Boa parte de um vasto material recolhido em muitos anos de pesquisas está disponível nesta página para todos os que se interessam em conhecer o futebol e outros esportes a fundo.

sábado, 29 de setembro de 2012

O adeus de Zé Alam

Os meios esportivos e da imprensa de Pelotas tem apresentado desagradáveis surpresas nos últimos dias. Primeiro, fiquei sabendo algumas semanas depois do ocorrido, em agosto último, da morte do meu amigo e parceiro de memoráveis jornadas esportivas na Rádio Tupancy, Antônio Carlos Alves. Agora, recebo a notícia de que ontem nos deixou o comentarista esportivo, também da Rádio Tupancy, e ex-jogador de Futebol de Salão, José Rosa Alam, que marcou época nos anos 50 e 60. Ele foi vítima de problemas no coração.

Curiosamente, os Departamentos de Futebol de Salão de E.C. Pelotas e G.E. Brasil foram fundados no mesmo ano de 1956. O do Brasil por Jorge Luiz “Fabião”, tendo ao lado o meu inesquecível compadre e amigo, Bento Peixoto Castelã, companheiro de muitas jornadas no F.B.C. Rio-Grandense, de Rio Grande. E ainda Waldir Cáceres e Francisco Antunes. O Brasil conquistou seu primeiro campeonato municipal em 1963.

No Pelotas não lembro todos os idealizadores do Futebol de Salão, mas sei que entre eles estava Zé Alam. O áureo-cerúleo mandou e desmandou nos primeiros tempos do tradicional esporte, tendo sido campeão em 1957, 1958, 1959, 1961, 1965, 1970 e 1971 e campeão estadual em 1961.

Eu lembro de uma das formações clássicas do quinteto salonista azul e amarelo, naquele ano de 1961: João Manoel - Yolko e Sidney – Fernando Rosa e Zé Alam. Antes, também jogaram pelo Pelotas, Luiz Carlos Martines, com quem anos mais tarde tive a honra de ser colega na Rádio Pelotense e Paulo de Souza Lobo, o “Galego”, o maior treinador que Pelotas já conheceu. Igualmente estivemos juntos na Rádio Pelotense, ele como comentarista, eu como narrador.

Até guardo uma foto que é verdadeira relíquia, em que apareço ao lado de "Galego", no time da Rádio Pelotense num Torneio da Imprensa. que era disputado anualmente. Não sei se ainda fazem isso nos dias de hoje. Na foto estão também Volnei Castro, Benito Amato, Amir Curi e José Carlos Cortês Sica. Timaço, na lata e na quadra.

Zé Alam também jogou no Brasil e Libaneza, que ao lado do Pelotas formavam os clubes mais fortes da cidade, na época. E em 1966 foi chamado para defender a Seleção Gaúcha. Tempos depois é que outras agremiações igualmente se sobressaíram no então chamado “esporte da bola pesada”: Agremiação Pelotense de Esportes, Paulista F.C. e E.C. Cruzeiro, todos também campeões estaduais. Não foi a toa que Pelotas ganhou o apelido de “Meca do salonismo gaúcho”.

Tempos depois, Zé Alam deixou o Pelotas e foi jogar no rival. Lembro dos times de 1966. Pelotas: Paulo Roberto – Yolko e Carlinhos – Covinha e Juruá. O Brasil tinha Carlota – Cassiano e Pedalão – Torino e Zé Alam. Além de ter sido campeão estadual pelo Pelotas em 1961, foi pelo Brasil em 1963, ano em que trocou de time, 1966, 1967, 1968 e 1969.

Zé Alam estava com 74 anos. Deixou a esposa, Beth, a filha Laura Alan, que é jornalista, e uma neta. E também uma bonita história nas quadras de Futsal, onde sem dúvida marcou presença como um dos melhores jogadores que Pelotas conheceu. Era torcedor apaixonado do Pelotas, sempre acompanhando o time de futebol de campo, onde estivesse.

Como radialista trabalhou nas rádios Universidade, Cultura, Nativa e Tupancy, onde era o chefe do Departamento de Esportes. Ultimamente, participava do programa “Conversa de Arquibancada”, que é levado ao ar de segunda a sexta-feira, das 13 às 14 horas, com apresentação do radialista Telmo Freitas.

Segundo seus colegas de imprensa, com ele se foi uma grande parte da história do futebol de Pelotas, pois era considerado uma verdadeira enciclopédia, dono de uma memória fabulosa. O velório começou na madrugada de sábado, na Capela B2 do Cemitério Ecumênico São Francisco de Paula, no bairro Fragata, em Pelotas, e o sepultamento aconteceu às 17 horas. (Pesquisa: Nilo Dias)

Zé Alam era considerado um dos melhores comentaristas esportivos de Pelotas. (Foto: João Carlos Silva)

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Uma família de craques

Oliver Roberto Bazzani, o “Bazzaninho”, nasceu na cidade paulista de Mirassol, no dia 30 de julho de 1941. Ele faz parte de uma família que tem história no futebol de São Paulo. Seu pai, Olivério Bazzani, foi zagueiro do E.C. Corinthians Paulista na década de 30. Ele participou de um jogo trágico na história corinthiana, a goleada de 8 X 0 sofrida para o Palestra Itália, atual Palmeiras, no dia 11 de novembro de 1933.

Seu irmão Olivério Bazzani, o “Rubi”, cinco anos mais velho (3/6/1935) e já falecido, é considerado o maior nome da Associação Ferroviária de Esportes, de Araraquara, em todos os tempos. A irmã Nadir foi jogadora de basquete. Os filhos de “Bazzaninho”, Rodrigo e Diego são jogadores e tentam o sucesso como profissionais da bola. Já os filhos Oliver, Jéferson e Olivério, frutos de seu primeiro casamento, preferiram ser empresários em Sorocaba.

Bazzani começou a carreira nas categorias de base do Mogiano, passou pelo Rio Preto, antes de chegar na Ferroviária, em 1954. Ele foi um meia-esquerda de muita qualidade. Fazia lançamentos longos com precisão milimétrica. Costumava jogar com a bola no chão. Era um artilheiro nato e emérito cobrador de faltas. E também auxiliava na marcação, o que fazia dele um jogador completo.

Bazzani fez parte de ataques que deixaram saudade nos torcedores da Ferroviária. Atuou ao lado de Boquita, Beni, Pio e Nei. E também de Gomes, Baiano, Téia, Maritaca e Zé Luis, entre outros. Não esquecendo Dudu, outra glória afeana, que depois se imortalizou defendendo a S.E. Palmeiras.

Com Bazzani no time, a Ferroviária viveu seus melhores momentos. Em 1959 foi terceira colocada no Campeonato Paulista, ficando na frente de São Paulo, Corinthians e Portuguesa de Desportos. Graças ao seu exuberante futebol foi convocado para Seleção Paulista que disputou o Campeonato Brasileiro de Seleções, junto com Dudu e Rosan, seus companheiros de equipe. Contribuiu para o tetracampeonato do torneio, chegando a deixar Pelé no banco, contra a Seleção Mineira.

Em 1960 participou de uma excursão da Ferroviária por gramados da Europa e África. Foram 20 amistosos em dois meses, enfrentando equipes poderosas como Belenenses, F.C. do Porto e Atlético, de Madrid. O saldo foi altamente positivo, com apenas uma derrota, para o Sporting, de Lisboa e dois empates. Na África, o time interiorano paulista aplicou muitas goleadas.

Entre os anos de 1963 e 1965 foi jogar no Corinthians. A Ferroviária realizava mais uma excursão internacional, dessa feita por gramados da América do Sul e Central, onde foi o artilheiro, com oito gols. Não participou de todos os 17 jogos realizados, pois teve de se apresentar ao novo clube.

Sem sua maior estrela, a Ferroviária acabou rebaixada para a Segunda Divisão Paulista, em 1964. E Bazzani, por sua vez, também não confirmou no Corinthians tudo o que se esperava dele. No clube do Parque São Jorge jogou 87 partidas e marcou 15 gols. Em 1965 estava de volta ao time de Araraquara, e ajudau na conquista do título de campeã paulista da Segunda Divisão de 1966. Foi o artilheiro do time, com 16 gols.

No jogo comemorativo ao título, com direito a entrega de faixas, um empate em 2 X 2 com o Cruzeiro, de Belo Horizonte, que tinha na sua formação astros da categoria de Tostão, Raul e Dirceu Lopes.

Bazzani ainda participou do tri-campeonato do Interior, conquistado pela “Locomotiva Grená”, em 1967, 1968 e 1969. Em 1968 a AFE foi terceira colocada no “Paulistão”, ficando atrás apenas Santos e Corinthians.

Para coroar tão bonita campanha, a Ferroviária teve o artilheiro da competição, o atacante Téia, com 20 gols. Foi a primeira vez em toda a história do Campeonato Paulista, que o artilheiro jogava em um clube do interior. Entre 1957 e 1970, Pelé foi o artilheiro do campeonato em 10 oportunidades, Toninho Guerreiro em duas e Flávio, do Corinthians, uma vez.

Em 1968 a Ferroviária fez o jogo de entrega das faixas de bi-campeão do interior. E enfrentou na Fonte Luminosa ao Nápoli, da Itália, que foi goleado por 4 x 0. Depois veio nova e vitoriosa excursão pela América Central. Foram 13 jogos e apenas uma derrota. Em 1970 participou da conquista da “Taça dos Invictos” e um ano antes de encerrar a carreira, Bazzani participou de um dos jogos inesquecíveis para o torcedor grená.

Foi em março de 1971, uma goleada de 4 X 1, frente o Santos de Cejas, Clodoaldo, Edu e Pelé, na Fonte Luminosa. Bazzani não começou o jogo como titular, mas quando entrou fez um dos gols da goleada, que teve 20 mil assistentes no estádio.

Sua partida de despedida foi um amistoso contra o Guarani, de Campinas em 28 de março de 1973, uma quarta-feira na Fonte Luminosa. O time visitante venceu por 1 X 0. Bazzani, então com 35 anos deu a “volta olímpica” e espalhou emoção a todos os presentes quando foi às lágrimas, descalço no centro do campo. Por tudo isso a história desse jogador se confunde com a história da Ferroviária.

Ao deixar os gramados, o craque se dedicou a profissão de cirurgião-dentista, mas em momento algum abandonou os laços afetivos com a Ferroviária. Chegou a ser treinador em várias oportunidades, tanto no profissional quanto nas categorias de base. Também trabalhou no Departamento de Futebol e em funções administrativas.

A imagem de Bazzani está imortalizada e eternizada na história do clube de Araraquara. No Estádio da Fonte Luminosa foi erguido o busto daquele que soube honrar a camisa ferroviária, como poucos. Em 18 de abril de 2007 aconteceu a festa de inauguração do busto, num jogo contra o Corinthians Paulista B, vencido pela AEF por 3 X 0. A partida foi organizada pela Prefeitura Municipal de Araraquara.

Bazzani não compareceu a festa, porque enfrentava sérios problemas de saúde, como “Mal de Alzheimer”, “Mal de Parkinson”, assim como complicações no sistema urinário e próstata. Uma cirurgia deveria ter sido realizada, mas as condições cardiológicas impediram. Assim, o velho “Rabi” não viu a cerimônia de inauguração do seu busto confeccionado em São Paulo pelo artista plástico Wagner Gallo.

Mas no estádio estiveram companheiros de grandes e inesquecíveis jornadas no time da Ferroviária, entre eles Nei, Maritaca, Fogueira, Pio, Geraldo Scalera e Peixinho. A iniciativa foi de Edinho juntamente com o presidente da Ferroviária Futebol S.A., Welson Alves Ferreira Júnior, o “Juninho”. E o mais importante é o fato da homenagem ao grande ídolo ter sido proporcionada ainda em vida, como não é usual aos grandes homens.

A esposa de Olivério Bazzani Filho, Aparecida Castro Bazzani e o prefeito Edinho Silva (PT), inauguraram o busto de bronze em homenagem ao eterno dono da camisa 10 grená. Bazzani faleceu aos 72 anos de idade, em Araraquara, no dia 13 de outubro de 2007, um sábado, pouco mais de seis meses após a derradeira homenagem que recebeu.

Voltando a falar em Oliver Roberto Bazzani, o “Bazzaninho”, irmão do saudoso craque da Ferroviária, sabe-se que em razão do sobrenome Bazzani já ter sido incorporado a figura do mano mais velho, optou por se chamar “Bazzaninho”.

Começou a jogar futebol na equipe juvenil da sua terra natal, comandada pelo técnico Anésio Pelicione, o “Matinê”. Disputou o “Amadorzão” do Estado pelo Bálsamo, até ser descoberto por Olavo Fleury e seu filho José Teóphilo Fleury Netto, são-paulinos fanáticos, que o indicaram ao tricolor.

Em outubro de 1958, o São Paulo foi jogar contra o América, em Rio Preto. O técnico Vicente Feola e o diretor Raimundo Paes de Almeida deram uma esticada até Mirassol e viram Bazaninho em ação. Não tiveram dúvida e acertaram a transferência do promissor meia-esquerda, de apenas 17 anos.

Seu pai, Olivério Bazzani ganhava Cr$ 20.00 por semana como sapateiro, e o São Paulo pagou Cr$ 12 mil a ele para levar “Bazzaninho”. O promissor jogador fez a estréia com a camisa são-paulina numa vitória de 3 X 1 sobre o Corinthians, no Pacaembu, pelo Campeonato Paulista de Aspirantes, tendo marcado o primeiro gol do jogo.

Em 1960, o time profissional do São Paulo foi disputar uma série de jogos no México. Ele e “Peixinho”, autor do primeiro gol da história do então ainda inacabado Morumbi, se destacaram nos aspirantes e foram convocados, também.

Mesmo sendo um jogador de muito talento, que driblava fácil e cobrava faltas com perfeição, “Bazzaninho” não cresceu mais como jogador de futebol, porque teve o azar de jogar numa época em que proliferavam grandes craques na sua posição, como Didi e depois, Rivelino, Gerson e Ademir da Guia.

E “Bazzaninho” também defendeu o São Paulo, num tempo em que o clube estava mais interessado em concluir o seu estádio, do que formar equipes fortes. Os títulos naquela época foram raros. Mas ainda assim ele participou de algumas conquistas importantes como: Bi-campeão Fita Azul da Europa e dos torneios de Cali e de Firenze. E também do torneio de inauguração do estádio Jalisco, na Cidade de Guadalajara, no México.

No ano seguinte foi emprestado ao Batatais, onde ficou por duas temporadas, e em 1962 transferiu-se para o São Bento, de Sorocaba. Integrou o melhor São Bento de todos os tempos ao lado de Walter, Odorico, Salvador, Gibe, Nestor, Marinho, Picolé, Afonsinho, Cabralzinho, Paraná e outros. A equipe sorocabana foi campeã da Primeira Divisão (atual A-2) ao ganhar do América na decisão em uma série melhor de três partidas.

Retornou ao São Paulo em 1964/1965. Arrebentou numa excursão à Itália e o Milan queria comprá-lo, mas não houve acordo financeiro. Laudo Natel, presidente do tricolor na época, não aceitou a proposta de Cr$ 150 milhões para o clube e Cr$ 40 milhões para o jogador.

Os dirigentes são-paulinos lhe deram um carro Volkswagem e Cr$ 1 milhão por mês. Depois do negócio emperrado, “Bazzaninho” disse que o técnico José Poy passou a persegui-lo. O talentoso meia-esquerda ficou desiludido e entrou em depressão.

Pouco tempo depois, o Grêmio (RS) também se interessou por ele. Novamente não houve acordo financeiro entre os clubes. Em 1965, o São Bento, então, pagou Cr$ 20 milhões, mais o passe do ponta-esquerda Paraná para ficar em definitivo com “Bazzaninho”. Ficou na equipe de Sorocaba até 1970. No ano seguinte jogou três meses na Ponte Preta, de Campinas e outros três no Paulista, de Jundiaí. Depois foi para o América e subiu para o Paulistão.

Em 1972 defendeu o XV de Piracicaba por quatro meses, não tendo visto um tostão do pagamento. No começo de 1973 transferiu-se para o Vila Nova (GO). Formado químico metalográfico, estudo básico do alumínio, passou a trabalhar na Companhia Brasileira de Alumínio, do Grupo Votorantim, na cidade paulista de Alumínio.

Já em final de carreira, atuou pela Associação Atlética Alumínio, que durante alguns anos disputou a Terceira Divisão de Profissionais do futebol paulista. Em 1974 a equipe local deixou de participar de campeonatos profissionais, e “Bazzaninho”, que morava em Alumínio voltou para Mirassol. Entrou em depressão, caiu no alcoolismo e acabou internado em uma clínica.

Com a ajuda de amigos, principalmente do empresário João Mahfuz, superou o vício e trabalha até hoje na sua rede de lojas, como gerente de vendas. Os pais de ambos também foram amigos. Em 1979 ainda jogou algumas partidas pelo Mirassol. O peso da idade - estava com 38 anos - falou mais alto e decidiu abandonar definitivamente o futebol.

“Bazzaninho”, que é casado com Renata e pai de Diego e Rodrigo, se tornou evangélico. Seus outros filhos são Júnior, Jeferson, Laurinha, Simone e Lelo, frutos do primeiro casamento. Mora em Sorocaba desde 2005, e apesar de aposentado trabalha ainda trabalha na loja de seu amigo.

Quem vai ao culto ou à Escola Bíblica Dominical no templo da 4ª Igreja Presbiteriana Independente de Sorocaba, terá a chance de conhecer o irmão Oliver Roberto Bazzani, um simpático senhor de 71 anos de idade. (Pesquisa: Nilo Dias)

Busto de Bazzani, no Estádio da Fonte Luminosa, em Araraquara.

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Um comentário providencial

*Obrigado Nilo por lembrar um grande profissional e amigo. Por volta de 1964, quando iniciei, Antonio Carlos junto com Luiz Carlos Martinez e Gilson Tilmmam, eram os narradores na Radio Pelotense. Depois o Martinez saiu e tive oportunidade de conviver contigo e o Antonio como narradores. TIlmmam tambem já faleceu e Benito Amato, tambem falecido era o chefe da equipe. Epoca boa, de carnavais e festas,e, grandes profissionais como o Antonio (Tonico carinhosamente chamado pelos amigos). Convivi muito com ele e tenho boas lembranças daquele tempo. Cumprimentos pelo blog e pela lembrança.

Um abraço

Renato Carvalho. 

Observação: Não costumo publicar comentários no blog. Ficam a disposição dos leitores. Mas em se tratando do amigo e radialista Renato Carvalho, não tem como não publicar. E agradeço pela manifestação bastante oportuna. Realmente, o Antônio Carlos merece a homenagem. Talvez em vida não tenha tido o reconhecimento devido. Mas a vida é assim mesmo. Eu não sabia do falecimento do Benito Amato, do Tilmann,sim. Agradecido, Renato.

terça-feira, 25 de setembro de 2012

A saga de um artilheiro

Emmanuele Del Vecchio, centroavante do Santos F.C. nos anos 50, nasceu em São Vicente (SP), no dia 24 de setembro de 1934. Começou a carreira no São Vicente A.C., de sua cidade natal. Em 1954 foi levado para o Santos pelo ex-goleiro santista “Cobrinha”. Junto de Del Vecchio também chegou o o ex-ponteiro esquerdo, Pepe, que ficou conhecido como o “Canhão da Vila”.

Del Vecchio foi um verdadeiro cigano do futebol. Jogou no Santos de 1954 a 1957 e em 1965, tendo atuado em 180 partidas e marcado 105 gols. Foi campeão paulista em 1955 e 1956 e também campeão do Torneio Internacional da Federação Paulista de Futebol (FPF). Foi artilheiro do “Paulistão” em 1955, com 23 gols.

Del Vecchio foi um atacante que tinha visão privilegiada do jogo. Era rápido, raçudo, técnico e goleador implacável. Tinha um físico perfeito para ser atleta: 1,75 de altura e 75 quilos. Eu tive a satisfação de ver Del Vecchio jogar. Foi quando de uma excursão do Santos ao Rio Grande do Sul, ao se exibir em Bagé, frente um combinado Ba-Guá, no dia 24 de março de1957. O jogo terminou 1 X 1.

Pelé entrou em campo aos dois minutos do primeiro tempo, substituindo ao astro da época, Del Vecchio, que já estava negociado com o futebol da Itália e que deixou o gramado contundido num choque com Athayde Tarouco. Pelé marcou o gol do Santos, tendo o combinado Ba-Gua empatado por Carlos Calvete.

A seleção bajeense, do treinador Alípio Rodrigues, formou com Léo Herzer - Saul Mujica - Carioca - Barradinhas e Bataclan - Athayde Tarouco e Sérgio Cabral - Carlos Calvete - Saulzinho - Max Ravaza e  Luiz Silva.

Pelo Santos, estiveram em campo Manga - Feijó - Hélvio - Ivan e Urubatão - Ramiro e Jair da Rosa Pinto - Dorval - Pagão (Zinho) - Del Vecchio (Pelé) e Tite. A arbitragem foi do paulista João Etzel Filho, que acompanhou a delegação santista na sua temporada por gramados do Rio Grande do Sul. A memorável promoção foi do Grêmio Atlético Bajeense e União Bajeense de Estudantes Secundaristas, com a renda alcançando a 174 mil cruzeiros, que serviu para cobrir as despesas e deixar um pequeno lucro para os organizadores.

Del Vecchio viu o menino Pelé chegar na Vila Belmiro e com ele jogou também na seleção paulista e quando retornou ao Santos, no final de 1965. A estréia de Pelé entre os profissionais santistas aconteceu em um amistoso contra o Corinthians, de Santo André. O time vencia por 5 X 0, quando Del Vecchio se machucou e Pelé foi chamado para substituí-lo. Em sua estréia, Pelé já marcou um gol.

Em 1957 Del Vecchio mudou-se para a Itália, para jogar no Verona, onde participou de 27 jogos e marcou 13 gols. Sua estréia foi no dia 13 de outubro de 1957, na partida válida pela Série A italiana, quando seu novo clube perdeu para o Roma por 3 X 1.

Depois jogou no Padova, foram 21 partidas e 8 gols. No ano seguinte mudou-se para Nápoles, onde permaneceu por três temporadas. No Napoli, jogou 68 vezes e anotou 27 gols. Em novembro de 1962, foi comprada do AC Milan, por quem disputou nove jogos e marcou três gols. Foi campeão italiano em 1962. De volta ao Padova participou de quatro jogos e não marcou.

Participando da Série A do Campeonato Italiano, Del Veccio jogou 125 partidas e fez 51 gols. Seu grande momento foi no jogo Verona 5 X 3 Sampdória, na temporada 1957/1958, em que marcou todos os cinco gols da sua equipe.

Da Itália para a Argentina, onde vestiu a camisa do Boca Juniors em seis oportunidades, marcando três gols. De 1964 a 1967 jogou no São Paulo, foram 69 jogos, 35 vitórias, 17 empates, 17 derrotas e 34 gols marcados, segundo o “Almanaque do São Paulo”, de Alexandre da Costa. Mesmo em tempo de "vacas magras" no São Paulo em sua primeira temporada marcou 25 gols em 41 jogos.

O único titulo conquistado no São Paulo foi em 1964, o Torneio de Firenze (Itália), disputado contra a Fiorentina, Firenze e Zenit (URSS), durante excursão por gramados europeus, em que Del Vecchio fez nove gols.

Ainda em 1967 defendeu o Bangu, do Rio de Janeiro, onde jogou oito vezes e fez dois gols. Entre 1968 e 1970 esteve no Atlético Paranaense, onde encerrou a carreira. Pela Seleção Nacional jogou nove vezes, entre 1956 e 1957 e marcou apenas um gol. Entre os jogos que participou, estão incluídos quatro pelo Campeonato Sul-Americano de 1956.

Del Vecchio jogou sua primeira partida pela Seleção em 24 de janeiro de 1956, contra o Chile. O único gol que marcou foi em 16 de junho de 1957, contra Portugal. Ele vestiu a camisa da Seleção pela última vez em 10 de julho de 1957, contra a Argentina. Pela Seleção foi campeão da Copa Roca, em 1955.

Como já acontecera antes no Santos, a três meses de completar 17 anos, Pelé foi chamado pelo técnico Silvio Pirillo para substituir Del Vecchio, no Maracanã, diante de 80 mil pessoas, pela Copa Roca. Os argentinos venceram por 2 X 1, mas Pelé deixou sua marca na rede do goleiro Carrizo.

Na estréia de Pelé, com a camisa 13, a Seleção, usando camisas amarelas, calções azuis e meias brancas, formou com: Castilho- Paulinho de Almeida – Bellini - Jadir e Oreco - Zito (Urubatão) e Luisinho – Maurinho - Mazzola (Moacir) - Del Vecchio (Pelé) e Tite. O árbitro foi o austríaco Erwin Hieger e, no lance do gol brasileiro, o flamenguista Moacir lançou, Pelé recebeu a bola bem próximo ao goleiro Carrizo e, com o pé direito, chutou a pelota à esquerda do grande arqueiro portenho.

Depois que deixou os gramados tornou-se técnico, tendo dirigido as equipes do Santos (1984) e Internacional de Limeira (1986).

O ex-craque santista faleceu aos 61 anos, em Santos, no dia 7 de outubro de 1995, dias depois de ter sido baleado em uma briga com Marcos Barbosa Silvestre, ex-namorado de sua filha, depois de uma discussão. Del Vecchio levou quatro tiros, mas ainda resistiu por oito dias, mas veio a falecer no Hospital Beneficência Portuguesa. Sua filha Maria Emmanuela Moreno Del Vecchio, é casada com Paulo Antonio Cruz.

O assassino de DelVecchio foi condenado por quatro votos a três, pelo Tribunal do Júri de Santos, a um ano e seis meses de detenção, por homicídio culposo (sem intenção de matar). Na condição de réu primário e com bons antecedentes, Silvestre cumpriu a pena em liberdade. (Pesquisa: Nilo Dias)

Del Vecchio na Seleção Brasileira. (Foto: Divulgação)

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Em memória de um radialista

Recebi ontem à noite uma notícia muito triste, dando conta do falecimento ocorrido dia 7 de agosto, do radialista Antônio Carlos Alves, narrador de futebol dos anos 60, nas emissoras de rádio de Pelotas. Estava com 75 anos. Foi mais uma vítima do maldito cigarro. Nunca deixou o vício que o acompanhava desde a infância. Fumou até a hora de morrer.

Era dono de uma das mais bonitas vozes da história do rádio pelotense. Eu e o Antônio Carlos formamos uma dupla de narradores na Rádio Tupancy, que certamente ficou na história. Dois estilos diferentes, mas duas narrações vibrantes. Perdi as contas dos jogos que transmitimos, dentro e fora de Pelotas.

Também estivemos juntos em memoráveis transmissões de Carnavais de rua, numa época considerada romântica, em que se colocavam barracas que vendiam lanches e bebidas, ao longo da Praça Coronel Pedro Osório e o desfile das entidades se perdia XV de Novembro afora. E quantas intermináveis noitadas regadas a geladissimas  cervejas. Antônio Carlos também trabalhou na Rádio Cultura, onde começou a carreira e ainda na Rádio Pelotense.

Depois que fui embora de Pelotas, nunca mais tive notícias dele, até que o milagre da Internet proporcionou um reencontro, embora de maneira virtual. A partir daí trocamos mensagens e fiquei sabendo de alguns detalhes da sua vida. Devido a um estado depressivo não tratado (ele não aceitava ajuda), ficou paraplégico há cerca de 20 anos e em constante tratamento com especialista.

Durante esse tempo, Antônio Carlos teve um anjo ao seu lado, cuidando dele com enorme carinho, em todos os momentos, a esposa Cleris de Alves, de quem estava junto há 39 anos. Foi ela quem me contou como foram os derradeiros momentos de vida do agora saudoso amigo.

Deixou a esposa Cleris, os filhos Jorge, que trabalha na Rádio Universidade e Glaucius, que reside em Foz do Iguaçu (PR), ambos do primeiro casamento, quatro netos - Dario Fontana, Juninho Alves, Léo Alves,Ariane e o fiel cãozinho Pinduca. Antônio Carlos, além da família, teve dois grandes amores na vida, o rádio que nunca esqueceu e o E.C. Pelotas, seu time de coração. Faço esse comentário para lembrar um dos grandes radialistas de Pelotas em todas as épocas, que morreu praticamente no esquecimento.

Da geração dele, poucos ainda se encontram entre nós. Os mais novos possivelmente nunca ouviram falar dele e nem de tantos outros nomes da imprensa pelotense, não só esportiva. Lamentavelmente não temos o cuidado de preservar a história.

Certamente, lá no outro lado, Antônio Carlos Alves já se encontrou com nomes famosos da radiofonia pelotense que se foram há mais tempo, como Deogar Soares, Paulo Ribeiro, Phidias Gallo, Romeu Machado dos Santos, Armando Leite Goulart, Paulo Corrêa, Izabelino Tavares (meu irmão), Petrucci Filho, Eliseu de Mello Alves, Honório Sinott, Marcos Resende, Dinei Avelar e tantos outros, que a memória já prejudicada pelos 71 anos de vida, não permite lembrar. (Texto: Nilo Dias)

Antônio Carlos Alves, nos seus bons tempos de rádio.

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Um goleiro chamado Muca

Levy Baldassari, o “Muca” foi o goleiro da Portuguesa de Desportos, de São Paulo, nos seus dias de maior glória, ao começo dos anos 50. Um time que tinha entre outros, Nena, Djalma Santos, Noronha e ele próprio. Natural da cidade paranaense de Jacarezinho, “Muca” nasceu no dia 6 de fevereiro de 1927. Desde pequeno gostava de futebol e jogava como poucos na posição de goleiro.

Começou a carreira na Esportiva, de Jacarezinho, clube que não mais existe, e que defendeu desde quando era amador, até se tornar profissional. Com ela participou da Divisão Especial do Campeonato Paranaense, conquistando por duas vezes o vice-campeonato estadual (1951 e 1954). Não foi mais que uma questão de tempo, para que chamasse a atenção dos fortes clubes do interior do Paraná, por seus reflexos, sua coragem e elasticidade.

Foi num tempo em que a população de Jacarezinho vivia empolgada com o futebol. A cada partida da Esportiva, em Curitiba, caravanas imensas se deslocavam para a capital, de trem ou de ônibus. As partidas da Esportiva eram transmitidas pelo locutor Miguel Jorge Chueiri (Tufica), por telefone e reproduzidas pelo Serviço de Alto-Falante do Cine Éden.

No início dos anos 50, a Esportiva costumava trazer até Jacarezinho grandes equipes do Rio de Janeiro e São Paulo, para jogos amistosos que levavam grandes públicos ao estádio. Foi quando a Portuguesa de Desportos, então um dos grandes quadros de futebol de São Paulo, foi até lá para um amistoso.

Seus dirigentes ficaram empolgados com “Muca”, que realizou uma grande partida, sendo o melhor em campo. Acabaram adquirindo seu passe, dando em troca para a Esportiva, o goleiro Bolivar, que pesava nada mais, nada menos, do que míseros 110 quilos.

“Muca” foi para a “Lusa” paulista, mas permaneceu sempre na lembrança dos torcedores da sua cidade natal. Em pouco tempo conquistou a simpatia da torcida paulista, não só da Portuguesa, mas dos outros clubes, também, que o admiravam pela elegância, cavalheirismo e habilidade no gol. Nos arquivos de jornais e revistas especializadas de São Paulo, ainda é possível encontrar artigos que falam do goleiro, que se consagrou como um dos melhores que o futebol brasileiro já conheceu.

Defendendo a meta da Portuguesa de Desportos, “Muca” foi campeão do Torneio Rio-São Paulo em 1952, e ainda conquistou a ”Fita Azul” em 1951 e 1953 e o “Troféu San Isidro”, de 1951 e o Campeonato Brasileiro, pela Seleção Paulista, em 1952. Ele foi o goleiro titular da Portuguesa, no lendário jogo em que a “Lusa” enfiou 7 no Corinthians.

Naquele tempo disputava-se um campeonato brasileiro por seleções, não havia uma competição de clubes, como existe hoje. Graças as suas estupendas atuações defendendo a meta da “Lusa”, “Muca” foi convocado diversas vezes para integrar a Seleção Paulista. Era cotado para ser o titular da Seleção Brasileira. Mas ele preferiu voltar para Jacarezinho, para casar com sua namorada de infância, Ilca, filha do então prefeito Benedito Moreira.

“Muca” defendeu a Portuguesa até 1953. Sua última partida foi a vitória de 4 X 3 sobre o Linense, válida pelo Campeonato Paulista, em 20 de dezembro. A Portuguesa jogou com: Muca - Nena e Válter - Djalma Santos - Brandãozinho e Ceci - Julinho Botelho – Renato – Amorim - Átis e Ortega.

No dia 23 de setembro de 1958, durante uma festa de casamento, ao apartar uma briga entre dois empregados da Fazenda Ingá, de propriedade de seu sogro, que ele administrava, “Muca” foi ferido próximo a virilha por um golpe de canivete e veio a falecer, vítima da violência que ele procurou conter. Ele chegou a ser socorrido, mas não resistiu e veio a morrer. Deixou um casal de filhos, sendo que seu filho morreu tempos depois em um acidente de trânsito.

Mas seu nome ficou eternizado em Jacarezinho e no futebol brasileiro. A cidade prestou-lhe uma homenagem, dando o nome de “Levy Baldassari” a uma de suas ruas.

No estádio Municipal Pedro Vilela, de Jacarezinho, existe uma placa de bronze na entrada, em homenagem a “Muca”. Ela foi descerrada pelo ex-atleta da Seleção Brasileira e bi-campeão do mundo, Djalma Santos, em uma partida entre Veteranos da Associação Esportiva Jacarezinho (AEJ) X Veteranos de Curitiba. O resultado foi 2 X 2.

Na placa está escrita uma frase do professor Rodrigo Otávio, que diz: "Muca” aquele que viveu a vida que eu gostaria de ter vivido”. A placa existe até hoje, embora danificada, por falta de manutenção. (Pesquisa: Nilo Dias)

A foto é do início dos anos 50 e foi revelada invertida, daí porque o distintivo da Esportiva aparece ao contrário.

domingo, 16 de setembro de 2012

O goleiro que jogava de graça

Quem foi Roberto Gomes Pedrosa, que emprestou seu nome ao Torneio que antecedeu o Campeonato Brasileiro de Futebol? E o que ele fez para merecer tal honraria? Pedrosa, como era chamado, nasceu no Rio de janeiro em 8 de junho de 1913. Foi um goleiro que começou a carreira no Botafogo, do Rio de Janeiro e graças a suas boas atuações foi convocado para defender a seleção Brasileira, na Copa do Mundo de 1934.

Essa foi a primeira vez que a Copa se realizou na Itália. O Brasil foi prejudicado pelas brigas entre os dirigentes das entidades futebolísticas amadora e profissional. Aconteceram coisas quase inacreditáveis, como a tentativa de esconder alguns jogadores do Palestra Itália.

Romeu, Lara, Gabardo, Junqueira e Tunga chegaram a ser escondidos numa fazenda em Matão (SP), para não serem convocados pela antiga Confederação Brasileira deDesportos (CBD). A fazenda foi cercada de guardas armados. Como o lugar era tenebroso, assustando até os próprios jogadores, um diretor do Palestra Itália os transferiu para sua casa de praia.

Pedrosa defendeu a Seleção Brasileira em 19 oportunidades, segundo o livro “Seleção Brasileira – 90 anos”, de autoria de Antônio Carlos Napoleão e Roberto Assaf.

Pelo Botafogo foi tricampeão Carioca, em 1934. Do alvinegro carioca foi para o Clube Atlético Estudante Paulista, de São Paulo. Em 12 de setembro de 1938 assinou contrato com o São Paulo F.C., curiosamente na mesma data da fusão do tricolor com o seu ex-clube.

O que pouca gente sabe é que nessa incorporação, por pouco o São Paulo não mudou de nome. o Clube Atlético Estudantes de São Paulo, foi fundado por dissidentes do São Paulo F.C., em maio de 1935. Foram seus fundadores os são-paulinos Cássio Villaça e José de Godói. Veio a se estabilizar como uma entidade forte quando se uniu, em 2 de junho de 1937, com o C.A. Paulista, passando a se chamar Clube Atlético Estudantes Paulista e a jogar no Estádio Antônio Alonso, campo da Companhia Antárctica Paulista, na Rua da Móoca.

Bem estruturado e com elenco respeitável, fora de campo sofreu um grande baque após uma excursão ao Chile e ao Peru, entre junho e julho de 1938, quando um empresário fugiu com todos os rendimentos obtidos na viagem, deixando o clube em situação financeira grave.

Pelo vínculo histórico entre os dois clubes, o São Paulo ajudou a pagar o salário de alguns jogadores do Estudantes e até criou um festival amistoso, cuja meta era aliviar um pouco a situação dos atletas do clube irmão, que, aos poucos, foram contratados pelo próprio São Paulo.

Assim, em 25 de agosto de 1938, com oito novos jogadores provindos do Estudantes Paulista, o São Paulo F.C. goleou o Corinthians por 3 X 0, dando início a uma nova era vitoriosa. Com nomes como Armandinho e Araken Patusca, regressos, o São Paulo nessa temporada ainda aplicaria a maior goleada da história em cima do Palestra Itália, hoje Palmeiras: 6 X 0.

Já o cenário no Estudantes era problemático. Em 30 de agosto daquele ano, a diretoria do clube sofreu um ultimato do restante do elenco, impondo prazo de que até às 22h30min daquele dia lhes pagassem os ordenados devidos, ou então pediriam o passe e deixariam o time.

Sob pressão, recorreram ao São Paulo F.C. e à Liga de Futebol do Estado, representada nessa ocasião pelo presidente do Corinthians, Manoel Corrochel. A solução encontrada por todos foi solicitar um empréstimo de 5 contos de réis, junto à Liga, com o compromisso de saldá-lo após o jogo São Paulo e Corinthians, em 4 de setembro. Desde então, os passes e contratos de todos os jogadores do Estudantes passaram a pertencer ao São Paulo.

Ficou acertado a partir dali o fim do C.A. Estudantes Paulista, mas sua incorporação pelo São Paulo Futebol Clube se deu somente em 12 de setembro, em Assembléia Geral do Tricolor, ao custo de 700$000 réis mais o passivo do absorvido, no valor de 168.880$000 e os compromissos firmados com a Companhia Antárctica Paulista para o uso de seu estádio.

O detalhe, porém, é que por muito pouco o São Paulo F.C. não teve seu nome original alterado. Nessa mesma Assembléia Geral de 12 de setembro de 1938, a possibilidade de mudança de nomenclatura da agremiação, sem que outro nome tivesse sido sugerido, de fato, esteve em votação por causa da união com o Estudantes e permaneceu empatada até o “Voto de Minerva”, de Piragibe Nogueira, a favor da manutenção de São Paulo Futebol Clube.

Em 23 de abril de 1939, num clássico entre Corinthians X São Paulo (1 X 1), válido pelo campeonato paulista de 1938, a decisão foi, pela primeira vez, disputada em dois dias. Na última rodada, Corinthians e São Paulo se enfrentaram no Parque São Jorge. O Corinthians precisava apenas do empate para garantir o bi. O São Paulo, do goleiro Pedrosa, tinha que vencer para forçar um jogo-desempate.

O São Paulo abriu o placar no segundo minuto, por meio de Mendes, mas a chuva levou à interrupção do jogo aos 21 minutos. O tempo restante foi disputado dois dias depois. Em 25 de abril, o Corinthians empatou a partida com um dos gols mais polêmicos da história do futebol paulista. Lopes cruzou da direita e o goleiro Pedrosa rebateu. Da entrada da área, Servílio chutou torto, mas Carlito desviou a bola para o gol. Com a cabeça... ou com a mão? Muitos cronistas da época afirmaram que foi com a mão

Roberto Gomes Pedrosa defendeu o tricolor paulista até 1940, quando foi eleito conselheiro do clube. Segundo o “Almanaque do São Paulo”, de Alexandre da Costa, disputou 32 jogos pelo clube entre 1938 e 1940, com 16 vitórias, seis empates e 10 derrotas.

Em 1941, foi nomeado diretor do Departamento de Futebol e um ano depois recebeu o título de Sócio Benemérito. Em 1943, foi indicado diretor do Departamento Técnico da Federação Paulista de Futebol (FPF). Em 1944 ocupou o cargo de secretário geral da FPF, e em 1945, eleito membro do Conselho Regional de Desportos.

Foi escolhido em 1946 para ocupar a presidência do São Paulo F.C., e sua profícua atuação deixou marcas indeléveis na vida do clube. Em 1947, foi eleito presidente da Federação Paulista de Futebol, cargo que exerceu até 1954, ano de seu falecimento.

Quando atleta, Pedrosa jamais aceitou receber dinheiro para jogar. Seus contratos costumavam ser assinados em branco. Certamente esse foi um dos motivos que o levaram a ser homenageado das mais diversas formas. A praça localizada frente o estádio do Morumbi tem o seu nome.

Em 1967 foi criado o Torneio Roberto Gomes Pedrosa, embrião do atual Campeonato Brasileiro, em substituição ao Torneio Rio-São Paulo, que era disputado desde 1955. A nova competição deixou de ser disputada apenas entre clubes do Rio de Janeiro e de São Paulo, e passou a contar com equipes dos Estados de Minas Gerais, Paraná e Rio Grande do Sul.

Em 1968 clubes de Pernambuco e da Bahia completaram a lista de participantes. O torneio ficou conhecido como "Robertão", e a partir desse ano foi disputado também com o nome de "Taça de Prata".

Roberto Gomes Pedrosa faleceu no Rio de Janeiro, em 6 de janeiro de 1954, com apenas 41 anos de idade.

Seleção Brasileira que disputou a Copa doMundo de 1934, na Itália. O goleiro Pedrosa é o primeiro (de chapéu), a contar da esquerda para a direita.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

O torcedor maldito (Final)

Samuel Wainer, dono do jornal “Última Hora” tinha algo em comum com Nelson: a tuberculose. Propôs a Nelson que escrevesse, com pagamento extra, uma coluna diária sobre um fato real. Poderia se chamar "Atire a primeira pedra". Nelson sugeriu "A vida como ela é..." e, sugestão aceita, foi para a máquina escrever a primeira coluna. O sucesso foi estrondoso. Em 1951 relançou “Suzana Flag”, em "O homem proibido".

Carlos Lacerda queria derrubar o presidente Getúlio e, para tanto, batia firme em Samuel Wainer e no jornal “Última Hora”. Nelson não escapou da pancadaria e era chamado de "tarado" por ele. Outro que também o atacava era o católico Gustavo Corção, da “Tribuna da Imprensa”.

Em março de 1955 a família Rodrigues ganhou uma ação contra o governo de indenização pela destruição do jornal "Crítica". Em 1956 receberam o equivalente a US$1.800.000,00. A parte que coube a Nelson foi utilizada na compra de um apartamento em Teresópolis, em nome dos filhos e de um carro para Elza. O que sobrou, investiu no teatro.

Apresentado por sua irmã Helena, Nelson conheceu Lúcia Cruz Lima, que logo passou a ser sua namorada. Só que desta vez a coisa era séria. Casada e bem casada, mãe de três filhos, ela logo se apaixonou, deixou o marido e voltou a viver com os pais. Ele demorou dois anos para se separar de Elza.

Nos primeiros meses de 1963 nada impedia a separação de Nelson. Já havia alugado um pequeno apartamento e Lúcia estava grávida. Após um almoço de despedida, após o qual Elza tentou suicidar-se, ele partiu de malas e bagagens para o apartamento de sua mãe. Ia ficar lá uns tempos até acertar tudo.

Lúcia deu um trato na aparência do escritor, já que ele participava desde 1960 do programa esportivo "Grande Resenha Facit" na TV Rio, por obra e graça de Walter Clark, e era, portanto, um artista. Ela teve uma gravidez nada normal e um parto difícil. Daniela, a filha, nasceu com 1,5 quilo, e não conseguia respirar. Perdeu minutos de oxigenação no cérebro até que seus pulmões funcionassem.

Daniela passou o primeiro ano de vida numa tenda de oxigênio, tinha má circulação nas pernas, chorava sem parar em virtude das dores que sentia. Devido à paralisia cerebral nunca conseguiu andar ou articular um movimento e era irreversivelmente cega.

Nelson escreveu sobre futebol em diversas publicações, como “O Globo” e “Manchete Esportiva”, onde tinha o costume de destacar o personagem da semana, não necessariamente o que melhor jogou, mas o que tinha a história mais interessante.

Ele era um cara diferente da época, não tinha compromisso com o politicamente correto que hoje preocupa muita gente. Ele falava o que pensava e com frases que viraram verdadeiras pérolas.

Nelson Rodrigues nunca aproveitou suas credenciais de jornalista e escritor famoso para ter contato com os jogadores do clube ou acompanhar treinamentos, mas recebeu de um setorista, jornalista que trabalha cobrindo o dia a dia dos clubes, as informações sobre uma das primeiras atividades do craque Mário Sérgio e perguntou em sua coluna: "Será que está nascendo um craque?".

Ele era um cronista tão perfeito que nem precisava ver o jogo. O resultado da partida, as escaramuças dos jogadores, os esquemas táticos, tudo isso não passava de detalhes secundários aos seus olhos. Pouco lhe interessava a distribuição de beques ou atacantes no gramado. Dizia que o relato dessas banalidades cabia aos “idiotas da objetividade”. A missão que Nélson Rodrigues outorgou a si mesmo era outra: traduzir em palavras a dimensão épica da maior paixão brasileira – o futebol. E costumava dizer, que no futebol, o pior cego é o que só vê a bola.

Nelson teve sério problema de vesícula e, após a operação de alto risco ficou três meses sem publicar sua coluna no jornal de Wainer. Sua coluna em "A Manchete Esportiva" também deixou de ser publicada de novembro de 1958 a março de 1959.

Os anos 70 marcaram o início dos anos duros da ditadura militar no Brasil. Nelson, conhecido e admirado pelos militares, lutou para tirar da prisão os amigos Hélio Pellegrino e Zuenir Ventura. Com mais de 57 anos, ele se sentia desgastado, sem espaço — seu apartamento vivia lotado de enfermeiras por causa de sua filha, enfim, era chegada a hora de se separar de Lúcia, o que ocorreu sem traumas.

Logo em seguida foi morar com Helena Maria, que era 35 anos mais nova que ele, e que trabalhava no jornal. Em 1972 começou nova luta: seu filho, Nelsinho era um dos terroristas mais procurados pelas forças armadas. "Prancha", seu codinome, foi preso em 30 de março de 1972. Dois anos antes, quando seu filho já vivia na clandestinidade, Nelson conseguiu com o presidente da República, general Médici, que ele saísse do país. Nelsinho não aceitou o privilégio.

O drama de Nelsinho se desenrolou longe dos olhos de Nelson. Apesar disso, face ao seu prestígio e contatos com os militares, era muito procurado para ajudar pessoas em apuros com o regime militar. De 1969 a 1973 ele teve participação ativa na localização, libertação ou fuga de diversos suspeitos de crimes políticos. Após a prisão de Nelsinho, começou a luta para localizá-lo e procurar mantê-lo vivo, pois a tortura corria solta.

Nelson escreveu "Anti-Nelson Rodrigues", no final de 1973. Em 1974, a peça fazia bela carreira no teatro do Serviço Nacional do Teatro. O autor faz alguns exames e foi levado de imediato para São Paulo para ser operado de um aneurisma da aorta. Passou por duas operações, quase morreu, retornou ao Rio e, apesar de terminantemente proibido pelo médico, voltou a fumar. Em abril de 1977 foi internado com uma arritmia ventricular grave e nova insuficiência respiratória. Elza voltou para casa e passaram a viver juntos outra vez.

Na verdade, já se encontravam há tempos quase todas as noites no restaurante "O bigode do meu tio", em Vila Isabel, de propriedade de Joffre.

O autor escreveu sua grande e última peça — "A Serpente" — em meados de 1979, pouco antes de seu filho Nelsinho iniciar greve de fome com 13 companheiros, os últimos presos políticos cariocas, com a finalidade de transformar a anistia ampla em anistia total e irrestrita. Finalmente, no dia 23 de agosto, dia do aniversário de seu pai, Nelsinho foi autorizado a deixar a prisão e assistir ao nascimento da filha Cristiana. No dia 16 de outubro Nelsinho recebeu a liberdade condicional, mas não pode ver seu pai: ele estava inconsciente no hospital Pró-Cardíaco.

Nelson Rodrigues faleceu na manhã do domingo 21 de dezembro de 1980, aos 68 anos de idade, deixando seis filhos: Jofre, Nelson, Maria Lucia, Paulo César, Sonia e Daniela. No fim da tarde daquele dia ele faria 13 pontos na Loteria Esportiva, num "bolo" com seu irmão Augusto e alguns amigos de "O Globo". Dois meses depois, Elza cumpriu o seu pedido — de, ainda em vida, gravar o seu nome ao lado do dele na lápide, sob a inscrição: "Unidos para além da vida e da morte. É só". Nelson foi enterrado no Cemitério São João Batista, em Botafogo.

Nelson Rodrigues morreu 21 dias depois de o zagueiro Edinho marcar o gol do título carioca do Fluminense contra o Vasco, no Maracanã. Com a saúde muito debilitada, não poderia ter grandes emoções e estava proibido de assistir aos jogos do clube do seu coração.

O seu filho Nelsinho contou que Nelson acompanhou a partida pelo rádio. E ele teve todo o cuidado do mundo para contar ao pai que o Fluminense era campeão estadual pela 24ª vez na história. Nelson comemorou sentando novamente em sua máquina de escrever, e tentando digitar a última coluna da vida. Eventualmente desistiu e a ditou para o filho.

No texto que teve o título "Fluminense campeão demais", publicado no jornal “O Globo”, o escritor disse que o elenco do seu time era "fabuloso do goleiro ao ponta-esquerda" e apenas os "lorpas e pascácios não viam que o futebol brasileiro estava encarnado nos craques tricolores”. Acreditou até o fim que o Fluminense era o melhor time do mundo, apesar de os fatos provarem o contrário.

Nelson ainda fez história na televisão brasileira. Participou de mesas-redondas com comentaristas como Luis Mendes e João Saldanha. Foi pioneiro na teledramaturgia brasileira, ao escrever para a TV Rio a novela "A Morta Sem Espelho". Acompanhou a adaptação de sua obra para o cinema e chegou a colaborar com o roteiro de "A Dama do Lotação", de Neville D’Almeida, "Bonitinha, mas ordinária" e "Álbum de Família", de Braz Chediak. Escreveu, também, os diálogos para dois filmes: "Somos Dois", de Milton Rodrigues, e "Como ganhar na loteria sem perder a esportiva", de J. B. Tanko. (Pesquisa: Nilo Dias)

terça-feira, 4 de setembro de 2012

O torcedor maldito (II)

Mas, em maio de 1931 Euricles também faleceu e Roberto Marinho então convidou Mário Filho para assumir a página de esportes de “O Globo”. Mário aceitou desde que pudesse levar seus irmãos Nelson e Joffre. Roberto Marinho concordou, mas com a condição de só pagar salário a Mário Filho.

Nelson trabalhou alguns meses no jornal “O Tempo”. Joffre foi para “A Nota”, onde estava o outro irmão, Milton. Com a ajuda de Mário Martins e o beneplácito de Roberto Marinho, Mário Filho lançou o seu jornal, “Mundo Esportivo”, justamente no fim do campeonato de futebol. Sem ter assunto, inventaram algo que seria uma mina de dinheiro anos depois: o concurso das escolas de samba.

Em 1932, Nelson Rodrigues teve sua carteira assinada em “O Globo”, um ano após começar a trabalhar naquele diário, com um ordenado de 500 mil réis por mês. Entregava todo o dinheiro para sua mãe e recebia uns trocados de volta para comprar seus cigarros (média de quatro carteiras por dia).

Para arranjar mais algum dinheiro, trabalhou como redator da firma “Ponce & Kamp; Irmão”, distribuidora no Rio dos filmes da “RKO Radio Pictures”. Criava textos para os anúncios dos filmes nos jornais.

Como cronista esportivo, Nelson escreveu textos antológicos sobre o Fluminense Football Club, para quem torcia fervorosamente. A maioria dos textos foram publicados no “Jornal dos Sports“. Junto com seu irmão, o jornalista Mário Filho, Nelson foi fundamental para que o clássico Fla-Flu conquistasse o prestígio que tem hoje, de ser um dos grandes clássicos do futebol brasileiro.

Nelson Rodrigues criou e evocou personagens fictícios como “Gravatinha” e “Sobrenatural de Almeida”, para elaborar textos a respeito dos acontecimentos esportivos relacionados ao clube do coração.

Nesse meio tempo estava apaixonado por Loreta Carbonell uma argentina de olhos azuis, bailarina do Municipal e por Eros Volúsia, filha da poetisa Gilka Machado, também bailarina, uma linda e jovem morena. Dividia com seu irmão Joffre a paixão por ela. Depois vieram Clélia, uma estudante de Copacabana e Alice, professora de Ipanema.

A tosse seca e uma febre baixa, porém persistente, ao por do sol, foram os avisos dados a Nelson, além de sua magreza. Sua irmã Stella, já médica, arranjou uma consulta. Foi diagnosticada a tuberculose pulmonar, o grande fantasma do ano de 1934. Por falta de um diagnóstico precoce, o autor já havia, com apenas 21 anos, arrancado todos os dentes e posto dentadura, numa tentativa de debelar a febre que insistia em não ir embora.

Foi, então, para Campos do Jordão (SP), local recomendado para tratamento, sozinho e sem saber se voltaria. Foi a primeira de uma série de seis internações. Roberto Marinho, sabendo das dificuldades da família, continuou pagando seu ordenado normalmente. Nelson passou 14 meses no “Sanatórinho”, de abril de 1934 a junho de 1935.

Nelson pediu ao secretário do jornal “O Globo” que o transferisse da página de esportes para a de cultura. Queria escrever sobre ópera. Com a ajuda de Roberto Marinho conseguiu a transferência e começou arrasando com "Esmeralda", ópera brasileira do compositor Carlos de Mesquita. Foi sua única incursão nessa área.

Em abril de 1936, a terrível doença atacou seu irmão Joffre, com 21 anos, que foi levado para o Sanatório, em Correias (RJ). Nelson ficou ao seu lado durante sete meses. No dia 16 de dezembro de 1936, ele faleceu.

Em 1937 a redação do jornal só tinha homens. Após muita conversa Roberto Marinho concordou em contratar Elza Bretanha, apadrinhada do diretor administrativo, como secretária de Henrique Tavares, gerente de “O Globo Juvenil”. Voltando de sua segunda estada em Campos de Jordão, Nelson foi informado da presença de Elza, 19 anos, moradora do Estácio e dura na queda. Mas ele sentenciou, essa está no papo. Errou.

Nelson se aproximou de Elza, expôs sua situação de penúria de saúde e financeira, e falou em casamento. Consultada sua família, não encontrou objeção. Afinal, já tinha 25 anos. A mãe de Elza, dona Concetta, siciliana das boas, quase teve um ataque, tendo a honra de ter sido acompanhada nisso por Roberto Marinho. Ele disse a Elza: "Está sabendo que vai se casar com um rapaz muito inteligente e de grande talento, mas pobre, absolutamente preguiçoso e doente? Sua mãe está coberta de razão!"

Mesmo assim marcaram para se casar no dia do aniversário de Elza, 8 de maio de 1939. Se fosse preciso, fugiriam. Porém, em 13 de maio, mandou para a noiva um recado que dizia: "Amor, estou com a alma cheia de pressentimentos tristes". Era a tuberculose que o atacava novamente.

Nos quatro meses em que ficou internado, Nelson mostrou seu lado ciumento. Vivia atormentado com isso e, na volta, acabou desfazendo o noivado. Mas o coração falou mais forte do que o infundado ciúme e marcaram novamente o casamento, contrariando a mãe da noiva e o patrão de ambos.

No dia 29 de abril de 1940, sem externar qualquer anormalidade, Elza saiu para trabalhar, foi para a casa de uma amiga onde trocou de roupa e casou-se no civil, diante do juiz.

Os irmãos de Elza ficaram sabendo e falaram até em matá-lo. Nelson, com a alma leve, alugou uma casinha no Engenho Novo. Era sua volta ao subúrbio. Compraram móveis de segunda mão e Mário, o irmão, lhe deu de presente a cama de casal e a penteadeira.

Finalmente dona Concetta deu o "de acordo" e o casamento religioso se realizou, em 17 de maio, após Nelson, com quase 28 anos, ter sido batizado, ter feito a primeira comunhão e estudado o catecismo, como manda a Igreja Católica.

Após seis meses de casamento, certa manhã Nelson acordou e comunicou a Elza que estava cego. Não enxergava nada. Descobriu, indo ao médico, que se tratava de uma seqüela da tuberculose. Tomou muito antiinflamatório, melhorou, mas 30% de sua visão estava perdida para sempre, nos dois olhos. Apesar do estado de penúria em que se encontravam, Nelson pediu a Elza que deixasse o emprego quando se casassem.

Logo que pode comprou um telefone e ligava para ela de hora em hora. Saudades ou ciúme? Nelson procurava uma saída para seu aperto financeiro. Elza estava grávida e seu salário estava estagnado nos 500 mil réis mensais. Um dia, ao passar em frente ao Teatro Rival, viu uma enorme fila que se formava para assistir "A família Lerolero", de R. Magalhães Júnior. Alguém comentou: "Esta chanchada está rendendo os tubos!" Uma luz se acendeu na cabeça de Nelson. “Por que não escrever teatro?”

Em seguida nasceu Joffre, o seu primeiro filho. E Nelson, por ordens médicas, não podia ficar perto do filho. Para piorar as coisas, descobriu que também tinha uma úlcera do duodeno. O médico prescreveu rígido regime alimentar e mandou que não tomasse mais café e parasse de fumar, coisa que nunca fez.

Depois de muito trabalho conseguiu levar à cena a peça teatral “A mulher sem pecado”, com direção de Rodolfo Mayer, no Teatro Carlos Gomes, no Rio de Janeiro. Lá ficou por duas semanas e não teve repercussão nenhuma perante o público. Alguns críticos e amigos elogiaram, e isso bastou ao autor.

Em fevereiro de 1945 foi surpreendido por uma proposta inacreditável: Freddy Chateaubriand, lhe convidou para trabalhar na revista “O Cruzeiro”, com salário de cinco contos de réis, mais de sete vezes o que lhe pagava Roberto Marinho.

Nelson só não disse o “sim” na hora, porque pediu para falar antes com o doutor Roberto, a quem devia favores. Esse não se opôs, como ainda desejou-lhe boa sorte e deu-lhe dez mil cruzeiros. Nelson foi para seu novo emprego: diretor de redação das revistas “Detetive” e “O Guri”.

Em março de 1945 foi atacado, novamente, pela tuberculose. O ano anterior havia sido ótimo: além do lançamento em livro do “Vestido de noiva”, ele viu seu filho crescer com saúde e Elza esperava um novo filho. Resolveram ir todos para Campos de Jordão, inclusive a sogra, dona Concetta. Depois de uma semana viram que aquilo não fazia sentido e a família retornou. Em junho teve alta e, face à proximidade do parto de sua mulher, voltou correndo para o Rio. Nasceu, então, Nelsinho.

Uma mulher chamou a atenção de Nelsom nas coxias do Teatro Phoenix, quando da encenação de “Anjo negro”. Era Eleonor Bruno, conhecida como “Nonoca”, linda "mingnonne", tímida, recatada e soprano lírico, que estava ali para tomar conta de sua filha de apenas 13 anos, Nicete, que estreava como atriz. Embora nunca tivesse reclamado, seu casamento não ia bem, por isso Nelson teve um caso com “Nonoca”, sob às bênçãos da família dela.

Alugou um pequeno apartamento em Copacabana, em sociedade com o amigo Pompeu de Souza, para servir-lhes de "garçonnière", até que num dia de 1950 sua esposa Elza bateu na porta, fez um escândalo e ele voltou com o rabo entre as pernas para casa. Seu romance com “Nonoca” terminou ali.

Em 1949 Freddy Chateaubriand foi comandar o jornal "Diário da Noite" e levou Nelson consigo. Para trás ficou a personagem “Suzana Flag”, que havia rendido muito sucesso e dinheiro. O autor não agüentava mais. Em seu lugar surgiu “Myrna”, a nova máscara feminina do biografado. A diferença era que “Myrna” respondia a cartas de leitoras.

Em 1950 Nelson deu adeus a Freddy Chateaubriand e aos "Diários Associados" e ficou esperando convites de outros jornais. Ficou um ano esperando. Nesse período, salvaram a família as economias de Elza e um "bico" no “Jornal dos Sports”, de seu irmão Mário Filho. No ano seguinte saiu do buraco e foi para o jornal “Última Hora”, com salário inicial de 10 mil cruzeiros, considerado não tão ruim, tendo em vista seu baixíssimo prestígio naquela época. (Pesquisa: Nilo Dias)

Nelson Rodrigues foi chamado de "anjo pornográfico".

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

O torcedor maldito (I)

Nelson Rodrigues nasceu da cidade do Recife (PE), em 23 de agosto de 1912. Foi o quinto filho dos 14 que o casal Maria Esther Falcão e o jornalista Mário Rodrigues colocaram no mundo. Além dele, os irmãos Milton, Roberto, Mário Filho, Stella e Joffre, também nasceram na capital pernambucana. Já Maria Clara, Augustinho, Irene, Paulo, Helena, Dorinha, Elsinha e Dulcinha nasceram no Rio de Janeiro.

Durante três capítulos contarei a história daquele que foi chamado de “maldito”, por questionar os valores morais de uma sociedade que vivia da aparência. Nelson foi o autor de textos como “Bonitinha, mas ordinária”, “Vestido de Noiva” e “Os sete gatinhos”. Nos jornais, escreveu as crônicas de “A vida como ela é”.

No esporte, entretanto, foi o primeiro autor a enxergar o verdadeiro papel que o futebol desempenha para a definição da idéia de “ser brasileiro”. Nelson escreveu frases antológicas dentro e fora do esporte. Eis algumas:

“O Fla X Flu nasceu 40 minutos antes do nada.“, “Em futebol, o pior cego é o que só vê a bola”; “Se o Fluminense jogasse no céu, morreria para vê-lo jogar”; “O Flamengo tem mais torcida, o Fluminense tem mais gente”; “O Fluminense é o único time tricolor do mundo. O resto são só times de três cores”; “Sou tricolor, sempre fui tricolor. Eu diria que já era Fluminense em vidas passadas, muito antes da presente encarnação”; “Pode-se identificar um tricolor entre milhares, entre milhões. Ele se distingue dos demais por uma irradiação específica e deslumbradora”; "Grande são os outros, o Fluminense é enorme”. E por aí vai.

Mario Rodrigues, pai de Nelson era deputado e jornalista do “Jornal do Recife”. Em razão de problemas políticos teve que se mudar para o Rio de Janeiro, onde conseguiu trabalho como redator parlamentar do jornal “Correio da Manhã”. Isso em 1916. Depois sua esposa dona Maria Esther e os filhos chegaram ao Rio de Janeiro a bordo de um vapor do Lloyd.

Para cobrir as despesas de viagem venderam tudo o que tinham no Recife. No Rio de Janeiro a família ficou hospedada na casa de Olegário Mariano por algum tempo. Em agosto do mesmo ano conseguiram alugar uma casa na Aldeia Campista, bairro da Zona Norte da cidade, na rua Alegre, 135, atual rua Almirante João Cândido Brasil.

Nelson costumava dizer que seu grande laboratório e inspiração foi a infância vivida na Zona Norte da cidade. De lá saíram para suas crônicas e peças teatrais as situações provocadas pela moral vigente na classe média dos primeiros anos do século XX, e suas tensões morais e materiais. Sua infância foi marcada por este clima.

Era um garoto retraído e um leitor compulsivo de livros românticos do século XIX. Nesta época ocorreu também para Nelson a descoberta do futebol, uma paixão que o acompanharia por toda a vida e que lhe marcaria o estilo literário. E passou também a torcer pelo Fluminense, junto com o irmão Mário Filho. Mas não iam aos jogos porque não tinham dinheiro para tal.

Em 1919, quando completou sete anos, foi matriculado na Escola Prudente de Morais, que ficava próxima da sua casa. Aprendeu a ler rapidamente, recebendo muitos elogios da primeira professora, dona Amália Cristófaro.

Certa ocasião Nelson causou espanto na escola, ao escrever uma redação em que contava um caso de adultério, seguido de morte. Fatos como esse se tornaram mais tarde, marca registrada do escritor.

Em 1922, Mário Rodrigues mudou-se para a Tijuca, o que evidenciava uma grande melhoria de vida. Como seu pai estava sempre envolvido em política e jornalismo, Nélson seguia sua vida de estudante, até que em 1926 foi expulso por rebeldia, do Colégio Batista, na Tijuca, quando cursava a 2ª Série do Ginasial. Depois desse episódio, teve que ser matriculado no Curso Normal de Preparatórios, na rua do Ouvidor, pois seu pai queria que futuramente ele prestasse exames no renomado Colégio Pedro II.

Nélson seguidamente visitava o pai que chegou ao cargo de diretor no jornal, mas este não queria que seus filhos seguissem a carreira de jornalista. Sonhava em ver Nelson e seus irmãos como advogados e as meninas médicas.

Em 1924 Mário envolveu-se em uma batalha entre Epitácio Pessoa e Artur Bernardes, o que lhe custou um ano de cadeia. Tudo porque noticiou que usineiros pernambucanos haviam presenteado a esposa do presidente Epitácio Pessoa, dona Mary, com um colar no valor de 120 contos de réis. Antes de ser preso, Mário e a família tinham se mudado para uma casa na rua Inhangá, próxima ao Copacabana Palace.

Com a prisão, Mário deixou de receber o salário do jornal. A esposa recebia apenas o suficiente para pagar o aluguel da casa. Quem ajudou o jornalista nesse período de dificuldades foi Geraldo Rocha, dono do jornal “A Noite”, concorrente do “Correio da Manha”. Não fosse isso, com certeza sua família teria passado fome.

Ao ser libertado, e de volta ao jornal, Mário pediu demissão porque o dono do “Correio da Manhã” estava tentando se aproximar de seu desafeto, Epitácio Pessoa. Foi quando surgiu o seu próprio jornal, “A Manhã”. Nelson foi trabalhar no jornal de seu pai, como repórter policial, com um salário de 30 mil réis por mês. Tinha pouco mais de 13 anos.

O jornal tinha colaboradores ilustres como Antônio Torres, Medeiros e Albuquerque, Agripino Grieco, Ronald de Carvalho e Maurício de Lacerda. Além desses, havia a turma da casa: Danton Jobim, Orestes Barbosa, Renato Viana, Joracy Camargo, Odilon Azevedo e Henrique Pongetti. Outra figura de “A Manhã” era Apparício Torelly, que mais tarde se autodenominaria "Barão de Itararé".

Nelson chegou a criar um tablóide de quatro páginas, de nome “Alma Infantil”, nascido da troca de correspondências com seu primo Augusto Rodrigues Filho, que não conhecia pessoalmente e que morava no Recife. Ele sonhava ser como seu pai, um espadachim verbal. Depois de cinco números e muitos ataques a políticos pernambucanos e cariocas, Nelson desistiu do tablóide.

A irmã Dorinha morreu em setembro de 1927, aos nove meses, vitima de gastrenterite. Em 1928 a família se mudou para uma nova e luxuosa casa na rua Joaquim Nabuco, 62, em Copacabana. Foi uma época em que esbanjaram dinheiro e fartura.

Nelson e seus irmãos mais velhos trabalhavam no jornal “A Manhã”. Milton era o secretário, Roberto ilustrava algumas reportagens, Mário Filho começou como gerente, indo depois para a página literária e posteriormente a de esportes. Nelson havia abandonado desde 1927 a terceira série do ginásio no Curso Normal de Preparatórios. Nunca mais voltou à escola.

Com uma coluna assinada na página principal, Nelson publicou o seu primeiro artigo em 7 de fevereiro de 1928, com o título "A tragédia de pedra...", com reticências e tudo. Depois, em outro artigo criticou duramente a Ruy Barbosa, a “Águia de Haia”. Seu pai não gostou e Nelson perdeu o espaço na página 3, voltando a ser repórter policial pelos cinco meses que se seguiram.

Quando voltou a publicar sua coluna na página três, o jornal se encontrava mal administrado e cheio de dívidas. O sócio de seu pai, Antônio Faustino Porto, que há tempos vinha arcando com os pagamentos urgentes, tornou-se sócio majoritário e ofereceu o emprego de diretor a Mário. Este aceitou, mas ficou só um dia. A intervenção do novo dono em seus artigos fez com que ele e a família deixassem o jornal.

Amigo de Melo Viana, vice-presidente da República, no dia 21 de março de 1928, quando completou 43 anos, e apenas 49 dias depois de perder o jornal “A Manhã”, Mário Rodrigues lançou seu novo jornal, “Crítica”, que alcançou grande sucesso, chegando a ter uma circulação diária de 130 mil exemplares.

Desconfiado de que um membro da família Rodrigues tivesse envolvimento na morte do argentino Carlos Pinto, repórter de “A Democracia”, o tenente-coronel Carlos Reis mandou a Polícia prender todos os Rodrigues que encontrasse. Foram, pai e irmãos, todos presos. Nelson escapou por não se encontrar no Rio, em viagem para o Recife. Estava em um estado depressivo, por não saber ao certo por quem estava mais apaixonado: Lilia, Carolina ou Marisa Torá, estrela da companhia teatral de Alda Garrido.

Ao lado dos primos Augusto e Netinha, com quem manteve durante algum tempo um namoro epistolar, conheceu Recife e Olinda, a praia da Boa Viagem e, com Augusto, a zona de mulheres do Cais do Porto, considerada a maior da América do Sul. Sua prima, não se sabe como, tirou-o da depressão, fazendo-o voltar a todo vapor para a redação da “Crítica”.

Mas o jornal existiria por pouco tempo. Em 26 de dezembro de 1929, a primeira página de “Crítica” trouxe o relato da separação do casal Sylvia Serafim e João Thibau Jr. Ilustrada por Roberto e assinada pelo repórter Orestes Barbosa, a matéria provocou uma tragédia.

Sylvia, a esposa que se desquitara do marido e cujo nome fora exposto na reportagem, invadiu a redação de “Crítica” e atirou em Roberto com uma arma comprada naquele dia. Nelson testemunhou o crime e a agonia do irmão, que morreu dias depois.

Apenas 67 dias depois da morte do filho, Mário Rodrigues sofreu, aos 44 anos, uma trombose cerebral. Faleceu dias depois de encefalite aguda e hemorragia. Diante de tão sentidas perdas a família não encontrou mais condições de morar na mesma casa. Mudaram-se para outra casa na rua Sousa Lima, também em Copacabana.

Sylvia, apoiada pelas sufragistas e por boa parte da imprensa concorrente de “Crítica”, foi absolvida do crime. Finalmente, durante a Revolução de 30, a gráfica e a redação de “Crítica” foram empastelados e o jornal deixou de existir.

Sem seu chefe e sem fonte de sustento, a família Rodrigues mergulhou em decadência financeira. Foram anos de fome e dificuldades para todos.

Os irmãos começam a procurar emprego. Foram meses batendo em portas fechadas. Começaram a vender tudo o que tinham para poder sobreviver e, devido ao aluguel sempre atrasado, eram obrigados a mudar de casa a cada três meses. Até que um dia uma porta se abriu para Mário Filho e os outros irmãos penetraram por ela.

Irineu Marinho havia fundado o jornal “O Globo” em 1925, mas, apenas 21 dias após o jornal circular pela primeira vez, morreu de enfarte. Roberto Marinho, filho de Irineu, era o sucessor natural, mas achou-se muito inexperiente para comandar um jornal. Chamou um velho companheiro de seu pai, Euricles de Matos, para tocar o negócio. (Pesquisa: Nilo Dias)

Nelson Rodrigues e filhos no Maracanã, durante um jogo do Fluminense. (Foto: Divulgação)