divulguem. Quero me tornar o mais novo mascote do nosso timão”.

Mas se o Botafogo tem em “Perivaldo”, um novo pé de coelho, seus torcedores não devem esquecer que o treinador Cuca, é um pé frio nato. Ele já treinou outros times considerados grandes como Flamengo, Grêmio e São Paulo, além de equipes médias como Coritiba, Goiás, Paraná e São Caetano e não ganhou nem mesmo um Estadual. Os times que ele dirigiu sempre começaram bem as competições, mas acabaram mal. Os torcedores adversários não perdem a chance de uma boa gozação: “O Botafogo nada, nada e morre na praia”. Ou então, “quase que foram campeões”.

Os torcedores mais antigos e aqueles que já leram a história do clube sabem que nas décadas de 40 e 50 existiu um cão chamado “Biriba”, que caiu nas graças do presidente botafoguense Carlito Rocha e se tornou mascote oficial do time. Tudo começou durante um jogo contra o Bonsucesso, pelo Campeonato Carioca, em General Severiano, antigo estádio do clube.

O jogo estava bastante difícil e não saía do 0 X 0, quando “Biriba”, cão de estimação do zagueiro Macaé entrou em campo e fez “xixi” na trave do adversário, no exato momento em que saiu o primeiro gol do time alvinegro. Não precisou mais nada. “Biriba” virou mascote e ganhou as graças do presidente Carlito Rocha.

A partir daí “Biriba” acompanhou o time em todos os jogos do campeonato estadual. Se ele teve alguma influência nos resultados, não se sabe. Mas o fato é que o Botafogo foi campeão invicto depois de um longo jejum de mais de 10 anos. E com uma campanha para ninguém botar defeito: 19 jogos, 17 vitórias e dois empates. Na decisão o alvinegro derrotou o poderoso Vasco da Gama, chamado de “Expresso da Vitória”.

A fama de “Biriba” ultrapassou os muros de General Severiano e passou a incomodar os clubes rivais. Num jogo contra o Vasco, em São Januário quiseram impedir o cão de entrar no estádio. O presidente Carlito Rocha pegou “Biriba” no colo e desafiou os vascaínos: "Ninguém impede o presidente do Botafogo de entrar onde quer que seja. E quem estiver com ele entra, com certeza".

Coisas incríveis aconteceram. Na véspera do jogo decisivo contra o Vasco, em 48, o cão sofreu um atentado a tiros. Dizem que alguns padeiros vascaínos ofereceram uma verdadeira fortuna para quem entregasse “Biriba”, vivo ou morto, bem ao estilo dos filmes do velho Oeste americano. Carlito Rocha, temeroso de que o mascote fosse envenenado, ordenou que Macaé provasse toda a refeição antes de dá-la ao cão. O cão símbolo “trabalhou” no clube até meados da década de 50.
Biriba" e o presidente Carlito Rocha) e "Perivaldo", a nova esperança. (Fotos: Arquivo)

sábado, 17 de maio de 2008

Futebol e superstição andam de mãos dadas

O Internacional de Porto Alegre foi campeão mundial de clubes jogando com camisetas brancas. Venceu a Copa Dubai no início deste ano com camisas brancas. Virou um placar que lhe era desfavorável na Copa do Brasil, contra o Paraná, também vestindo branco. Foram os próprios jogadores que pediram o branco nessas partidas decisivas, acreditando que isso traria sorte. Será que a cor teve mesmo algo a ver nessas vitórias consideradas quase impossíveis? Só na cabeça dos jogadores. Esse é um pequeno exemplo que mostra como a superstição convive no dia-a-dia dos clubes de futebol. É um bom tema a ser explorado.

No artigo de hoje vou contar apenas alguns fatos que presenciei, durante os longos anos em que joguei futebol e fui dirigente de clubes amadores e profissionais, e também de futebol de salão (Futsal). Vi muita coisa que pode até parecer lenda, mas é a mais pura verdade. Em São Gabriel (RS), onde morei muitos anos teve um forte time de futebol nas décadas de 1950 e 1960, o Esporte Clube Cruzeiro. Seu treinador era o uruguaio Luiz Alberto Vives, já falecido, popularmente chamado de Dom Vives.

Quando os jogadores iam entrar em campo, ele passava um pouco de mel nas chuteiras de cada um. “Para dar sorte”, dizia. Anos depois, quando fui presidente da Sociedade Esportiva e Recreativa São Gabriel, o contratei para treinador e constatei na prática a doce receita. Dom Vives foi um personagem fantástico do futebol interiorano e oportunamente será tema de um dos meus artigos.

A S.E.R. São Gabriel sempre conviveu com a superstição, desde que o saudoso jornalista Domingos Rivas fundou o clube em 1º de maio de 1979. Perdi a conta de quantas vezes as camisetas freqüentaram os terreiros de umbanda, levadas pelo massagista Adroaldo, conhecido pai de santo da cidade. Por muitos anos uma imagem de Nossa Senhora acompanhou os jogadores em uma improvisada gruta num cantinho do vestiário, onde eram feitas orações e pedidos de proteção.

Em Pelotas fiz uma duradoura amizade com outra figura merecedora de um livro: Bento Peixoto Castelã, também já falecido. Foi jogador de futebol profissional nos três times de Pelotas (RS), Brasil, Pelotas e Farroupilha. Depois foi técnico de futebol de salão, tendo sido o comandante da equipe do Brasil, cinco vezes campeã gaúcha (1963, 1966, 1967, 1968 e 1969). Também quero resgatar a sua história em outra oportunidade.

Nos anos 60 o ginásio do Esporte Clube Cruzeiro era o principal de Pelotas e palco de memoráveis noitadas esportivas. O Brasil ia decidir o título da cidade contra o Paulista, um clube também cheio de dirigentes “malandros”, onde se destacava o saudoso Wilson Moreira. Bento Castelã e seu inseparável auxiliar, Antônio Freitas, igualmente personagem folclórico, ficaram sabendo que o adversário mandara fazer um trabalho de macumba, que estava no portão principal do ginásio, a espera do time rival. E o que fez Bento? Mandou que todos os jogadores pulassem um muro lateral e entrassem no ginásio pela porta dos fundos como forma de driblar o “despacho”.

Outra ocasião quando treinava o time profissional do Grêmio Atlético Farroupilha, Bento encarregou o auxiliar Antônio Freitas de montar um congá, em pleno vestiário. O Farroupilha passava por uma fase terrível e não ganhava de ninguém. No dia do jogo, não lembro o adversário, todos os jogadores e até os dirigentes, vestidos de branco tiveram de “bater cabeça” frente o altar, como manda o ritual umbandista. E parece que a coisa funcionou, porque o time venceu aquele e vários outros jogos, em memorável reação no campeonato estadual.

O futebol brasileiro sempre andou lado a lado com a superstição, como vou contar nos próximos artigos. Muitos clubes ficaram famosos por isso, mas nenhum se igualou até hoje ao Botafogo, do Rio de Janeiro, eterno campeão na matéria. (Texto e pesquisa: Nilo Dias)
Internacional, de branco foi campeão do mundo (Foto: S.C. Internacional)

quinta-feira, 15 de maio de 2008

O massagista dos reis

Meu personagem de hoje não é nenhum grande craque do futebol brasileiro. Mas nem por isso sua importância merece menor destaque. O massagista Mário Américo, mineiro de Rio Claro, foi um profissional competente que trabalhou em clubes importantes como a Portuguesa de Desportos (SP), contratado na década de 50 com direito a luvas e tratamento de grande estrela. Sua transferência para o Vasco da Gama (RJ) teve enorme repercussão na época. Mas os melhores momentos da carreira foram vividos na Seleção Brasileira, tendo participado de sete copas do mundo entre 1950 e 1974, e colocado no currículo os títulos de campeão em 1958, 1962 e 1970.

Seu sonho de infância era ser músico. Mas o destino não quis. Enveredou por caminhos bem diferentes. Em 1937, no Madureira Atlético Clube, do Rio de Janeiro, começou uma carreira dupla: massagista e lutador de boxe. Nos ringues alcançou importantes vitórias, até mesmo fora do país. E na massagem, depois de se especializar na Escola Nacional de Educação Física do Rio de Janeiro, o sucesso foi maior, merecendo ser chamado de “Massagista dos Reis”, título de um livro onde contou ao jornalista Henrique Matteucci, fatos marcantes de sua longa carreira.

Também foi chamado de “pombo-correio”, pela rapidez com que transmitia recados dos treinadores aos jogadores dentro de campo. Folclórico, protagonizou histórias que quase viraram lendas. A mais conhecida aconteceu na Copa do Mundo de 1962, no Chile. O juiz Nicolai Latishev (URSS) apitou o fim do jogo contra a Tchecoslováquia, em que vencemos por 3 X 1, e como era costume na época pegou a bola para levar como souvenir. Mas foi surpreendido pelo massagista Mário Américo, que veio por trás e a surrupiou, correndo para o vestiário.

O juiz relatou o fato aos dirigentes da FIFA, que de imediato exigiram a devolução da bola. Aí funcionou o jeitinho brasileiro e uma replica foi entregue, como se fosse verdadeira. A original veio para o Brasil e foi parar nas mãos de outro importante personagem do futebol brasileiro, o saudoso empresário paulista (dono da rádio e TV Record) e chefe da delegação brasileira, Paulo Machado de Carvalho (falecido em 1992). Ele foi apelidado de “Marechal da Vitória”, pelo jornalista Joelmir Betting. Em 1961, o Estádio Municipal do Pacaembu passou a se chamar “Paulo Machado de Carvalho”. Em 2005, os jornalistas Tom Cardoso e Roberto Rockmann escreveram sua biografia no livro intitulado "O Marechal da Vitória – Uma história de rádio, TV e futebol".

Mas voltemos a Mário Américo e algumas de suas gostosas histórias. Tão conhecido quanto os grandes jogadores da seleção, entre as décadas de 1970 e 1980, ele fez um comercial de um determinado anestésico para a TV, em que olhava para a câmera e dizia: “Ih, com essas “mão” eu já massageei muitos “craque”. Os mais antigos com certeza devem lembrar.

Certa vez, entrevistado num programa de televisão, “titio Mário” como era carinhosamente chamado pelos jogadores, não fugiu da raia e respondeu uma pergunta sobre a existência de homossexualismo no futebol. Não titubeou e lascou essa jóia: “Ah, meu filho, esse negócio de homem sexual no futebol sempre existiu”.
Em 1952, num jogo entre Vasco da Gama e Fluminense, pelo Campeonato Carioca, Mário Américo evitou um gol do adversário, ao invadir o campo e dar uma “gravata” num atacante na hora em que este ia chutar para o gol. Deu briga generalizada.

Antes do Mundial de 1958, a Seleção Brasileira jogou um amistoso no Pacaembu, contra o Corinthians. Ganhou por 5 X 0 e quase ao final do jogo Pelé machucou um dos joelhos, num choque com o jogador Ari Clemente. Susto geral. Só viajou para a Suécia por que o médico, Hilton Gosling garantiu que ele poderia estar em campo, a partir do terceiro jogo. Isso era uma possibilidade, pois o Brasil teria antes que vencer Áustria, Inglaterra e União Soviética, três grandes selecionados.

Pelé viajou e não participou dos dois amistosos na Itália, ficando em tratamento com o doutor Gosling e o massagista Mario Américo. Na concentração de Hindas, na Suécia, Pelé passava horas tratando do joelho. Até que um dia Américo chegou junto a ele e disse: "Você está pronto, crioulo, pode jogar se o Feola quiser". Entrou no jogo contra a antiga URSS e o resto da história não é preciso contar.

Na mesma Copa de 1958 o Brasil ficou sabendo na véspera do jogo final contra a Suécia, que teria de jogar com o uniforme reserva. Os jogadores tremeram, nenhum queria vestir a camisa branca, de triste lembrança em 1950. Paulo Machado de Carvalho, chefe da delegação não quis dar chance ao azar. Supersticioso, usava sempre o mesmo terno marrom antes dos jogos, comprou uniformes azuis de última hora, dizendo que era a cor do manto de Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil. Os números foram recortados das camisas amarelas, usadas nos jogos anteriores, e costurados pelo massagista Mário Américo.

Garrincha, o extraordinário atacante brasileiro não era um tipo daqueles que se podia chamar de esperto. Ao contrário. Muito simples, acreditava em tudo que lhe diziam. Um dia, ele apareceu na concentração da seleção com um rádio transistor, moderno e caro, que custou mais de 100 dólares. Por tal compra todos os companheiros o felicitaram, exceto Mario Américo. Chamando o jogador para perto de si, disse-lhe ao ouvido: “Você fez um mau negócio. Abusaram da sua inocência e ignorância, pois esse rádio não serve para o Brasil, pois só transmite em sueco”.

Com grande ingenuidade, Garrincha ligou o aparelho e constatou que realmente em todas as estações de rádio, os locutores falavam no idioma escandinavo. Depois disso, concordou em vender o rádio para o massagista por 40 dólares para “diminuir o prejuízo”, mas sob a condição de que dissesse a quem lhe perguntasse que pagou os mesmos 100 dólares.

Outra ocasião Pelé foi contratado pela fabricante de material esportivo “Puma” para fazer um comercial na televisão, em que teria de se agachar para ajeitar o cadarço da chuteira. O interessante dessa história é que as chuteiras usadas não eram da marca “Puma”, e sim "Adidas". Isso, porque Pelé não se adaptou as novas e teve que usar o seu par antigo, já surrado por muitos gols e jogos. Mário Américo teve a idéia de pintá-lo todo de preto, e colocar por cima o símbolo da “Puma”. Ninguém notou diferença. E Pelé pode embolsar pelo comercial, o equivalente a R$ 100 mil por quatro anos, e mais uma participação sobre a venda das chuteiras.

Uma vez pediram para Mário Américo fazer uma comparação entre Pelé e os demais jogadores. A resposta foi rápida: “Tirando o Pelé é tudo japonês”. O folclórico massagista faleceu em São Paulo, no dia 9 de abril de 1990 (Texto e pesquisa: Nilo Dias)
Capa do livro "Memórias de Mário Américo, o Massagista dos Reis". (Foto: Divulgação)

terça-feira, 13 de maio de 2008

Yustrich, o técnico “Homão”

Muitos técnicos de futebol são criticados pela tolerância demasiada com os jogadores. São os chamados “paizões” ou “titios”. Casos de Orlando Fantoni, já falecido e Joel Santana. Já Luiz Felipe Scolari, mescla o estilo “paizão” com “durão”, receita de sucesso. Existem os estrategistas, exemplos dos falecidos Zezé Moreira e Cláudio Coutinho e mais recentemente Vanderlei Luxemburgo.

Não podemos esquecer os disciplinadores. Flávio Costa, Osvaldo Brandão e Aymoré Moreira foram famosos. Mas nesse quesito ninguém superou Dorival Knipe, o Yustrich, ex-goleiro do Flamengo que se tornou o mais exigente e intolerante treinador que o futebol brasileiro conheceu. Há quem diga que não teve similar no mundo.

Dorival Knipe nasceu em Corumbá (MS) no dia 28 de Setembro de 1917. O apelido Yustrich ganhou pela semelhança física com Juan Elias Yustrich, goleiro argentino do Boca Juniors. Também o achavam parecido com o ator de cinema Victor Mature. Começou no futebol aos 18 anos, jogando pelo Flamengo, por quem foi campeão carioca em 1939, 1942, 1943 e 1944, quando perdeu a titularidade para Jurandir. Descontente foi para o Vasco da Gama e depois América, também do Rio de Janeiro.

A carreira de técnico teve início na década de 1950. De cara ganhou a fama de “durão”. Arrogante e de temperamento explosivo, gostava de exibir valentia. Era chamado de “Homão”, por causa da alardeada macheza e pelos quase dois metros de altura e físico avantajado: “paquidérmico”, segundo um cronista esportivo da época. Era comum envolver-se em atritos com jogadores, colegas de profissão, dirigentes e até com a imprensa. Ele não permitia que atletas sob seu comando fumassem, deixassem a barba por fazer e usassem cabelo comprido. Não tolerava atrasos e nem falta de empenho nos treinamentos.

Tinha bronca permanente com a imprensa, que o malhava constantemente. Certa feita, quando treinava o América Mineiro, por implicância proibiu a presença de repórteres no vestiário do Mineirão. Depois proibiu na porta do vestiário, no corredor, no fosso e junto da pista. Um repórter reclamou e foi ameaçado. O presidente interino da Associação Mineira de Cronistas Esportivos (AMCE), jornalista Osvaldo Faria, foi tomar satisfações e o "homão" não quis nem saber, partiu para a porrada.

Felizmente a PM chegou a tempo e não houve nada de maior. Vendo tantos policiais cercando Yustrich, o repórter de rádio Dirceu Pereira, deu uma de bom e de punhos cerrados gritou: “Larga ele, solta esse cara que a torcida vai ver quem é quem. Solta esse Zé Mingau". E posou de herói da festa. Yustrich vendo aquilo apenas soltou um estrondoso urro: "eu te pego, eu te peeeego".

Dias depois o Dirceu, esquecido do atrito foi ao estádio do América fazer uma reportagem. Chegou num jipe da rádio, dirigido pelo motorista Alair Sabará, um baixinho também metido a brigão. Ao entrar, logo que viu Yustrich, lembrou de tudo e saiu correndo. O treinador também o reconheceu e gritou para o porteiro: “Bigoooode, fecha esse portão". Ordem dada e executada, mas Dirceu conseguiu passar e ofegante entrou no jipe aos berros: “Arranca, Sabará, arranca, Sabará".

Não deu tempo. Trêmulo, Sabará não achava o buraco da chave. Há quem diga que no aperto queria ligar o jipe com um pente. Por sorte, Yustrich estava num dia bom e não bateu em ninguém, só disse muito desaforo. O jipe sim, levou inúmeros pontapés. E Dirceu e Alair só não encheram as calças por que não tinha nada pronto. Nem líquido nem sólido.

O Atlético Mineiro foi o clube que mais se identificou com Yustrich, que chegou no “Galo” em 1952 e logo foi campeão estadual. Deixou o clube na temporada seguinte, após uma rebelião formada pelos jogadores Zé do Monte e Lucas Miranda, descontentes de verem alguns colegas preteridos pelo técnico. Dirigiu o clube mineiro em 159 jogos, nos anos de 1952, 1953, 1960, 1968 e 1969.

Em 1955 foi para Portugal, treinar o Futebol Clube do Porto, sagrando-se campeão depois de uma longa espera de 16 anos. No mesmo ano, o Porto venceu a Taça Portugal, fazendo a chamada ''dobradinha'', ganhando os 2 maiores títulos daquele país. Mesmo tendo sido um técnico vencedor no clube português, Yustrich era antipatizado por alguns jogadores, entre eles Hernani Silva, o ídolo do time.

Ao fim de um jogo em que o Porto venceu o Oriental por 5 X 0, o técnico mandou os jogadores agradecerem ao público o apoio dado. Hernani foi o único a não cumprir a ordem, dizendo que não iria “alimentar as palhaçadas do treinador”. Foi o suficiente para se iniciar uma troca de socos. No final da temporada, Yustrich foi dispensado. Dizem que por exigência da temida polícia secreta do então ditador Oliveira Salazar, que tinha no Sporting, de Lisboa seu clube preferido, e não via com bons olhos o sucesso do Porto, conduzido por um brasileiro.

Apesar dos métodos rigorosos e polêmicos, os times dirigidos por Yustrich sempre brigavam pelas primeiras posições. Por isso, era sempre requisitado por grandes clubes. Em pleno início da década de 1970, já utilizava os métodos de trabalho dos treinadores atuais. Foi um dos primeiros a perceber a importância da preparação física. Com ele os goleiros tinham treinamento especial, separados do resto do grupo. Era o único técnico da época que dava folga aos jogadores nas segundas-feiras.

De volta ao Brasil, dirigiu o Vasco da Gama em 1959. Depois o modesto time do Siderúrgica, de Sabará (MG), onde foi campeão estadual. O Siderúrgica tinha ganho o título pela última vez em 1937. No jogo decisivo contra o Atlético Mineiro, Yustrich obrigou o atacante “Noventa” a jogar com um dos braços quebrado.

Dali foi para o Vila Nova, de Nova Lima, onde jogava um meio-campista de apelido “Quelé”. Yustrich reclamava do jogador por relaxar na marcação: “Pô, rapaz, você domina fácil a bola, sabe driblar, passa bem, mas não combate. Isso é ruim. É preciso voltar para marcar. Por que não faz isso?” E o jogador respondeu: “Ah, seu Yustrich. O senhor acha que dominando bem a bola, driblando bem, passando certo e dando combate, como senhor deseja, eu estaria aqui nesse timeco?”

Yustrich dirigiu a Seleção Brasileira por um jogo. Em dezembro de 1968, o Atlético representou o Brasil num amistoso contra a antiga Iugoslávia. Vestindo a camiseta canarinho, o Atlético venceu de virada por 3x2. Nesse jogo Yustrich lançou o atacante Dario, que marcou dois gols. Em 1969, no Mineirão, o Atlético, com a camiseta vermelha da Federação Mineira venceu por 2 X 1 a Seleção Brasileira, de João Saldanha, que se preparava para a Copa de 1970. Ao final da partida, Yustrich obrigou seus jogadores a darem a volta olímpica no gramado, com a camisa alvinegra do Atlético. O Mineirão quase veio abaixo. Isto lhe valeu a inimizade de João Saldanha.

Em 1970, Yustrich foi para o Flamengo e começou o ano de forma arrasadora. Em fevereiro, num jogo pelo Torneio de Verão esmagou o Independiente, da Argentina com uma vitória de 6 x 1. Depois o Flamengo foi campeão da Taça Guanabara. E só. Os resultados decepcionantes que se seguiram e a perseguição ao atacante argentino Doval, porque usava cabelos compridos, determinaram sua demissão no segundo semestre de 1971.

Ainda no Flamengo escapou da morte por um triz. De olho no cargo de técnico da Seleção Brasileira, caso Saldanha fosse demitido, Yustrich carregou nas críticas ao treinador. “João Sem Medo”, que já estava irritado desde o jogo-treino no Mineirão, entrou armado de revólver na concentração do Flamengo, para “um ajuste de contas”, mas o técnico não estava lá. Por este gesto e pelo empate da seleção com o modesto time do Bangu, foi demitido. Em seu lugar entrou Zagalo.

Essa não foi a primeira vez que Yustrich correu o risco de levar um tiro. Em uma de suas estadas no Atlético Mineiro, se desentendeu com o jogador uruguaio Cincunegui, que havia retardado em uma semana o retorno das férias. Os dois discutiram violentamente e Cincunegui sacou do revólver e só não atirou, porque foi seguro por companheiros.

Depois do Flamengo, treinou o Corinthians e o Coritiba. Em 1977, foi para o Cruzeiro (MG) e encontrou um grupo de jogadores quase todos cabeludos, alguns barbudos e outros com penteado estilo black-power. Não se conteve e perguntou: “esse é um time de rock?” A primeira providência desagradou os jogadores: proibiu o jogo de sinuca na concentração. Ainda assim, o Cruzeiro foi campeão mineiro.

Yustrich foi dispensado do clube por conta de um fato banal. Após uma partida em Araxá, o jogador Roberto Batata deu a camisa para um garoto. Yustrich mandou o roupeiro buscar de volta. Na época, todos em Minas tinham medo dele. Ninguém desconhecia que gostava de ameaçar e bater em jogadores, e até por obrigar um então presidente do Atlético Mineiro a se abaixar e pegar uma caneta que tinha caído, em clara demonstração de poder.

No entanto o vice-presidente do Cruzeiro, Carmine Furletti enfrentou o furioso treinador, não permitindo que a camisa fosse trazida de volta. O dirigente foi curto e grosso “Aqui você não manda nada, é empregado e ponto final!”. A camisa ficou com o garoto. Foi o bastante para a diretoria se reunir à noite e tomar a decisão de demitir o técnico, que foi notificado através de uma carta.

A responsabilidade de entregar a correspondência ficou a cargo do supervisor Robson José. Ele viajou até o sítio do treinador, em Vespasiano. Há quem diga que o supervisor, temendo a reação explosiva do Homão” jogou a carta por debaixo da porta, tocou a campainha e saiu correndo.

O incidente foi só o pretexto para mandar Yustrich embora. Ele estava desgastado por tentar barrar o zagueiro Brito, por que tinha o hábito de fumar. Não conseguiu. Em represália, substituía o jogador sempre que possível. O craque se irritou a tal ponto que, ao ser substituído pela décima vez, jogou a camiseta suada no rosto do treinador e saiu em disparada. Seria suicídio enfrentar aquele brutamonte, mesmo já envelhecido.

Yustrich encerrou no Cruzeiro sua carreira de treinador. Retirou-se para o mais completo anonimato e só voltou a ser notícia quando morreu, em 15 de fevereiro de 1990. (Texto e Pesquisa: Nilo Dias)
Yustrich, um técnico de muita competência, mas "durão" ao extremo. (Foto: Acervo do C.A. Mineiro)

domingo, 11 de maio de 2008

Sima, o “Pelé do Piauí”

Dia desses um amigo meu se queixava da grande imprensa brasileira, principalmente a Rede Globo que dedica os maiores espaços de seus noticiários esportivos para os clubes de futebol do Rio de Janeiro e São Paulo. Lá de vez em quando se fala alguma coisa sobre os clubes de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e algum outro Estado que tenha representante na Série A do Campeonato Brasileiro. E os outros? Absolutamente nada, a não ser que aconteça alguma coisa de ruim. Lembrem as mortes acontecidas no Estádio da Fonte Nova, na Bahia. Por vários dias o acidente ocupou grandes espaços na mídia.

O amigo tem toda a razão. Mas, convenhamos o próprio torcedor é culpado nessa situação, pois além de comprar os pacotes de transmissão dos jogos, ainda torce por equipes de fora do seu Estado de origem. No Nordeste isso acontece com freqüência. No Distrito Federal, é bem pior. Nunca vi um jogo no Estádio Mané Garrincha, em que o time local tivesse mais torcedores que o adversário. A imprensa sabe disso, e não vai mesmo dar importância para quem não está na vitrine. É a velha história do peixe maior que come o menor.

O meu amigo é do Piauí e mora em Brasília há vários anos. E torce pelo Flamengo, o do Rio de Janeiro. Quer dizer, não dá para entender a preocupação com o futebol da sua terra, onde tem um cronista esportivo de apelido Garrincha, um jogador de nome Maradona e um time chamado Flamengo. De qualquer maneira, procurei pesquisar sobre a carreira de um jogador piauiense, que esse meu amigo falou maravilhas. E confesso que nessa particularidade existe mesmo desinformação. Eu nunca tinha ouvido falar no jogador Sima, que foi chamado por lá de “Pelé do Piauí” e “Pelé do Nordeste”.

Simão Teles Bacelar, é o nome da fera, nascido em 7 de março de 1948, na cidade de Miguel Alves (PI). Não encontrei nada que explicasse o porquê do apelido Sima, mas é fácil perceber que isso tem a ver com o nome Simão. Mas o importante é que ele está inserido na seleta lista dos 10 maiores artilheiros do futebol brasileiro em todos os tempos, ao lado de Friedenreich, Pelé, Zico, Roberto Dinamite, Romário, Túlio e outros monstros sagrados.

Entre 1969 e 1983, o centroavante conseguiu a proeza de ser dez vezes o artilheiro do campeonato estadual. Em 1977 foi o maior goleador dos campeonatos estaduais em todo o país, quando fez 33 gols jogando pelo River Atlético Clube. O que, convenhamos é um feito para ficar na história.

Sima fez 529 gols em toda a carreira, números impressionantes para quem jogou apenas em clubes sem muita expressão no cenário futebolístico nacional. Ele me lembra um artilheiro lá do Rio Grande do Sul, Antônio Azambuja Nunes, o “Nico”, um grande amigo meu, que fez mais de 700 gols jogando no Rio-Grandense, de Rio Grande.
Mas essa é outra história, que oportunamente quero contar.

A carreira de Sima teve início nos juvenis do Piauí Esporte Clube em 1964. Na temporada de 1967 defendeu Barras no torneio Intermunicipal e foi o artilheiro da competição com 12 gols. Em 1968 passou a titular do Piauí e começou uma trajetória de títulos e gols. No próprio Piauí, no Tiradentes e no River foi várias vezes campeão estadual e bateu todos os recordes de gols.

O artilheiro, que hoje é empresário no ramo de material esportivo lembra de dois gols marcantes na carreira: em 1974, contra o Internacional de Figueroa e companhia, em pleno Estádio Beira Rio, em Porto Alegre, na derrota do River por 2 X 1. E em 1975, em São Januário, no Rio de Janeiro no empate de 1 X 1 do extinto Tiradentes, com o Vasco. O gol que ele considera o mais bonito da carreira foi marcado contra o Botafogo, no Maracanã, em 1982, num chute quase sem ângulo.

Lá pelas bandas do Piauí correu uma história de que o clube que almejasse ser campeão estadual teria de contar com Sima e mais 10. Uma vez ele fez quatro gols num jogo contra o América de Natal, pelo Campeonato Brasileiro e ficou algumas semanas como artilheiro isolado da competição, na frente de Zico, Roberto Dinamite e Serginho Chulapa.

Mesmo com toda a predestinação de artilheiro, Sima não chamou a atenção de nenhum grande clube do centro do país. Sua carreira foi quase toda limitada aos clubes do Piauí e do Nordeste, principalmente, o River. Em 1972 jogou o campeonato baiano e o Brasileirão pelo Bahia, sem muito brilho. Sua passagem pela “boa terra” é lembrada pelo gol que marcou contra o time rival do Vitória, no clássico que levou o tricolor baiano até as finais do campeonato.

Na pesquisa que fiz, o que mais me chamou a atenção sobre Sima, não foi nem seu faro de gol, técnica, velocidade ou qualquer outra coisa do gênero, sim a disciplina. Ele nunca sofreu uma punição na carreira, o que lhe valeu o prêmio Belfort Duarte, que era outorgado pela CBF ao atleta que ficasse 10 anos sem ser expulso de campo.

Os 529 gols que marcou foram divididos assim: River (PI) (1977 a 1983 e 1987), 185; Piauí (1966 a 1971 e 1984 a 1986), 156; Tiradentes (PI) (1973 a 1976), 93; Auto Esporte (PI) (1983/1984), 30; Ferroviário (CE) (1981), 12; Seleção de Barra (PI), 12; Flamengo (PI), 10; Moto Clube (MA), 09; Bahia, 09; Seleção Piauiense, 04; Seleção da Agpi (PI), 04; Sergipe (SE), 02; Seleção Prata da Casa (PI), 02; Leônico (BA), 02 e Seleção de Teresina (PI), 01. (Texto e pesquisa: Nilo Dias)
Sima, o maior craque da história do futebol piauiense (Foto: Site do River Atlético Clube)

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Tesourinha, o “Craque Melhoral”

Osmar Forte Barcellos, o Tesourinha, nasceu em Porto Alegre no dia 3 de outubro de 1921 e foi eleito pela torcida o melhor jogador de toda a história do S.C. Internacional. Dono de invejável habilidade e técnica sabia driblar com facilidade e chutar com precisão, o que lhe valeu a condição de emérito artilheiro. Foi um dos jogadores gaúchos mais laureados do futebol brasileiro em todos os tempos.

O apelido Tesourinha, ele ganhou nos tempos em que participava de um bloco carnavalesco de Porto Alegre, chamado “Os Tesouras”. A carreira de jogador de futebol teve início no clube amador do Ferroviário da Ilhota, uma antiga vila de Porto Alegre, hoje Praça Garibaldi. Em 1939, foi convidado a fazer testes no Internacional, sendo aprovado.

Tesourinha gostava de jogar como centroavante, mas teve de se contentar com a ponta-direita, devido à concorrência com Carlitos, um dos grandes jogadores da história do clube e maior artilheiro gaúcho de todos os tempos, com 485 gols. Seu jogo de estréia no Internacional foi pelo campeonato municipal, em 23 de outubro de 1939, com vitória de 2 X 1 sobre o Cruzeiro, na época a terceira força da capital gaúcha. O primeiro gol que marcou como profissional foi num jogo amistoso contra o Força e Luz, outro time de Porto Alegre já extinto, em 14 de dezembro daquele ano, com vitória do Internacional por 7 X 0.

Quando chegou ao Internacional em 1939, vindo de uma família muito pobre e com um físico bastante franzino, a diretoria do clube autorizou uma padaria próxima ao estádio dos Eucaliptos, a lhe entregar todos os dias meio quilo de carne e dois litros de leite, para que melhor alimentado ganhasse massa muscular.

Com a seqüência de treinos começou a mostrar um grande talento, impressionando a todos pela habilidade e velocidade, virtudes que o acompanharam durante toda a vitoriosa carreira. Ninguém brilhou mais do que ele naquele fabuloso time do Internacional, chamado de “Rolo Compressor”, que garantiu ao clube oito títulos estaduais em nove anos.

O nome “Rolo Compressor” foi criado por um dos mais fanáticos torcedores colorados que existiram, Vicente Rao que ganhou fama nacional ao alegrar os carnavais de Porto Alegre como Rei Momo, num longo reinado de 22 anos, de 1950 a 1972. Foi jogador do Internacional na década de 20, fazendo parte do grupo que conquistou o primeiro campeonato gaúcho para o clube, em 1927. Foi ele quem criou as primeiras escolinhas de futebol do Internacional.

Vicente Rao nasceu em 4 de abril, data de aniversário do Internacional e gostava de dizer que não havia nascido, sim inaugurado. Exímio desenhista, fazia desenhos dos jogadores do time do Internacional em forma de um rolo compressor, amassando todos os adversários. Depois, levava essas charges para o seu amigo e também torcedor colorado, o jornalista Ari Lund que as publicava no jornal “Diário de Notícias”.

Também é dessa época o surgimento das grandes bandeiras e entradas do time em campo abaixo de foguetes, serpentinas e uma barulhada de sinos e sirenes. Por iniciativa de Rao surgiu nessa mesma década a primeira torcida organizada do Internacional e do Estado, denominada "Camisa 12", que existe até hoje.

Em 1948 aconteceu um concurso nacional para escolha do “Melhoral dos Craques”, patrocinado pela “The Sydney Ross Company”, fabricante do famoso comprimido. A torcida do Internacional votou em peso no seu maior ídolo, e não deu outra, Tesourinha foi o vencedor com 3.888.440 votos e ganhou como prêmio um apartamento no bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro.

Uma outra prova do prestígio de Tesourinha foi durante seu casamento, em 1944: os torcedores do Internacional lotaram a igreja e as ruas próximas. Até a Brigada Militar teve de ser acionada para evitar um tumulto de proporções, tal a multidão que disputava espaço para ver o grande craque.

A fama do habilidoso jogador ultrapassou as fronteiras do Sul e em 1944 foi convocado pelo treinador Flávio Costa para a Seleção Brasileira, que disputou a Copa Rio Branco. No jogo de estréia, no Estádio de São Januário contra a Seleção do Uruguai, em 15 de maio marcou um dos gols da goleada de 6 X 1. O ataque brasileiro nesse jogo formou com Tesourinha – Lelé – Isaias – Jair e Lima.

No Campeonato Sul-Americano de 1945, disputado no Chile e ganho pela Argentina, foi titular absoluto em todos os seis jogos da Seleção e craque da competição. Entre seus companheiros estavam alguns dos “cobras” de então: Ademir, Leônidas da Silva, Heleno de Freitas e Zizinho.

Em 1949, participou de nova edição do Sul-Americano de Seleções, disputado no Rio de Janeiro, quando fez 7 gols. O Brasil foi campeão e ele outra vez o melhor atleta. A seleção base do Brasil na competição foi esta: Barbosa - Augusto e Mauro - Eli – Danilo Alvim e Noronha – Tesourinha – Zizinho – Ademir - Jair e Simão.

Ainda em 1949, o jogador teve o passe vendido ao Vasco da Gama por 300 contos de réis, quantia considerada uma fortuna na época. Estreou no clube carioca no dia 4 de janeiro de 1950, fazendo de falta um dos gols da vitória de 5 X 2 sobre a Portuguesa de Desportos, em jogo do Torneio Rio São Paulo. O craque gaúcho fez parte do lendário time apelidado de “Expresso da Vitória”. Tinha participação certa na Copa do Mundo de 1950, mas num jogo contra o Corinthians, no Pacaembu machucou um joelho e nunca mais conseguiu ficar bom totalmente.

Em 1952 retornou ao futebol gaúcho. Queria jogar no Internacional, mas o presidente colorado Joaquim Difini não concordou. Foi então que o conselheiro gremista e jornalista, Aparício Viana e Silva lhe fez o convite para jogar no Grêmio, pois havia um grupo forte que queria acabar com o preconceito no clube. Tesourinha aceitou. No dia da sua estréia, 16 de março de 1952, um amistoso com vitória de 5 X 3 sobre o Juventude, o vice-presidente tricolor, Luis Assunção declarou para a imprensa: “Tesourinha acabou com o arianismo no Grêmio. É um abolicionista que o Vasco nos mandou”. Permaneceu no Grêmio até 1955, quando aos 34 anos resolveu parar, já que a lesão no joelho não lhe permitia mais apresentar o mesmo brilhantismo dos tempos de Internacional.

O Grêmio lhe ofereceu um jogo de despedida, foi contra o Corinthians, no estádio Olímpico. Pouco antes de começar a partida, Tesourinha entrou em campo vestindo a camisa do Nacional e acompanhado de seis garotos com as camisas dos clubes que ele defendeu. Era o “Dia do Cronista”. O craque respirou fundo tirou a camisa, as chuteiras e as meias, entregou tudo aos garotos e se encaminhou para o túnel chorando. E a torcida de pé aplaudiu.

Em 1957 fez alguns jogos pelo Nacional de Porto Alegre, clube ligado a classe ferroviária e já extinto, apenas para completar o tempo de aposentadoria. Em 1960 tentou seguir a carreira de técnico, ao dirigir o Futebol Clube Montenegro, da cidade gaúcha de Monte Negro, sem sucesso. Tesourinha ainda prestou serviço ao seu clube de coração, ao descobrir um outro talento que marcou história no Internacional: Valdomiro, “o craque que voava em campo”. Por indicação sua ele foi contratado junto ao Comerciário, de Criciúma (SC), em 1968 e se tornou um dos maiores ídolos da história do clube.

Tesourinha conquistou estes títulos: no Internacional, campeão gaúcho em 1941, 1942, 1943, 1944, 1945, 1947 e 1948. No Vasco, campeão carioca em 1949, 1950 e 1952. Na Seleção Brasileira, campeão da Copa Roca, em 1945, Copa Rio Branco, em 1947 e Sul-Americano de 1949.

Na partida amistosa de despedida do Estádio dos Eucaliptos, em 26 de março de 1969, quando o Internacional venceu o S.C. Rio Grande, de Rio Grande por 4 X 1, Tesourinha vestiu a camisa colorada pela última vez, tendo, na época, 47 anos de idade. Entrou apenas no segundo tempo, substituindo Bráulio. Ao final da partida, o craque retirou as redes de uma das goleiras do estádio para guardá-la como recordação.

O craque faleceu em 1979, aos 57 anos, vitimado por um câncer no estômago. A cidade onde nasceu não o esqueceu. Seu nome foi imortalizado no Ginásio de Esportes Osmar Forte Barcelos, popularmente chamado pelos porto-alegrenses, de “Tesourinha”. E foi um dos homenageados na coleção de livros em formato de bolso, “Esses Gaúchos”, que era adquirida junto com o jornal “Zero Hora”, em 1985.

A coleção também focou nomes ilustres da história riograndense como Getulio Vargas, Lupicinio Rodrigues, Fernando Apparício Brinkerhoff Torelly, o Barão de Itararé, João Goulart, Leonel Brizola, Elis Regina, Érico Veríssimo, Roberto Landell de Moura, Flores da Cunha, Teixeirinha, Simões Lopes Neto, Sepé Tiraju, Honório Lemes, Mário Quintana, Fernando Ferrari, Pinheiro Machado, Júlio de Castilho, Gildo de Freitas, Luis Carlos Prestes, Alceu Wamosy, Padre Reus, Silveira Martins, Oswaldo Aranha, Assis Brasil, Bento Gonçalves da Silva e Alvaro Moreyra, entre outros.

Eu não vi Tesourinha jogar como profissional. Mas em 1973 tive a imensa felicidade de participar de um jogo festivo entre uma Seleção de Veteranos do Futebol gaúcho e do G.A. Farroupilha, de Pelotas, em que ele estava presente. Faltou gente no time pelotense e tive a sorte de entrar em campo e atuar os 90 minutos. Eu tinha 33 anos e ainda rolava uma bola redondinha pelos times amadores da cidade. E depois sentei ao lado de Tesourinha no churrasco servido no próprio Estádio Nicolau Ficco e conversamos um papo agradável. Por algumas coisas que aconteceram em minha vida, às vezes me sinto um iluminado. Esta foi uma delas. (Texto e pesquisa: Nilo Dias)
Tesourinha foi eleito pela torcida o maior craque da história do Internacional (Foto: Acervo do S.C. Internacional)

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Almir, o craque brigão

Uma das figuras mais extraordinárias, dramáticas e polêmicas do futebol brasileiro em todos os tempos, sem dúvida foi Almir Morais de Albuquerque, o “Almir Pernambuquinho”, nascido em Recife no dia 28 de outubro de 1937 e falecido em 6 de fevereiro de 1973, no Rio de Janeiro. A personalidade forte, aliada a uma boa técnica fez dele um jogador imprescindível nas equipes em que atuou, pois nunca deixou de mostrar dentro de campo uma disposição incomum.

Catimbeiro, valente e brigão foi o mínimo que a imprensa esportiva da época o chamou. Adjetivos que tiveram o acréscimo de desleal e mau caráter, depois de ter quebrado a perna do zagueiro Hélio, do América do Rio, em 1959. Se jogasse hoje, certamente seria chamado pelo nome moderno de “bad boy”, um jogador que cria tanto problema que ofusca seu imenso talento.

Almir foi revelado pelo Sport Clube do Recife (1956), de onde foi para o Vasco da Gama (1957 a 1960), aos 19 anos de idade, tornando-se em pouco tempo ídolo da torcida. Depois andou por Corinthians (1960), Fiorentina, da Itália (1961), Boca Juniors, da Argentina (1961), Genoa, da Itália (1962), Santos (1962 a 1964), Flamengo (1964 a 1967) e América, do Rio de janeiro (1967 a 1968), onde encerrou a carreira. Fez sete jogos pela Seleção Brasileira e marcou dois gols.

Os principais títulos de Almir foram: Super-Supercampeão pelo Vasco em 1958; campeão da Taça Brasil de 1963 e 1964 pelo Santos; Campão Paulista de 1964, campeão da Copa Libertadores da América de 1963 e do Mundial Interclubes de 1963, todos também pelo Santos Futebol Clube.

Dono de uma personalidade forte e explosiva ganhou fama de encrenqueiro e foi principal protagonista de diversas brigas. As mais famosas foram a batalha campal no jogo entre as seleções do Brasil e do Uruguai, em 1959 e a briga generalizada na final do Campeonato Carioca de 1966, jogo que ficou conhecido pela denúncia de um grande numero de jogadores na “gaveta”, inclusive o árbitro. Naquele ano, Almir atuava pelo Flamengo e, aos 26 minutos do segundo tempo, o Bangu vencia por 3 a 0.

Quase ao término do jogo, para impedir mais gols e a volta olímpica do time banguense, Almir, enfurecido, partiu para cima dos adversários distribuindo pontapés, socos e cabeçadas. Todo o mundo brigou e o juiz expulsou cinco jogadores do Flamengo, quatro do Bangu e acabou o jogo. O Bangu foi campeão, mas não deu a volta olímpica. Pesquisando jornais da época descobri algumas declarações do jogador, depois do jogo:

“Não dava para fazer outra coisa, a não ser brigar. O ponta-direito Carlos Alberto estava machucado e só fez número em campo. O nosso goleiro Waldomiro estava tremendo e não era para ter jogado. O Bangu estava em tarde endiabrada e foi empilhando gols. O “Sansão” (Airton Vieira de Morais) já havia expulso dois dos nossos jogadores. Continuasse assim, a gente ia levar um saco de gols e eu resolvi acabar com o carnaval. Quem passou pela minha frente apanhou”.

No Boca Juniors, treinado pelo técnico brasileiro Vicente Feola, campeão do mundo em 1958, Almir protagonizou uma grande confusão num jogo contra o Chacarita Juniors, pelo campeonato argentino. Ele vinha de lesão e não queria jogar. Mesmo assim foi escalado. O adversário fez 1 X 0 e a torcida vaiava Almir. Sorte, que o empate veio no primeiro tempo. Logo no começo do segundo tempo Almir arrumou uma briga, na tentativa de ser expulso junto com dois ou três jogadores do Chacarita. Mas só ele foi para a rua. Quando saía de campo, um jogador do Chacarita o ofendeu. Não deu outra. Almir acertou-lhe um violento soco no rosto e aí todo o mundo brigou. Dois jogadores do adversário foram expulsos e Almir saiu de campo como herói. Ao final, o Boca ganhou o jogo.

Ainda quando jogava pelo clube argentino, em um clássico contra o River Plate, deu uma entrada violenta em um jogador adversário, que saiu contundido. Naquela época não era permitido fazer substituição, e foi expulso. Indo para o vestiário, agrediu outro jogador do River que revidou e também foi expulso. O Boca ficou com dez e o River com apenas nove jogadores em campo.

Mas não foi só de brigas ganhas a vida de Almir. Num jogo do Corinthians, em pleno Parque São Jorge contra o Jabaquara, o valente “Pernambuquinho” encostou o pé em Célio, não menos brigão e duro zagueiro do “Jabuca”. Garoto valente, Célio não afinou, revidou na hora. O Almir ficou louco e partiu para cima. Aí é que não prestou. O jogador do Jabaquara deu um pulo para cima e mandou um pontapé na cara do atacante, que saiu de maca e não voltou mais para o jogo.

Até hoje muitas coisas são contadas a respeito de Almir, mas a maioria não passa de lenda. Os jornalistas Fausto Neto e Maurício Azedo acompanharam Almir durante três meses, quando fizeram uma entrevista que depois de publicada em capítulos semanais na revista “Placar” virou o livro “Eu e o Futebol”. No depoimento, além de fatos de sua vida e denúncias dos bastidores do futebol, constam divertidos diálogos com os treinadores Renganeschi e Yustrick.

O técnico Armando Renganeschi, argentino exigente, perguntou ao jogador, porque bebia tanto. E a resposta: “Olha, seu Renga, não paro por duas coisas. Porque gosto e a bebida não me prejudica. Eu não treino direito? Não estou sempre em forma? Alguma vez deixei de jogar a não ser por contusão grave?”. Renganeschi bateu nas costas de Almir e foi embora.

Com o técnico Iustrick, também famoso pela intolerância, teria acontecido este diálogo: “Almir, você não acha que Copacabana fica muito distante do Vasco?”. E Almir: “Não acho não”. Iustrick: “Mas eu acho que você tem que morar perto do Vasco”. Almir: “Eu não”. Iustrick: “Estão escolhe, o Vasco ou Copacabana”. Almir: “Copacabana”. E Iustrick não tocou mais no assunto.

Em cada time que passou, Almir foi reverenciado: “O menino durão do Vasco”. “O homem furioso do Flamengo”. “O herói da “Bombonera”, no Boca Juniors. “O garoto que brigou pela seleção com meio time uruguaio”. “Um homem próspero, tomador de cerveja que sempre amou uma coisa: a vitória”. Quando de sua ida para o Corinthians foi chamado pelo folclórico presidente Vicente Matheus, de "Pelé Branco".

Quando jogou no Santos o famoso escritor Nelson Rodrigues o chamou de "Divino Delinqüente", depois de uma brilhante atuação no jogo final do Mundial Interclubes de 1963 contra o Milan. Os dois times vinham de duas partidas eletrizantes, onde cada um havia vencido por 4 X 2. Vejam o que é o destino: no terceiro e decisivo jogo, em 16 de novembro, Pelé se machucou aos 30 minutos do primeiro tempo e Almir o substituiu. Jogou um partidaço: fez um gol e ainda sofreu o pênalti inexistente que resultou no gol do título para o Santos.

No livro “Eu e o Futebol”, chama atenção duas revelações de Almir relacionadas a esse jogo decisivo contra o Milan: ter entrado em campo dopado e sabendo que o árbitro Juan Brozzi estava "comprado", assim poderia bater a vontade sem ser expulso.

Esse foi Almir, considerado o atacante mais brigão e corajoso da história do futebol brasileiro e mundial. Sua coragem e personalidade forte lhe custaram a vida. O jornalista Mário Prata, que presenciou tudo naquela noite fatídica de 6 de fevereiro de 1973, no bar “Rio-Jerez”, frente a Galeria Alaska, em Copacabana escreveu uma crônica no jornal “O Estado de São Paulo”, em 12 de janeiro de 1994, quando dos 20 anos da morte do jogador, contando como foi o crime.

Em uma mesa estavam o Almir, uma namorada e um casal de amigos. Na mesa de trás, três portugueses. Na frente da mesa de Almir, os atores gays do espetáculo “Dzi Croquetes”, ainda maquiados depois de mais um dia de trabalho. Os portugueses resolveram caçoar dos atores, chamando-os de veados, paneleiros e outras coisas. Almir não gostou do que ouviu e resolveu defender os atores, que não reagiram. Começou a discussão, até que um dos portugueses sacou um revólver, o amigo de Almir sacou outro e o tiroteio rolou solto no calçadão da Avenida Atlântica.

Os outros dois portugueses também sacaram as armas, os atores gritavam, foi uma correria, mesas foram viradas e pelo menos uns 30 tiros disparados. Quando o tiroteio parou, lá estava Almir no chão, já morto com um tiro na cabeça. Os portugueses saíram correndo. Debaixo de um coqueiro, o amigo de Almir agonizava com um tiro nas costas. Morreu ao dar entrada no hospital. As duas namoradas, apavoradas, gritavam. O resto foi silêncio. Esse crime nunca foi esclarecido pelas autoridades. Os portugueses sumiram e o grupo “Dzi Croquetes” há muito tempo não existe mais.

Fim trágico para quem nunca teve medo de nada. E por uma dessas armações que a vida prega, o violento e machão craque brasileiro morreu defendendo um grupo de homossexuais. No velório de Almir, sua mãe, dona Dedé, aos prantos gritava: "Meu Deus, para quê tanta glória? Preferia meu filho desconhecido, mas vivo". (Texto e pesquisa: Nilo Dias)
Almir, aos tempos de Vasco da Gama (Foto: Acervo do C.R. Vasco da Gama)

quarta-feira, 7 de maio de 2008

Um colecionador de faixas de campeão

Com Romário aposentado, é bem possível que o goleiro Clemer, do Internacional (RS) seja hoje o segundo jogador de futebol mais velho em atividade no Brasil. O primeiro, até a Fifa reconhece, é Pedro Ribeiro Lima, o dono da Associação Desportiva Perilima, da Paraíba, que tem 59 anos. É difícil afirmar que não tenha nenhum outro jogador com mais idade que Clemer atuando por algum pequeno clube, por este gigantesco Brasil afora.

Mais velho, ou não, de nada importa. A verdade é que Clemer Melo da Silva, 1,90 metro, 90 quilos, nascido em São Luis do Maranhão, em 30 de outubro de 1968 é hoje um dos melhores e mais respeitados goleiros brasileiros. Começou a sua carreira profissional no ano de 1986, no Maranhão Atlético Clube de São Luis. Dali se transferiu para o também maranhense Moto Clube. Suas boas atuações chamaram a atenção de clubes de fora do Estado, sendo contratado pelo então competitivo time do Ferroviário cearense.

Já mais conhecido, Clemer peregrinou pelo Santo André (SP), Catuense (BA), Guaratinguetá (SP), Clube do Remo (PA), Goiás (GO), Bahia (BA), até chegar a Portuguesa de Desportos (SP), onde realmente ganhou projeção nacional. Não demorou muito para que o Flamengo (RJ) o contratasse. E finalmente o Internacional, onde se encontra desde 2002. Em 1996, quando ainda jogava na Portuguesa de Desportos, e em 1999, quando defendia o Flamengo, Clemer foi convocado para a Seleção Brasileira.

Acho bastante difícil que algum outro jogador no futebol brasileiro tenha conseguido tantos títulos como Clemer, que chegou a dizer que não sabe mais o que fazer com tantas faixas: tricampeão paraense, pelo Clube do Remo, campeão goiano, pelo Goiás, tricampeão carioca, campeão da Mercosul, campeão da Copa dos Campeões Brasileiros e Campeão da Copa Guanabara, pelo Flamengo, cinco vezes campeão gaúcho, campeão da Copa Libertadores da América, Campeão Mundial de Clubes, campeão da Recopa Sulamericana e campeão da Copa Dubai, pelo Internacional.

Apenas como curiosidade cito o goleiro português Vitor Bahia como o maior colecionador de títulos do mundo. Que fantástica carreira: 10 Ligas Portuguesas (89/90, 91/92, 92/93, 93/94, 95/96, 98/99, 02/03, 03/04, 05/06, 06/07); 5 Taças de Portugal (90/91, 93/94, 99/00, 02/03, 05/06); 8 Supertaças de Portugal (89/90, 90/91, 92/93, 93/94, 02/03, 03/04, 05/06); 1 Liga Espanhola (97/98) ; 2 Copas do Rei de Espanha (96/97, 97/98); 1 Supertaça Espanhola (97/98); 1 Taça das Taças (96/97); 1 Taça UEFA (02/03); 1 Liga dos Campeões (03/04) e 1 Taça Intercontinental (04)

O goleiro Clemer é um tremendo bom caráter, incentivador dos jogadores mais jovens, um dos líderes do grupo e ídolo da torcida, tem contrato com o Internacional até dezembro deste ano, quando já terá completado 40 anos. Confessa que o colorado gaúcho é o clube que aprendeu a gostar e onde conheceu as maiores alegrias. Com toda a certeza vai permanecer no “colorado gaúcho” por muito tempo, como preparador de goleiros.

O jornalista Alexandre Alliatti, correspondente do globoesporte.com, em Porto Alegre escreveu este bonito artigo, após a vitória do Internacional por 8 X 1, frente o Juventude, de Caxias do Sul, domingo passado, que eu tomo a liberdade de reproduzir:

Se Clemer colocasse sobre o peito todas as faixas que já ganhou pelo Internacional, ficaria parecendo uma múmia. Ele é o goleiro mais vitorioso dos 99 anos de vida do clube colorado. Em sete anos de Beira-Rio foi campeão em todas as temporadas: campeão gaúcho, em 2002, 2003, 2004 e 2005; em 2006, campeão da Copa Libertadores da América e do Mundial de Clubes; em 2007, da Recopa Sul-Americana; em 2008, em apenas cinco meses, já ganhou a Copa Dubai e outro Campeonato Gaúcho. Desta vez, teve até gol, o oitavo do time na goleada de 8 a 1 sobre o Juventude.

“É que o pessoal não deixa eu fazer mais cobranças. Se deixassem, eu faria mais - empolga-se o camisa 1”. Clemer tem noção de sua importância na história do clube. O Internacional teve goleiros inesquecíveis, como Manga e Taffarel, mas nenhum deles levantou tantas taças quanto ele. “Não tem como expressar o orgulho que sinto. São sete anos aqui, e os outros talvez não ficaram tanto tempo, ou ficaram até mais. Isso é o que menos importa. O que sei é que outros títulos virão. Escreve aí: outros títulos virão. Tem a Copa do Brasil. Estamos de olho. Já estamos nas quartas”, comenta.

Além de tudo, o goleiro tem santo forte. Ele só foi o titular porque Renan, que vinha jogando, pegou hepatite e ficou fora da reta final da competição. A chegada de Clemer ao Beira-Rio, em 2002, coincide com a largada de um novo momento do Internacional, com Fernando Carvalho como presidente. O goleiro viveu de corpo presente todas as principais conquistas vermelhas nos últimos tempos.

Depois de domingo eu fiz uma pequena pesquisa para saber se Clemer não tinha marcado nenhum gol, quando defendia outro clube. E realmente não fez. Mas descobri uma raridade que ficou no esquecimento e ninguém lembrou neste novo momento de glória porque vive o goleiro colorado, quando a torcida de pé pediu que ele batesse o pênalti contra o Juventude. No campeonato brasileiro de 2003, Clemer fez um gol contra o Vitória da Bahia, em jogo pelo Campeonato Brasileiro, depois de uma confusão na área adversária. Mas o gol não valeu, o juiz marcou impedimento. E este ano, em um treino do Internacional fez um gol de bicicleta.

O Internacional tem uma histórica tradição de revelar bons goleiros. E parece que isso vai ser mantido, ainda por muito tempo. Estão aí Renan, favorito para vestir a camisa 1 da Seleção Olímpica, na China, e Muriel, várias vezes convocado para seleções brasileiras de base. E de prontidão duas novas caras: Agenor, 18 anos, e Alisson, irmão de Muriel, 15 anos e 1,88 metro. A dupla está treinando forte no grupo profissional e poderá ser aproveitada assim que for preciso no time colorado. E tem também Luiz Carlos, que sofreu uma lesão no final da temporada passada e já treina normalmente junto aos demais goleiros.

Renan, que está voltando aos treinos depois de enfrentar problemas de hepatite C, é recordista de invencibilidade de um goleiro colorado em campeonatos nacionais, até então ostentado por Taffarel. Ficou oito jogos sem ver suas redes balançarem. Antes dele, Taffarel havia ficado sete jogos e 72 minutos sem sofrer gols, na Copa União de 1987. A marca mais expressiva, no entanto, ainda é de Gainete, que ficou invicto em 1.202 minutos, quase 14 jogos, em 1970. (Texto e pesquisa: Nilo Dias)
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Clemer talvez seja hoje o jogador brasileiro com maior número de títulos conquistados (Foto: Site do S.C. Internacional)

terça-feira, 6 de maio de 2008

O futebol veste rosa

O recente escândalo envolvendo o jogador Ronaldo Fenômeno fez ressurgir a polêmica da existência de gays no mundo do futebol. É claro que ninguém está jogando no atleta a pecha de homossexual, muito pelo contrário. Ronaldo sempre foi um mulherengo inveterado e conquistou algumas das mulheres mais bonitas do mundo. Agora, ao que parece ele passou por aquilo que se chama de “hora boba”, ao ir para um quarto de motel com três homossexuais.

Neste artigo quero mostrar alguns fatos que a imprensa dificilmente comenta. São verdadeiros tabus. Será mesmo que procede aquele velho e surrado ditado que diz ser o futebol um esporte só de machos? Grosso modo, sim, mas a história está mudando. Já temos o futebol feminino, que cada vez mais se firma em todo o mundo. E o futebol disputado por gays dá seus primeiros passos.

Mas não vai ser uma tarefa fácil, o machismo ainda predomina. Todos devem estar lembrados do caso que envolveu o jogador Richarlyson, do São Paulo Futebol Clube que entrou com uma ação na Justiça contra o dirigente José Cyrillo Júnior, da Sociedade Esportiva Palmeiras que durante uma entrevista na TV Record o chamou de homossexual.

O juiz de Direito Manoel Maximiano Junqueira Filho, encarregado de julgar o caso, emitiu uma sentença negando o andamento da ação. E disse com todas as letras que “gays não podem praticar o futebol, que é um jogo viril, varonil, não é para homossexuais”. E mais adiante escreveu: “Não sou contra que gays joguem futebol, mas que formem seus times e iniciem uma federação só deles”.

Depois, em entrevista ao programa "Fantástico" da TV Globo, o jogador negou que seja homossexual e disse que pretendia casar. Ele contou também que, caso fosse gay, não teria nenhum problema, já que só deve satisfações à família.

A televisão deu ênfase o ano passado a “Copa do Mundo de Futebol de Gays e Lésbicas”, disputada pela primeira vez na América do Sul. Buenos Aires, na Argentina, foi escolhida como sede, por ter sido a primeira cidade da região a aprovar, no ano 2000, a união civil entre pessoas do mesmo sexo.

A competição, que é promovida pela homossexual “International Gay and Lesbian Football Association”, uma versão da heterossexual Fifa, teve a participação de equipes de 14 países e foi realizada entre os dias 23 e 29 de setembro, sem a presença brasileira. Nenhuma equipe de lésbicas foi inscrita no torneio, por falta de patrocinadores. O time argentino do “Los Dogos (DAG)” foi o campeão, vencendo na partida final o time inglês do “Yorkshires Terriers F.C.”, por 1 X 0, com gol de um jogador brasileiro.

Entre os times participantes estavam o “Uruguai Celeste”, o “Chile Gay Deportes”, a “Seleção Inter México de la Diversidad”, o venezuelano “Ávila Futbol Club”, “Yorkshires Terriers F.C.” da Inglaterra, “Nuova Kaos Milano”, da Itália e os americanos “New York Ramblers”, “San Francisco Spikes”, “Philadelphia Falcons” e o “Federal Triangles Soccer Club”, além do campeão “DAG”, de Buenos Aires. As copas anteriores foram realizadas em Londres, que será sede do evento este ano, Sidney e Boston.

O “New York Rambles”, dos Estados Unidos, fundado em 1980 é considerado o primeiro time de homossexuais da história. Depois dele teria vindo o “Kamalions”, criado por jovens homossexuais de Bilbao, capital do País Basco.

Em todo o mundo, aumenta o número de times gays. No México foi realizado o “1º Campeonato Gay de Futebol”, com a participação de cinco equipes: “El Clan”, “Fashion Team”, “The Fucker”, “Fuerza G” e “Tu Mamá”. Os juízes e bandeirinhas também eram gays.

No Brasil, país do futebol, o fenômeno ainda é tímido. Mesmo sem ter participado de nenhuma “Copa do Mundo Gay”, existiu aqui até pouco tempo um clube relativamente organizado, o “Rozas Futebol Clube” (é com z mesmo), do Rio de Janeiro, fundado em 1998 pelo piauiense Raimundo Pereira, cantor, ativista e goleiro do time. O nome foi uma homenagem aos homossexuais marcados na Alemanha nazista com o triângulo rosa.

Durante a Segunda Guerra Mundial, a perseguição nazista também teve como alvo os homossexuais. Eles eram marcados com um triângulo rosa e mandados para campos de concentração. Por esse motivo, o triângulo rosa se tornou um dos símbolos do movimento ativista gay. O time do “Rozas” participou de uma “Olimpíada Gay” e foi mostrado em um documentário da rede de tevê inglesa, BBC.

Os atletas do time costumavam entrar em campo com maquiagem forte, peruca, cílios postiços, batom, muito blush, uniforme pink, dando gritinhos e cantando “Hey, Hey, Hey, o mundo é gay que eu sei”. Um dos jogadores do “Rozas”, o auxiliar de enfermagem e cabeleireiro, Sérgio Santana, o “Kayka Sabatella”, era a grande atração nos jogos, ao correr sem sutiã, sacudindo os seus 400 milímetros de silicone em cada seio, num corpo de 115 quilos. “Kaika”, fora das quadras é a famosa “Rainha Momo Le Boy”.

Todos os jogadores do time trabalham em profissões convencionais, como auxiliar de enfermagem e cabeleireiro, mas à noite “soltam a franga” em boates gays como transformistas ou “drag queens”. “Kayca” quer retomar as atividades do grupo em breve. Flamenguista doente, já fez parte da torcida organizada “Fla Gay”. Mas parou de ir aos estádios porque sofreu ameaças de homofóbicos de vários times.

Em Lorena (SP), é disputado anualmente o “Futgay”, uma partida de futebol com o objetivo de arrecadar brinquedos para o Natal das crianças, numa promoção da Prefeitura Municipal e de quatro cabeleireiros da cidade: Beto, Rodrigo, Rinaldi e Gigi. No ano passado o jogo foi apitado pelo árbitro catarinense Clésio Moreira dos Santos, o popular “Margarida”, profissional conhecido no mundo futebolístico, que garante não ser gay, apenas representa um personagem. Ele é casado e tem filhos.

Mas existiu um verdadeiro “Margarida”. Foi o árbitro carioca Jorge José Emiliano dos Santos, falecido de AIDS, em 21 de janeiro de 1995, aos 41 anos. Homossexual assumido e folclórico, “Margarida” costumava peitar os jogadores metidos a “machões”. Sempre arrumava um jeito de mostrar o cartão amarelo para Renato Gaúcho nos jogos do Campeonato Carioca. E segundo as más línguas, sempre o fazia de um jeito um pouco mais carinhoso.

Em várias cidades é disputado um outro tipo de “futgay”, apenas de brincadeira. É o caso do bairro de São Francisco, em São Sebastião (SP), onde há 20 anos moradores e turistas se reúnem na praia vestidos de mulheres, para divertidas disputas futebolísticas. A edição deste ano aconteceu em 1 de janeiro, com muita animação.

Não podemos esquecer das torcidas “coloridas”. No Brasil, muitos times têm torcidas gays, que brigam para provar qual é a mais numerosa, a mais antiga ou a mais animada. A “Cru-Gay”, do Cruzeiro (MG), clama ser a mais antiga. Mas tem a “Flu-Gay”, do Fluminense (RJ), “Coligay”, do Grêmio (RS), “Timbugay”, do Náutico (PE) e “Galo-Gay”. A “Fla-Gay”, do Flamengo (RJ), também clama ser a primeira torcida homossexual do Brasil. Surgiu nos anos 70 e deixou de existir depois de muito apanhar de outra torcida do mesmo time, a “Torcida Jovem”. Texto e pesquisa: Nilo Dias)