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domingo, 1 de janeiro de 2012

A morte de mais um ex--craque bageense

Parece que a “miudinha” chegou a Bagé nos últimos dias de 2011. Depois da morte de Vicente, zagueiro que marcou época no Santos de Pelé, agora faleceu Carlos Calvet, ponteiro-direito, também filho de Bagé e que jogou no Internacional, de Porto Alegre. Ele morreu na Santa Casa de Bagé, onde estava internado há várias semanas, tratando de problemas respiratórios. O enterro ocorreu no domingo, no Cemitério daquela cidade.

Carlos Donazar Calvet, o “Tóia”, nasceu em Bagé no dia 26 de julho de 1926. Mas a trajetória profissional foi iniciada fora da terra natal. Aos 18 anos foi morar em Pelotas. Quando estudava no Colégio Gonzaga, foi convidado a jogar nas categorias de base do E.C. Pelotas. Na Princesa do Sul atuou em 1944 e conquistou o vice-campeonato gaúcho de 1945.

Em 1946 foi contratado pelo Guarany, de Bagé e na mesma temporada foi negociado com o Botafogo, do Rio de Janeiro, onde atuou até meados de 1948 e serviu no Ministério da Guerra. A passagem pelo futebol carioca foi lembrada recentemente em entrevista concedida ao programa “Jogo Limpo” da "TV Sem Fronteira". “Excursionamos a Bolívia, onde fui interprete da delegação. Eles não sabiam nada de castelhano. Passamos um mês, jogamos três jogos, com duas vitórias e um empate” contou.

Atacante habilidoso, excelente finalizador e dono de forte chute, em 1948 foi contratado pelo Internacional, de Porto Alegre, com a função de substituir o craque Tesourinha, vendido ao Vasco da Gama, do Rio de Janeiro. Em 1949 voltou a jogar pelo Guarany.

Em 1950 e 1951, foi jogador do Bagé. Em 1952, Carlos Calvet, retornou ao Guarany e jogou até 1961, quando aos 33 anos deu adeus à carreira vitoriosa como atleta. Várias vezes foi treinador do alvirrubro bageense. Atuou também pela Associação Atlética Gente Boa, no campeonato amador da cidade. E, a convite do radialista Mário Teixeira Codevilla, ainda jogou pela equipe de futebol da Rádio Difusora, na década de 1960.

O ex-jogador Carlos Calvet estava aposentado e residia no Bairro Getúlio Vargas, em Bagé. Artilheiro nato marcou 109 gols pela dupla Na-Gua, 84 gols pelo Guarany e 25 pelo Bagé, inclusive sendo o autor do gol 1000 do jalde-negro, na derrota por 4 X 3 para o Brasil, de Pelotas, em 12 de agosto de 1951.

Um dos grandes momentos da sua carreira profissional, aconteceu no dia 24 de março de 1957. O Santos F.C., que realizava uma série de jogos no Rio Grande do Sul, se apresentou em Bagé, no Estádio da “Pedra Moura”, diante da seleção Ba-Gua, jogo que terminou empatado em 1 X 1. Pelé marcou para os santistas, enquanto Carlos Calvet, que teve atuação destacada, anotou o gol do combinado.

Eu assisti aquele jogo. Tinha apenas 16 anos de idade e aproveitei a proximidade de minha terra natal, Dom Pedrito, com Bagé. O Santos de Pelé e companhia foi o primeiro grande time de futebol, que vi jogar. Na escalação monstros sagrados como Ramiro, Formiga, Del Vechio, Jair da Rosa Pinto, Pepe, Pelé e outros.

Carlos Calvet era irmão de Raul Calvet, que jogou no Grêmio e Santos e faleceu aos 72 anos de idade, no dia 29 de março de 2008, em Porto Alegre, onde se tratava de um câncer no esôfago. Um dia depois de sua morte, o corpo foi cremado na capital gaúcha.

Nascido em Bagé, no interior gaúcho, Raul Calvet foi revelado pelo Guarany local e depois esteve no Grêmio, antes de chegar na Vila Belmiro para vestir a camisa do Santos. No onze da Vila Belmiro foi bicampeão mundial, num time basicamente formado por Gilmar – Lima – Mauro - Calvet e Dalmo - Zito e Mengálvio – Dorval – Coutinho - Pelé e Pepe.

Jogou 10 partidas pela Seleção Brasileira e foi campeão mundial em 1962. Era considerado um jogador técnico e elegante. Abandonou o futebol aos 30 anos ao romper o tendão de Aquiles. (Pesquisa: Nilo Dias)

Carlos Calvet, quando jogava no Guarany, de Bagé.

Morre Mário Pereira, o "Perigo Loiro"

Morreu no último sábado, 31/12/2011, na cidade de Santos, onde residia, o último remanescente do time do Santos F.C., que conquistou o primeiro campeonato paulista para o clube, no distante ano de 1935. Mário Pereira tinha 97 anos de idade e na sua época de jogador era conhecido como “Perigo Loiro” por causa dos longos cabelos que já não possuia mais. A causa da morte não foi revelada.O corpo foi velado no Memorial Ecrópole Ecumênica, próximo ao estádio da Vila Belmiro.
Mário Pereira, que tinha 21 anos de idade, era titular absoluto da equipe que bateu o Corinthians no Parque São Jorge, por 2 X 0, gols de Araken Patusca e Raul Cabral Guedes, no jogo final, disputado no estádio de Parque São Jorge, que deu ao Santos o seu primeiro título de expressão. Hoje o clube soma 19 títulos estaduais.

Ele nasceu em Santos, no dia 4 de abril de 1914, dois anos após a fundação do alvinegro. Foi um meia-direita tão eficiente no ataque como na defesa, que marcou 24 gols nos 41 jogos que fez pelo Santos, média de 0,58 por jogo. Mário teve a carreira abreviada por uma grave lesão. Marcado às vezes com violência, teve a infelicidade de quebrar o joelho esquerdo em 1938, com apenas 24 anos, e ser obrigado a abandonar a carreira. “Nem me lembro quem foi. Só sei que entrou por trás e me quebrou aqui”, dizia ele, mostrando a cicatriz que já tinha 73 anos.

A última aparição pública de Mário Pereira foi em janeiro de 2011, no Memorial das Conquistas do Santos. Ao lado do Rei Pelé, o campeão paulista de 35 tirou fotos, distribuiu autógrafos e posou com a bola da competição que venceu sobre o Corinthians. O Santos estudava escalar o ex-meio-campista para uma série de ações referentes à celebração do centenário da equipe que será celebrado neste ano de 2012. Em 2004, como forma de homenagem, a equipe inaugurou um camarote com o nome do ídolo falecido neste sábado.

Ele adorava a cidade onde nasceu, foi criado e passou toda a vida. Nunca pensou em morar em outro lugar. Quando lhe perguntavam o que aconteceria se jogasse hoje e recebesse uma proposta milionária de um clube europeu, respondia apressadamente: “Não aceitaria nenhuma proposta para sair daqui. Aqui é a minha cidade, minha terra”, dizia sorrindo. Torcedor fanático do Santos, acompanhava todos os jogos do time pelo “pay per view”. Como ficava muito nervoso, colocava as mãos e os pés em bacias d’água, para se acalmar.

Antes de 1935 o Santos teve um período, mais especificamente de 1927 a 1931, em que foi um dos melhores times do país e poderia, naturalmente, ter sido campeão paulista em mais de uma temporada. Porém, vários fatores contribuíram para que isso não acontecesse. O Santos não só foi prejudicado pelo poder do futebol paulista, como pela intransigência de seus próprios dirigentes. Mário Pereira guardava certa bronca de um árbitro chamado Artur Cidrim, que segundo ele, beneficiava principalmente o Corinthians, que tinha “dirigentes dentro da liga” e “já era o time de maior torcida na época.

O ano de 1935 não começou bem para o Santos, que perdeu os dois primeiros amistosos que fez: 3 X 2 para o São Paulo e 1 X 0 para a Portuguesa de Desportos, ambos na Vila Belmiro. Como o Campeonato Paulista demoraria a começar, deu tempo para o time se redimir, com vitórias sobre Corinthians, por 3 X 2, São Cristóvão, 2 X 1 e Espanha, 10 X 1.

Deu até para aceitar um convite para uma excursão ao Rio Grande do Sul, de 12 a 26 de maio, quando venceu o Novo Hamburgo por 4 X 2 e Riograndense (Porto Alegre), 4 X 3, empate em 1 X 1 com o Internacional e derrotas para o Grêmio por 3 X 2 e Seleção Gaúcha, também por 3 X 2.

Uma excursão como essa, naqueles tempos de poucas viagens, era tudo que os jogadores queriam. Só que chegaram a Santos no dia 29 de maio e descobriram que a tabela marcava para o dia 2 a estréia contra o Palestra, que era o atual campeão paulista.

Logo de cara, um jogo decisivo, pois se o time tinha alguma pretensão de brigar pelas primeiras posições, deveria vencer o Palestra na Vila. No segundo turno o jogo seria no Parque Antártica e a dificuldade seria bem maior. Sabendo disso e lutando como nunca, o Santos venceu por 1 X 0, gol do centroavante Raul.

A vitória sobre um dos favoritos ao título animou os santistas, que em seguida venceram também o Espanha, no campo do Macuco, por 2 X 0, e o Paulista, da Capital, no Parque Antártica, por 5 X 1. No quarto jogo veio a derrota para o Corinthians, na Vila Belmiro, por 2 X 1. Mas o time se aprumou de novo e venceu a Portuguesa Santista, na Vila Belmiro, 3 X 1 e o Juventus, na Capital, 4 X 1. Nesta última partida, a que encerrou o primeiro turno, o time ganhou o reforço de Araken, que voltava ao Santos.

Na estréia do segundo turno, outro confronto com o Palestra, desta vez no Parque Antártica. Jogo tenso, difícil, que terminou sem gols. Depois, uma goleada no Espanha, na Vila, 4 X 1 e outra no Paulista, 5 X 2, também em casa. Mas a Portuguesa Santista complicou as coisas em Ulrico Mursa, empatando em 3 X 3. O time depois teve de vencer o Juventus em nervosos 2 X 1, na Vila. Na última partida, frente o Corinthians, no Parque São Jorge, o time precisava apenas de um empate para ser campeão.

Bilu, o técnico santista, temia que a emoção traísse seus jogadores, ou que o árbitro, Heitor Marcelino Domingues, pudesse puxar a sardinha para os times da Capital. O Corinthians não tinha chance de ser campeão, mas sua vitória daria o título ao Palestra Itália, mesmo clube que venceu o Santos na Vila Belmiro, em 1927, quando o empate bastaria para que a taça ficasse em Santos.

Bilu, que jogou a decisão de 1927 como zagueiro, jamais escondeu a mágoa pela forma com que o campeonato lhe tinha sido tirado, com uma atuação parcial e cínica do árbitro Antonio Molinaro. Naquele 17 de novembro, no Parque São Jorge, finalmente Bilu teria a chance de, por linhas tortas, saborear sua vingança.

A boa torcida que subiu de trem para São Paulo fez o time se sentir à vontade, mesmo no campo do rival. Um grupo de torcedores do Santos que trabalhava na estiva do Porto, cansados de ver o time ser prejudicado pela arbitragem em jogos decisivos, levou galões de gasolina para o estádio do Corinthians. Se o Santos fosse roubado mais uma vez, prometiam colocar fogo na Fazendinha. Mas não precisaram chegar a tal extremo. Jogando melhor, o Santos venceu por 2 X 0.

O título ficou mesmo com o melhor do campeonato. Em 12 jogos foram 9 vitórias, 2 empates, uma derrota, 32 gols marcados, 12 sofridos e saldo de 20 gols. Mário Pereira fez cinco gols na competição. O São Paulo faliu, nem disputou o campeonato, foi refundado no mesmo ano e voltou á Liga Paulista em 1936. O Palestra perdeu alguns jogadores para o Fluminense (RJ),como o meia Romeu Pelicciari. O Corinthians, depois de fazer um primeiro turno impecável, perdeu um jogo atrás do outro no segundo. O Santos não tinha nada com isso, e foi campeão.

Ficha Técnica do jogo que deu o primeiro título estadual ao Santos:

Corinthians 0 X 2 Santos
Data: 17 de novembro de 1935, domingo à tarde.
Local: Parque São Jorge
Gols: Raul aos 36 minutos do primeiro tempo; Araken aos 17 do segundo.
Árbitro: Heitor Marcelino Domingues.
Público: 15.000 pagantes.
Corinthians: José - Jaú e Carlos – Brito - Brandão e Munhoz – Teixeira – Carlito – Teleco - Alberto e De Maria. Técnico: José Foquer.
Santos: Cyro - Neves e Agostinho – Ferreira - Martelete e Jango – Sacy - Mário Pereira – Raul - Araken e Junqueira. Técnico: Bilu.

Em 2005, quando da comemoração dos 93 anos do Santos F.C., um dos momentos mais emocionantes, foi quando o presidente, na época, Marcelo Teixeira pediu uma salva de palmas para Mário Pereira, até então o único ex-jogador ainda vivo campeão paulista de 1935. Todos os convidados o aplaudiram de pé. (Pesquisa: Nilo Dias)

Time do Santos, campeão paulista de 1935, com Mário Pereira.