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segunda-feira, 28 de outubro de 2013

O “tigre” curitibano

O futebol paranaense ostenta um recorde mundial de fusões, que acabaram pela criação do Paraná Clube. O clube para chegar a sua atual denominação passou por quase um século de fusões e trocas de nomes.

Essa história envolve vários clubes, Leão F.C. e Tigre F.C.: (que se uniram e formaram o Britânia S.C.). Savóia F.C. e E.C. Água Verde: (em 1926, após uma fusão entre eles foi criado o Savóia-Água Verde. No dia 3 de março de 1942 o clube foi obrigado pelo Governo Federal a mudar o nome para E.C. Brasil, pois havia sido declarada guerra à Itália e o nome Savóia, era uma clara homenagem áquela nação. Em 1944 voltou a chamar-se Água Verde. Em 1971 mudou o nome para E.C. Pinheiros).

Palestra Itália F.C.: (na guerra chamou-se Paranaense E.C., C.A. Comercial e S.E. Palmeiras. Depois voltou ao nome original. Era conhecido como “Periquito”, por conta da camisa e “Nem que Morra”, pelos jogadores. Em 1971 fundiu-se com o Britânia e o Ferroviário criando o Colorado E.C.).

C.A. Ferroviário: (uniu-se ao Britânia e ao Palestra Itália criando o Colorado E.C.). Colorado E.C.: (resultado da fusão entre Britânia, Ferroviário e Palestra Itália). E.C. Pinheiros: (antigo E.C. Água Verde que mudou de nome em 12 de agosto de 1971. Em 1989 o Pinnheiro uniu-se ao Colorado E.C. e foi criado o Paraná Clube).

Tudo teve início no distante dia 30 de novembro de 1914, quando um grupo de jovens funcionários da fábrica de vidros Solheid, fundou o Britânia Sport Club. Foi o resultado da fusão entre dois times do bairro Rebouças: o Leão F.C. e o Tigre F.C., ambos formados por adolescentes da região.

Depois de uma partida entre eles confraternizaram com um churrasco, isso no dia 19 de dezembro de 1914. Foi nesse ambiente de festa, que o senhor Carlos Thá teve a idéia de propor a fusão das duas equipes.

O nome Britânia foi escolhido para homenagear a Grã-Bretanha, já que alguns dos fundadores do clube eram ingleses. Os torcedores passaram a chamar o novo clube de “tigre”, pois o seu primeiro campo se localizava nos limites da cidade, e se dizia que dali daquele mato em diante poderia-se encontrar qualquer coisa, até “tigre” escondido.

Outra versão é de que o apelido “tigre” tenha sido herança do nome de um dos clubes que deu origem ao Britânia, o Tigre F.C. Seja uma versão, ou outra, a verdade é que a “fera” passou a ser a “mascote” da novel agremiação.

A primeira Diretoria ficou assim constituída: Presidente, Francisco Zanicotti; Secretário, João Tesserolli; Tesoureiro, João Felipe Galli. O Britânia mantinha um bom quadro social, em que despontavam as famílias Volpi, Zardo, Marinoni e Schiavon. Na sede social, eram realizados bailes famosos.

Nos seus primeiros anos de vida o Britânia treinava num terreno onde hoje fica a Tecnológica Federal do Paraná. Naquele tempo era uma área fora da cidade, pois o perimetro urbano terminava na rua Visconde de Guarapuava.

Em 1916 foi vice-campeão parananese. De 1918 a 1923, sagrou-se exa-campeão. O Britânia foi o primeiro clube no Paraná a conseguir tal feito. Os historiadores creditam essa surpreendente conquista ao fato do time, que ao contrário dos adversários, não fazia restrições a jogadores negros.

E não deixando de se reconhecer a regularidade da equipe, que se manteve a mesma desde 1915. O destaque do time era Joaquim Martin, o maior artilheiro da história do Britânia.

Alguns anos depois da fundação, o clube ergueu uma sede social num belo prédio na Praça Eufrásio Correia, em frente a antiga estação ferroviária.

Todos os domingos havia jogos, jantares e bailes. Eram os anos 1920 e 1930 e Curitiba era uma festa. As vitórias e títulos eram comemorados com grandes reuniões festivas, reunindo as moças mais bonitas da sociedade. Naquela época, as melhores e mais badaladas festas aconteciam no Britânia.

O clube ainda conquistou mais um campeonato estadual, em 1928, quando ainda contava com alguns jogadores veteranos do exa. Depois, nunca mais colocou a mão na taça. Mesmo assim, é um dos cinco clubes com o maior número de conquistas estaduais.

A partir daí passou a participar apenas como figurante nas competições que disputou. A exeção foi no campeonato de 1964, quando conseguiu sua última façanha: um honroso terceiro lugar.

Em 1922, a equipe excursionou pelo Rio de Janeiro, quando disputou dois jogos no estádio de General Severiano. A primeira partida do então penta-campeão paranaense aconteceu no dia 10 de dezembro, contra a equipe do Botafogo e empatou em 1 X 1.

No dia 17 de dezembro venceu a equipe do Vasco da Gama por 2 X 0. Foi a primeira viagem de uma equipe do Paraná para atuar em outro Estado brasileiro.

Enquanto o futebol se profissionalizava em todo o Estado, o Britânia agonizava numa lenta decadência, até que em 1971 se fundiu com outros dois clubes tradicionais, Ferroviário e Palestra Itália, formando o Colorado Esporte Clube.

A decadência do Britânia teve origem na criação do Clube Atlético Ferroviário, em 12 de janeiro de 1930, depois de uma cisão dentro do clube. O Britânia, com isso, perdeu a ajuda que recebia da Viação Ferroviária Paraná-Santa Catarina, desde a sua fundação.

A empresa pagava jogadores, como se fossem seus funcionários. A partir da fundação do Ferroviário, tudo mudou para pior. O patrocínio, os atletas-funcionários, os negros e até os torcedores guarda-freios, graxeiros e eletricistas dos trens, migraram para o novo clube. A partir daí os gozadores de plantão diziam que o “Tigre teve suas presas limadas”.

O Ferroviário chegou a ser um “gigante” do futebol paranaense, tendo sido bi-campeão estadual em 1937 e 1938 e também em 1944 e 1948. Levantou a taça ainda em 1953. Voltou a ser bicampeão em 1965 e 1966. Foi o primeiro representante do Estado no antigo “Torneio Roberto Gomes Pedrosa”, o “Brasileiro” da época.

O Ferroviário ganhou o apelido de "Esquadrão de Aço" na década de 40, quando realizou alguns amistosos no Rio Grande do Sul e voltou para Curitiba invicto. Foi campeão do "Ano Santo" em 1950 e sua maior conquista foi o título de "Campeão do Centenário" em 1953.

A decadência dos chamados clubes “pequenos” também foi obra do “trio de ferro”, Ferroviário, Atlético e Coritiba, que assediavam as revelações dessas equipes, oferecendo empregos e outras vantagens.

No caso do Atlético emprego no Governo Estadual; do Ferroviário, na Rede Ferroviária Federal; e o “Coxa” argumentava com recursos de empresários fortes. Os demais só olhavam sem nada poderem fazer.

Flávio Merinoni jogou no Bretânia e trabalhava na Rede Ferroviária Federal. Pressionado a ir para o Ferroviário, ele continouou no “Tigre”. Rafael Machado, o “Faéco” teve de optar em continuar no Britânia ou perder o emprego na Rede Ferroviária Federal. Preferiu deixar de vez o futebol.

Até o começo dos anos 30, o Coritiba F.C. alugava o estádio do “Parque Graciosa”, no Bairro “Juvevê”. Mas depois de um acerto com o proprietário, o clube foi ressarcido pelas benfeitorias feitas, e com o dinheiro recebido pagou a entrada do terreno no “Alto da Glória”. E até o “Belfort Duarte” ficar pronto continuou usando o “Parque Graciosa”.

Em 1933, com a ida do Coritiba para a sua nova casa, o Britânia passou a usar o “Parque Graciosa”, onde mandou seus jogos até 1940.

Os torcedores chamavam esse estádio de “Cimento Armado”, não pelas arquibancadas, que foram reformadas em 1927, mas pela dureza do gramado. A partir de 1941, passou a ser utilizado pelo Palestra Itália para treinamentos, depois vieram os jogos da “Suburbana”, um campeonato amador realizado em Curitiba, até ser loteado.

O Britânia só conseguiu ter o seu estádio próprio na década de 40, graças ao coronel Francisco de Paula Soares Netto, um médico do Exército Brasileiro que foi presidente da Federação Paranaense de Futebol (FPF) e do Britânia nas décadas de 30 e 40.

Ele tinha ótimos contatos e não teve dificuldades em conseguir os recursos para que o clube adquirisse uma área na rua Carlos Dietzsch, no Bairro “Portão”,próximo a igreja,  num local arborizado e belissimo conhecido como “Fazendinha”.

Em retribuição aos esforços do coronel, o Britânia batizou o seu estádio de “Paula Soares”. A inauguração aconteceu no dia 15 de agosto de 1943, com o jogo Avai (SC) 4 X 1 Britânia. Não chegava bem a ser um estádio, mas era fechado e ali o clube realizava treinos e alguns jogos.

Não demorou muito tempo para que o Britânia vendesse o estádio para à indústria textil Ibicatu Agro Industrial S.A., que também mantinha um time de futebol. Em compensação, recebeu da prefeitura permissão para erguer seu novo estádio em outra área.

Quando começou a construir seu novo “Estádio Paula Soares”, o prefeito revogou a autorização, porque a área havia sido doada à prefeitura com a condição de nela ser feita uma praça, que viria a ser a “Praça Botelho de Souza”.

Para não deixar o clube mal, doou um terreno localizado na “Estratégia”, nome da estrada entre Curitiba e São José dos Pinhais, construída pelos americanos durante a guerra.

Em 6 de junho de 1965, o Britânia inaugurou o seu último “Estádio Paula Soares”, que se localizava na avenida Comendador Franco, também conhecida por “avenida das torres”, no Bairro Guabirotuba, às margens da BR-116.

Na ocasião derrotou o Água Verde por 3 X 2, em jogo válido pelo Campeonato Paranaense. O time do Britânia, naquela ocasião, formou com Barbosa – Zé Carlos – Acir – Marcelo e Antero – Clayton – Grão – Fiúza e Airton - Kruger – Soca e Martins.

Soca fora campeão pelo Grêmio, de Maringá, em 1960 e Kruger viria a ser tempos depois um grande ídolo do Coritiba. O estádio era bem estruturado, com vestiários modernos e uma grande novidade, banheiras térmicas.

O novo “Paula Soares” não deu muita sorte ao time principal do Britânia, pois nesse mesmo ano de 1965 foi rebaixado, após perder o “Triangular da Morte”.  O mesmo não se pode dizer das categorias inferiores do clube: nesse período, o Britânia foi vice-campeão de aspirantes em 1965, bicampeão de juvenis em 1967-1968 e vice de juvenis em 1969.

Em 1998 o estádio foi vendido para a rede atacadista (Sonae Atacadista) que construiu a loja “Big Hipermercados”.

Em 1966 disputou a 2ª Divisão. Mas para resolver uma crise entre os clubes da “Primeirona”, foi estabelecido que o certame daquele ano contaria com 14 clubes.

A última vaga foi decidida num torneio hexagonal, denominado “Torneio Esperança”, que foi vencido pelo Britânia – seu último título. Conquistada a vaga, terminou a competição em último lugar, voltando a “Segundona”, em 1970, sem obter classificação.

Títulos do Britânia: Vice-Campeão Paranaense: (1916); Campeão Paranaense: (1918, 1919, 1920, 1921, 1922, 1923 e 1928); Torneio Início: (1919, 1923, 1926, 1928, 1933, 1959 e 1961); Torneio Esperança: (1968); Campeonato Paranaense de Juvenis: (1967 e 1968).

Artilheiros do clube no Campeonato Parananese: Joaquim Martin, com 17 gols em 1918, 7 gols em 1919, 9 gols em 1920, 17 gols em 1921 e 25 gols em 1922. “Faéco”, com 21 gols em 1923 e Marinoni, com 6 gols em 1928.

Além de ser um dos dois únicos clubes exa-campeões estaduais – o outro é o Coritiba -, o Britânia conquistou três campeonatos de forma invicta (1921, 1922 e 1923) e em sete ocasiões teve o artilheiro da competição. O Britânia das décadas de 1910 e 1920 era quase imbatível.

Em 17 de março de 1971, o Britânia fez fusão com o C.A. Ferroviário, que também vivia um período de decadência, pois não tinha mais o apoio da rede ferroviária, e o Palestra Itália F.C., que estava fora do futebol profissional desde 1967, para formação do Colorado E.C. O novo clube escolheu o Estádio Durival de Brito para sediar seus jogos.

O “Estádio Paula Soares” tinha instalações acanhadas, que não permitiriam seu aproveitamento em jogos oficiais, apenas para alguns treinamentos quando o gramado da Vila necessitasse ser poupado. Ou para abrigar as Feiras do Comércio e Indústria do Paraná (Fecip).

Em 19 de dezembro de 1989 o Colorado E.C. fez fusão com o E.C. Pinheiros, nascendo o Paraná Clube. O último jogo do Colorado aconteceu na tarde de 8 de julho de 1989. Jogando em seu estádio, o Durival de Brito e Silva, o time vermelho e branco empatou com o Coritiba em 3 X 3.

Luisinho marcou o último gol da história do Colorado, o terceiro de sua equipe no jogo. Roberto Gaúho, do Coritiba marcou o último gol sofrido pelo extinto clube da “Vila Capanema”.

Com a fusão, o Paraná Clube herdou os estádios Durival Britto (do Colorado, o “Paula Soares”, do Britânia, o do Palestra Itália, e os dois estádios do Pinheiros: “Erton Coelho de Queiroz”, que o Paraná ainda utilizou em algumas partidas e o “Orestes Thá”, na Vila Guaíra, que pertenceu ao extinto E.C. Água Verde. Na área onde se localizava o estádio, foi erguida a suntuosa sede do Paraná Clube.

Embora não faltassem estádios, o Paraná Clube ainda arrendou o “Pinheirão”, após o Atlético rescindir o contrato que tinha com a FPF, em 1994.

O Paraná Clube manda seus jogos no Durival de Brito, carinhosamente chamado de Vila “Capanema”. O estádio se localiza na região central de Curitiba, no bairro do “Jardim Botânico”.

A Construção do Estádio Durival Britto foi um marco na vida do Clube Atlético Ferroviário e na história do futebol paranaense. Depois de inaugurado em 23 de janeiro de 1947, ele passou a ser o terceiro maior estádio do país, na época, com capacidade inferior apenas ao Pacaembu, em São Paulo e ao São Januário, no Rio de Janeiro.

Para a pacata Curitiba dos anos 40, o majestoso estádio construído no antigo terreno da chácara do “Marquês de Capanema” foi um acontecimento histórico que mereceu os mais variados tipos de análises, avaliações e comemorações.

A “Vila Capanema” é um verdadeiro templo do futebol paranaense, pois foi a única praça esportiva do Estado a sediar uma partida pela Copa do Mundo, em 1950. São 58 mil metros quadrados de área e de tradição.

Palco de grandes momentos do passado, o estádio foi reinaugurado em setembro de 2.006, com a ampliação da capacidade de 12.100 para 20.083 espectadores.

A “Vila Capanema” passou por uma grande reforma, sendo totalmente revitalizada, ganhando uma nova arquibancada, novos camarotes, novas lanchonetes, novos sanitários, uma nova sala de imprensa e o maior estacionamento entre os estádios dos clubes da capital.

Com o abandono, o “Estádio Paula Soares” agonizou durante esse período. As arquibancadas continuavam em pé. As telhas caíam aos poucos. O mato tomava conta do entorno do campo. No entanto, o gramado mesmo continuava aparado.

Com um pouco de sorte, se via até alguma atividade, como um treino de jogadores, um “rachão” ou algo assim. Alguns sócios do Paraná Clube usavam o campo para treinar beisebol.

Tempos depois, do telhado só havia sobrado o esqueleto de concreto e o campo já tinha sido devidamente engolido pelo capim. As arquibancadas cinzentas do “Paula Soares” foram finalmente demolidas, em 1998, para construção de uma filial do Hipermercado “Big”.

O nome do coronel “Paula Soares”, porém, não teve o mesmo triste fim do estádio. Hoje ele é lembrado como “Patrono” do tricolor da “Vila Capanema”.

Uma curiosidade: no Cemitério Municipal de Curitiba existe uma cripta com o símbolo do clube e alguns jogadores sepultados – com foto e tudo. (Pesquisa: Nilo Dias)

Britânia S.C. no início do século XX. (Foto: Arquivo da Federação Paranaense de Futebol -FPF)