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terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

O Príncipe cearense

João Erivaldo Queiroz Damasceno, conhecido apenas por Damasceno foi um dos melhores zagueiros do futebol cearense em todos os tempos. Era muito hábil no trato com a bola, o que não impedia de ser vigoroso na marcação aos adversários. Nasceu em Fortaleza, no ano de 1936.

Sua carreira de futebolista teve início no time amador do Atlético Cearense, do Montese, subúrbio de Fortaleza. Sua vida de rapaz pobre começou a mudar quando em 1951, João Brega, o “Jombrega”, na época técnico do Ceará, o viu jogando no campo do Colégio Piamarta.

De imediato o convidou para fazer um teste no alvinegro. E não decepcionou. O Ceará tinha um bom grupo de jogadores na época, com destaques para o lateral-direito William, Alexandre “Filé de Gia”, "Dico Camaroeiro” e Carneiro, lateral-esquerdo.

Em 1953 já era titular absoluto do time e considerado pela crítica cearense como tecnicamente superior a Vareta e Sapenha, do Fortaleza e Macaúba, do Ferroviário.

Naquele ano o Ferroviário sagrou-se campeão cearense, mas Damasceno foi um dos jogadores mais destacados do seu time e da competição. Só conseguiu colocar a faixa no peito nos anos de 1957 e 1958, quando o Ceará foi bicampeão estadual.

Jogou ao lado do volante paraibano Cláudio e dos laterais "Pelado", Clarindo e "Becão", este vindo do Calouros do Ar. Na seleção cearense junto do maranhense Carneiro, também do Ceará e de Filgueiras, alagoano que defendia as cores do "Usina Ceará", clube extinto, que por anos representou os funcionários da fábrica Siqueira Gurgel.

Jogou no Ceará Sporting por quase 10 anos, fazendo dupla com Alexandre Nepomuceno, outro zagueiro de grandes predicados técnicos. Os dois se completavam, um sabia onde o outro estava, mesmo sem se verem. Formaram o par verdadeiramente perfeito dentro de campo.

Damasceno foi apelidado de “Príncipe do Futebol Cearense”, pelo locutor esportivo Ivan Lima, quando o Vasco foi a Fortaleza para um amistoso com o Ceará, que venceu por 1 X 0, gol de Guilherme.

Para motivar a torcida e levá-la a campo, Ivan criou a história do confronto entre o “príncipe carioca”, Danilo, e o “príncipe cearense”, Damasceno. O apelido pegou e acompanhou o zagueiro em toda a sua carreira. Pelé já era o rei.

O zagueiro marcou grandes atacantes do futebol brasileiro, entre os quais Zagalo, Didi, Garrincha, Pelé, Mengálvio, Coutinho, Pepe e Dorval. Mas também destacou os jogadores cearenses Gildo e Mozart, como “terríveis”, capazes de desarticular qualquer zaga.

Damasceno ficou no Ceará até 1960, ano em que se transferiu para o Náutico, do Recife. No clube pernambucano jogou por três anos, até 1963. Depois de ter fraturado a clavícula fez acordo com o clube, se comprometendo a não jogar pelo Sport e Santa Cruz, retornando a Fortaleza, dessa feita para defender o Ferroviário.

Jogou no Ferroviário até 1967, quando completou 36 anos e resolveu encerrar a carreira.  Mas não abandonou o futebol, sua grande paixão. Aceitou um convite do Tiradentes, o time da Polícia Militar do Estado, para ser o seu treinador. Depois foi técnico do Guarani, de Sobral, Salgueiro, de Salgueiro (PE) e seleções de Marcanaú, Juazeiro e Tauá.

Em 1972, quando era técnico da Seleção de Juazeiro, levou consigo o atacante Geraldino “Saravá”, que tempos depois se tornou o maior artilheiro da história do estádio “Castelão”. Apesar de não ter muita intimidade com a bola, “Saravá” era um daqueles jogadores que se podia chamar de “matador”. Batia na bola como poucos, sempre escolhendo os cantos da goleira.

Damasceno prezava muito as amizades. Tanto é verdade que resolveu abandonar a carreira de treinador depois que o ex-zagueiro e seu grande amigo, Pedro Basílio, ter sido dispensado do Fortaleza, onde era o técnico. Foi uma injustiça muito grande, já que sob seu comando o time ganhou um turno invicto. Bastou perder o primeiro jogo no returno para ser mandado embora.

Damasceno morreu no dia 12 de outubro de 2008, aos 72 anos de idade, deixando 12 filhos e sete netos de dois casamentos. Na sua brilhante carreira, o “príncipe” Damasceno ganhou o troféu “Personalidades Esportivas Flávio Ponte”,  em 10 de dezembro de 2001.

Mesmo tendo sido um dos mais importantes jogadores na história do futebol cearense, o “Príncipe” ganhou muito pouco em sua carreira. Conseguiu uma aposentadoria por idade, graças a ajuda de um amigo do INSS, quando completou 65 anos.

Quando jogava, a situação era difícil, não guardou nem um documento que comprovasse o tempo de trabalho. A casa onde morava, no Bairro Vila União, foi construída na década de 1980, graças a ajuda de familiares. Isso, muito tempo depois de ter abandonado o futebol. (Pesquisa: Nilo Dias)

Seleção Cearense de 1954. Damasceno é o quinto em pé, a contar  da esquerda para a direita. (Foto: "Jornal Pequeno")