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sábado, 30 de novembro de 2013

O craque desengonçado

Já imaginaram um jogador de futebol todo desengonçado, baixinho, apenas 1,67m, pernas finas e curtas, barriga de dirigente de clube e um jeito nada convencional de correr? Pois existiu um com todas essas caracteristicas antifutebolísticas, o atacante “Ageu Sabiá”, assim apelidado pela semelhança com o pássaro. Mas bastava entrar em campo, para em poucos minutos deixar calados todos os que não acreditavam nele.

O peso ideal de Ageu era 65 quilos, mas perdeu as contas de quantas vezes entrou em campo com até 10 quilos a mais, o que segundo ele, em nada atrapahava seu desempenho. Esse ganho extra de peso tinha tudo a ver com sua alimentação que não era nada saudável. O que ele gostava mesmo era de hambúrguer, churrasco, pastel, pão com manteiga e refrigerante. E às vezes, para acompanhar, generosos copos de cerveja.

Os preparadores físicos dos clubes em que Ageu jogou, tinham consciência de que sua alimentação não era a ideal para um jogador de futebol, mas não o questionavam sobre isso, porque sabiam que dentro de camopo ele resolvia. Muito pelo contrário, até o deixavam fora das tradicionais “maratonas”. Fazia apenas treinamentos específicos. Em dia de jogo, era capaz de correr 100 metros em dez segundos, o que não era façanha para qualquer um.

Era um artilheiro nato, daqueles que gostava de pegar a bola na intermediária, deixar os zagueiros no chão a dribles, fazer o gol e correr em direção a torcida para comemorar. Foi um dos maiores mitos da história do futebol paraense.

Foi artilheiro por dois anos seguidos do “Campeonato Santareno” de 1986/87, o que chamou a atenção do diretor Walter Abél, do Tuna Luso, de Belém. Mas ao ver o biotipo do atleta, até então desconhecido, jogadores, comissão técnica e até os repórteres que cobriam o dia a dia do clube riram e se perguntavam: “como uma pessoa acima do peso poderia se aventurar a jogar profissionalmente?”

Ageu Elivan Lopes do Nascimento nasceu no dia 10 de Setembro de 1967 em Monte Alegre (PA). Seu primeiro time profissional foi o São Raimundo, de Santarém (PA), que disputava o campeonato da cidade. Em 1986 trocou de time, indo para o rival São Francisco, onde se tornou artilheiro e bi-campeão municipal.

Ganhou fama, e em 1988 foi contratado pelo Tuna Luso, onde se sagrou campeão estadual pela primeira vez. Depois foi para o Paysandu, que estava na “Terceira Divisão” e conseguiu subir para a “Segunda”. Em 1992 o Remo o contratou.

Em 1993 estava de volta ao Tuna Luso, conquistando a artilharia do campeonato estadual. Igual a pássaro que anda de galho em galho, retornou ao Remo no segundo semestre daquele mesmo ano, para disputar o “Campeonato Brasileiro da Série A”.

Novamente deixou o Remo, se transferindo para o Noroeste, de Bauru (SP). Ficou pouco tempo e voltou ao Pará, passando antes pelo São Carlense, de São Carlos (SP) e Tuna Luso. Voltou ao Remo em 1996, para ganhar mais dois títulos estaduais, em 1996 e 1997.

Competições disputadas. Pelo Remo: Série B (1992); Campeonato Brasileiro da Série A (1993); Campeonato Paraense (1996, 1997 e 1998); Copa do Brasil (1996, 1997 e 1998). Títulos ganhos pelo Clube do Remo. Campeonato Paraense (1996 e 1997); Pelo Tuna Luso. Campeão estadual (1988); Campeão municipal de Santarém, pelo São Francisco (1986 e 1987)

O que pouca gente sabe é que “Ageu Sabiá”, enquanto fazia história no futebol paraense, colecionava títulos, medalhas e marcava centenas de gols, divertindo os torcedores paraenses, viveu um drama extracampo. Ele lutou por três longos anos pela saúde do filho Breno, que sofria de leucemia.

Em 2010, quando o menino completou 9 anos, a grande nóticia: estava curado. Para Ageu isso foi melhor do que qualquer título que ganhou. Pai e filho passaram por um verdadeiro drama, que começou quando o menino tinha apenas 7 anos e foi diagnosticada a doença.

Foram 2 anos e 7 meses na luta pela cura da doença. A rotina de pai e filho mudou. Breno deixou de jogar bola e estudar, para se dedicar ao tratamento. E Ageu, teve que se mudar para o Hospital Ophir Loyola, onde o menino passou muitos dias de sua vida.

Ageu Sabiá” também ganhou fama de folclórico. Contava muitas histórias engraçadas que diziam respeito a sua barriga descomunal. Talvez a melhor de todas seja uma ocorrida em 1993, quando Remo e Portuguesa de Desportos jogaram no Estádio do Canindé, pelo “Campeonato Brasileiro”.

Um repórter veio entrevistar Ageu e perguntou como ele podia correr com uma barriga daquele tamanho. Sem pestanejar, respondeu: “O cavalo é barrigudo e também corre”. Em1993, antes de uma partida contra o Goiás, no “Serra Dourada”, outro repórter lhe disse que era difícil alguém de fora ganhar deles lá dentro. E Ageu respondeu: “Difícil é dar rasteira em cobra e cachuleta em jabuti. O resto é fácil”.

Quando desembarcava do ônibus as pessoas pensavam que ele era o roupeiro do time. Ageu não se importava e respondia dentro de campo com muitos gols Mas é inegável que a fama de “gordinho” atrapalhou um pouco a sua carreira, não tendo conseguido jogar em nenhum time grande do Sul ou do Sudeste. É verdade que andou pouco tempo no interior paulista, onde jogou no Noroeste, de Bauru e São Carlense, de São Carlos.

Em 1994 quase fechou com a Portuguesa de Desportos, mas esbarrou no preconceito. Ageu já tinha até arrumado as malas para viajar até São Paulo, quando o técnico Candinho foi demitido e outro contratado. E desistiram de contratá-lo. A sua fama de “gordo” falou mais alto que sua condição de artilheiro.

Antes de encerrar a carreira, “Ageu Sabiá” ainda marcou muitos gols por Tiradentes, Águia, de Marabá e Ananindeua, todos clubes do Pará.

Fora dos gramados, Ageu ainda acompanha o futebol, em especial o “Campeonato Brasileiro”, vendo jogos pela TV. E elegeu este ano o seu ídolo, que não poderia ser outro, senão Valter, centro-avante do Goiás. Ele vê no craque “gordinho” as mesmas caracteristicas que tinha no tempo em que jogava. Não acredita que Valter possa emagrecer um dia, mas garante que continuará fazendo gols.

Para Ageu, o camisa 9 do Goiás faz por merecer uma chance na “Seleção Brasileira”, por se tratar de um excelente jogador, oportunista, um exímio “matador”. “Sabiá” se diverte dizendo que ele é o verdadeiro “gordinho artilheiro” mais famoso do Brasil, e Walter é o segundo.

O futebol do Pará sempre se caracterizou por alguns aspectos peculiares que serviriam até para um estudo mais aprofundado. Nos anos 50, por exemplo, jogou no Payssandu um atacante de apelido “Pau Preto”. Fez muitos gols e garantiu títulos para o clube. O engraçado, é que os locutores de rádio primavam pela desatenção ao narrarem alguns de seus gols.

Certa ocasião “Pau Preto” estava em tarde de gala, fazendo diabruras dentro de campo, driblando meio time adversário e concluindo para a rede. Um certo locutor, sem perceber a besteira que estava dizendo, lascou: “”Pau Preto” entrou com bola e tudo”.

Na década de 70, jogou no Remo um centro-avante de estatura alta, 1,92m, chamado Alcino e apelidado “Negão Motora”. Era forte e rápido, chutava e cabeceava bem, fazendo gols de todo jeito. O mais lembrado de todos, ele fez num clássico contra o Paysandu. Driblou os zagueiros e o goleiro, colocou a bola em cima da linha e sentou sobre ela antes de fazer um gol de bunda.

Desde então a torcida do Payssando quer ouvir falar no diabo do que em Alcino, protagonista de tamanha humilhação. Alcino era capaz de qualquer coisa para provocar a torcida rival, até de baixar o calção e mostrar as partes íntimas, o que convenhamos, passava de todos os limites toleráveis. Alcino, depois jogou no Grêmio Portoalegrense.

Da mesma época de “Ageu Sabiá”, surgiu no futebol paraense o atacante Edil, talvez o mais folclórico jogador que atuou nos gramados nortistas. Era a verdadeira versão amazônica de “Túlio Maravilha”. A diferença estava no porte físico, Edil tinha mais de 1,80m de altura, nariz de tucano e um cabelo cacheado, estilo anos 80.

Começou a carreira nas categorias de base do Paysandu. Aos 19 anos já estava no elenco de profissionais e foi campeão paraense de 1987. Ganhou fama e foi jogar no Nordeste, para voltar ao Payssandu na década de 90 e fazer história. Começou a marcar gols, ganhar títulos e virou um falastrão.

Foi ele um dos pioneiros na introdução de comemorações irreverentes no futebol paraense. Criou personagens fixos para celebrar os seus gols, como o “Carrasco”, em 1992, quando jogava no Payssandu. Ele carregava preso ao calção um capuz e cobria o rosto com ele, quando fazia um gol. E com o auxilio de um companheiro de time, simulava a degolação de um condenado com uma machadada imaginária. A torcida entrava em delirio.

Em 1996, quando Edil jogou no Clube do Remo, inovou na comemoração, criando o "Braddock", inspirado na série de filmes estrelada pelo igualmente matador “Chuck Norris”. A cada gol, dois ou três jogadores se alinhavam num paredão invisível e eram "metralhados" por Edil.

Em 2000, ele foi contratado pelo Castanhal, do interior paraense. E lá se tornou "Highlander, o goleador imortal". Ele deixava sempre uma espada de plástico no banco de reservas, que servia para performances hilariantes que agradavam a torcida do seu time.

No “Sul Maravilha” também teve um jogador cujo fisico não era nada recomendável para um atleta. Tratava-se de Mauro Coelho, que ganhou o apelido de “Barrilzinho de Pólvora”, pelos quilos a mais que o deixavam quase redondo. Mas isso não impediu que se tornasse um meia-ponta-de-lança respeitado no futebol gaúcho, defendendo Cruzeiro e Internacional, de Porto Alegre, nos anos 60 e 70.

Fez história nas equipes em que jogou, tendo participado da excursão que o Cruzeiro portoalegrense empreendeu por gramados da Europa, em 1960, sendo o primeiro clube brasileiro a fazer isso, fora do eixo Rio-São Paulo. Mauro faleceu prematuramente há alguns anos. (Pesquisa: Nilo Dias)