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terça-feira, 12 de maio de 2015

O Dragão das Alterosas

No dia 15 de novembro de 2013, o Pouso Alegre Futebol Clube da cidade mineira de Pouso Alegre, completou 100 anos de existência. No entanto, o que era para ser uma data festiva, passou despercebida na cidade sulmineira de cerca de 140 mil habitantes. 

O time está parado desde 2009. Seu último jogo foi um empate em 1 X 1 com o Tombense, dia 28 de novembro daquele ano, em jogo disputado na cidade de Tombos e válido pelo hexagonal final da Segunda Divisão. O “Estádio da Lema”, palco de gols e vitórias do chamado “Dragão das Alterosas”, está abandonado.

O Pouso Alegre Foot Ball Club foi fundado no dia 15 de novembro de 1913, por iniciativa de um grupo de alunos do Ginásio São José, atual Colégio São José, que costumavam se reunir para animadas ”peladas” no campinho de terra batida ao lado do matadouro, perto da linha do trem.

Como muitos desses jovens trabalhavam, os encontros se realizavam entre 7 e 8 horas da manhã. Um dia eles decidiram formar um time e batizá-lo com o nome da cidade. Marcaram uma reunião para o dia 15 de novembro, na casa de Alfredo Ennes Baganha, depois eleito o primeiro presidente da agremiação.

Ele, juntamente com os companheiros João Dantas, Porfirio Ribeiro de Andrade, Pedro Cunha, Eduardo Gouveia, Alfredo Agueda e Pedro Narciso deram início a trajetória centenária do clube.

Era uma época bastante difícil para se manter um clube de futebol em atividade constante, por isso ao final da década de 1910, o clube caíra no ostracismo. Foi somente em 1928, ajudado por torcedores,  que o time rubro-negro voltou a aparecer com destaque.

O clube foi um dos fundadores da Liga Sul Mineira de Football no dia 19 de abril de 1920, juntamente com as equipes de Itajubá e Santa Rita do Sapucaí, com a finalidade de realizarem um torneio futebolístico entre si.

Nessa reunião, entre as diversas resoluções discutidas, os três clubes decidiram as cores de seus uniformes, com o Pouso Alegre escolhendo o preto e vermelho, que desde então compõem oficialmente o fardamento do clube.

No dia 28 de setembro de 1928, reunidos no Fórum de Pouso Alegre, Alfredo Baganha e José Nunes Rebello, lavraram a ata de compra de um terreno localizado no alto da Rua Comendador José Garcia. O valor da compra foi de 8 contos de réis. Ali, naquele terreno, seria construído o futuro estádio do Pouso Alegre Futebol Clube.

Sabe-se que o clube passou uma lista entre os comerciantes da cidade, cujo montante chegou a 6 contos de réis. O resto da dívida foi pago com um empréstimo junto ao Banco da Lavoura, em promissórias assinadas pelo próprio José Rebello. O clube ganhava sua casa e os próprios jogadores transformaram a área em um campo de futebol.

A partir disso, já na década de 1930, muitos times paulistas começaram a jogar no Campo do Pouso Alegre, entre eles Guarani, Ponte Preta e o extinto Ypiranga. Nessa mesma época, foram criados e disputados vários torneios intermunicipais.

O primeiro jogo da história do clube aconteceu no dia 1 de março de 1914, um amistoso contra o Democratas, que terminou empatado em 0 X 0. O segundo compromisso foi contra o Santaritense, de Santa Rita do Sapucaí, com vitória rubro-negra por 2 X 1. Já como profissional, em seu primeiro compromisso, o Pouso Alegre goleou por 4 X 1 o São Lourenço, em 30 de julho de 1967.

Nesse jogo, o atleta foi o primeiro jogador a marcar gol pelo Pouso Alegre como time profissional. Já na “Segundona” do Mineirão, o primeiro a balançar as redes adversárias foi Marquinhos, diante do Flamengo de Varginha, em 1967.

Na Primeira Divisão Mineira coube a Valcir marcar o primeiro gol do Pouso Alegre. Foi contra o Esportiva, em 1989.

O primeiro jogo disputado no Estádio “Manduzão”, foi contra o Botafogo do Rio de Janeiro, que venceu por 1 X 0. O recorde de público até hoje no estádio foi no jogo Pouso Alegre 3 X 3 Atlético Mineira, realizado dia 30 de maio de 1990, com 6.670 pagantes.

O primeiro jogo do Pouso Alegre fora de Minas Gerais aconteceu no dia 30 de setembro de 1928, em Bragança Paulista, quando empatou em 3 X 3 com o Bragantino. Sabe-se que aproximadamente seis mil pessoas assistiram o confronto, que foi organizado pelo então presidente do “Dragão das Alterosas”, desportista Vinicius Meyer.

Um fato que revoltou os torcedores do Pouso Alegre, e até hoje é lembrado com indignação, aconteceu no dia 4 de julho de 1928, na cidade de Santa Rita do Sapucaí, num jogo contra o time local do Conceição dos Ouros, na decisão de um torneio regional.

O Pouso Alegre vencia por 3 X 1, gols de Jovino, Guido e Paraguay, quando o juiz da partida resolveu ajudar o time da casa, marcando duas penalidades máximas inexistentes, quando faltavam menos de 10 minutos para o fim do jogo.

Revoltados, os cerca de 400 torcedores pouso-alegrenses, que haviam se deslocado até Santa Rita do Sapucaí de trem, invadiram o campo e interromperam o duelo, antes que o árbitro marcasse outra penalidade.

O time conta com o apoio da imprensa da cidade. A Rádio Clube foi a primeira a transmitir um jogo do Pouso Alegre Futebol Clube. Isso foi na década de 1940, um amistoso contra o Smart Futebol Clube, da cidade de Itajubá, O Pouso Alegre ganhou por 4 a 0, gols de Lucindo (2), Voador e Miquica. Na época, a Rádio Clube era comandada por Orfeu Butti e tinha como narrador, José Brito.

No início do futebol profissional em Pouso Alegre, nos anos de 1967 e 1968, o público lotava o “Estádio Comendador José Garcia” nos dias de jogos do rubro-negro. E naquele 15 de setembro de 1968 não foi diferente. O Pouso Alegre Futebol Clube disputou um amistoso contra o Grêmio Recreativo Beta, time amador de São Paulo e venceu por 38 X 0.

Ao final do primeiro tempo o escore já era de 17 X 0. Foi um recorde mundial na época, que teve como árbitro Armando de Barros. O Pouso Alegre mandou a campo nesse jogo que se tornou histórico, a seguinte formação: Luiz Carlos – Murilo - Marco Ambar - Bolinha e Gato (Bata) - Mica e Mário Jorge - Serginho (Joviano) – Wilson - Renê e Marquinho.

No final da década de 1940, mais precisamente no ano de 1947, foi fundada a Liga Esportiva Municipal de Amadores (LEMA). A entidade, que teve como primeiro presidente Pardal Vilhena de Alcântara, passou a organizar as competições e muitos times amadores apareceram na cidade, fazendo frente ao Pouso Alegre.

Com o fortalecimento de outros times, o Pouso Alegre FC acabou entrando em recesso das competições amadoras no início da década de 1950. E com isso a Liga passou a administrar o Estádio do clube, o que levou a todos a chamarem de "Estádio da LEMA". Nesse mesmo período, foram construídos os primeiros lances de arquibancada e o muro que cerca o gramado.

Começaram também os torneios intermunicipais, com equipes de Itajubá, Santa Rita do Sapucaí, Paraisópolis e Ouro Fino. Os deslocamentos eram feitos nos trens da Rede Mineira, causando grandes alvoroços nas estações das cidades onde chegavam.

Entre os jogadores que ganharam mais destaque nessa história centenária, vale a pena lembrar de “Paulo da Pinta”, o atleta que mais defendeu o time nesses 100 anos do clube. Jogava de volante e vestiu a camisa rubro-negra em 184 partidas, tendo marcado 22 gols.

Outro que fez por merecer destaque é Heleno, atacante que chegou ao clube em 1987, vindo do Yuracan, de Itajubá. Nos 166 jogos que disputou com a camisa do “Dragão das Alterosas” marcou 52 gols. Depois dele, vem que fez 46 gols em 199 partidas disputadas.

Quem também é lembrado pelos torcedores rubro-negros é Luiz Carlos, um goleiro que demonstrou grande amor ao clube, tanto que vestiu a camisa número 1 do Pouso Alegre em 1967 e 1968.

Mesmo tendo ficado pouco tempo no clube, chegou a recusar uma proposta do Santos Futebol Clube, que na época tinha Pelé, o “Rei do Futebol”, para continuar defendendo o “Dragão das Alterosas” na Segunda Divisão do Campeonato Mineiro.

Em 1967 o Pouso Alegre disputou a sua primeira competição profissional, a Segunda Divisão do Campeonato Mineiro. Conseguiu o feito de ser campeão da Chave Sul do torneio e classificou-se para as finais, mas acabou perdendo a vaga nos tribunais, por incluir um atleta em condição irregular.

Embora isso tenha tido o efeito igual ao de um balde de água fria no ânimo dos jogadores, o time voltou no ano seguinte a disputar a mesma competição, sendo eliminado logo na primeira fase do certame. Atolado em dívidas, o clube voltou a fechar as portas em 1968.

Para piorar a situação do futebol na cidade, a LEMA, que dirigia os torneios amadores no município, também encerrou suas atividades no final da década de 1960.

Pouso Alegre só não ficou sem futebol graças a persistência de alguns clubes amadores da cidade. A década de 1970 ficou marcada pelos torneios regionais que contavam com a participação de jogadores consagrados no futebol paulista, ou que viriam fazer sucesso nos gramados do Brasil.

Nesses torneios sempre apareciam no “Alto da Comendador”  nomes de jogadores famosos como Jorge Mendonça, Oscar, Polossi, Odirlei, Estevão e Neto. Nesse mesmo período surgiram novos valores do futebol da cidade, como Zé Carlos "Espoleta", Paulo da Pinta, Betão, Hermínio, Juninho Coldibelli, Amarildo e Silvano.

No início da década de 1980, a Liga Municipal foi reativada, o que fortaleceu a disputa dos torneios amadores da cidade, que não haviam parado de se realizar.

E ao mesmo tempo surgiram boatos da volta do Pouso Alegre ao futebol, o que se confirmou em 1983. Ainda como amador, o clube foi campeão da Copa Sul Mineira, o equivalente a campeão amador do Estado, montando um grupo somente com jogadores da cidade.

Foi a maior conquista do Pouso Alegre. A competição foi disputada por mais de 30 equipes. O jogo final foi entre Pouso Alegre X Curvelo.

Em 1984 o time foi novamente profissionalizado e disputou a Segunda Divisão do Campeonato Mineiro. Em 1988, o objetivo foi alcançado, o acesso a Primeira Divisão do Campeonato Mineiro.

Foi uma conquista sofrida contra o Atlético de Três Corações. A última partida daquele certame ficou conhecida como "A Batalha de Três Corações". O jogo não teve fim e o resultado, que favorecia o Pouso Alegre só saiu meses depois, já em 1989, após intervenção judicial.

Com o acesso garantido na Justiça, o Pouso Alegre Futebol Clube estreou no Campeonato Mineiro, com este já em andamento. Em razão disso se viu obrigado a jogar até três vezes por semana. Ainda assim, o time conseguiu manter-se na elite do futebol mineiro.

O ano de 1990 foi o melhor do Pouso Alegre, na elite do futebol mineiro, quando alcançou o seu maior feito no futebol profissional. Disputando um campeonato com 18 participantes, chegou na quinta colocação, com um time que certamente ficou para sempre gravado na memória de seus torcedores: Paulo César – Edvaldo – César - Zigomar e Nonato – Alcinei - Paulo da Pinta e Fernando Baiano – Heleno - Carlão e Anderson.

O time tinha excelentes atletas, inclusive um jogador com passagem pela Seleção Brasileira. O lateral direito do “Dragão” naquele ano foi Edevaldo de Freitas, ou simplesmente Edvaldo, que chegou a disputar a Copa do Mundo de 1982, fato que poucos se recordam. O lateral era reserva de Leandro na ocasião.

Fazer futebol profissional precisa não só de boa vontade, mas também de muito dinheiro, apoio e estrutura. E a falta disso foi fundamental para que o Pouso Alegre conseguisse manter aquele elenco supervalorizado e o time foi se desfazendo.

Nos anos seguintes, o time foi perdendo força até que em 1992 caiu para o Módulo II do Campeonato Mineiro. Nem ai resistiu, tendo de licenciar-se em 1998. Ficou inativo até 2009, quando voltou à “Segundona” mineira, tendo realizado uma boa campanha, terminando o certame na quinta colocação.

O incrível é que o time tenha sido obrigado a jogar suas partidas fora de casa, pois o estádio da cidade, que é da prefeitura, não teve manutenção e encontra-se em péssimas condições.

Isso lovou o clube a um novo licenciamento que perdura até hoje, com negras perspectivas para o futuro. Mesmo a cidade contando com o “Estádio Municipal Irmão Gino Maria Rossi, conhecido por “Manduzão”, com capacidade para receber até 17 mil torcedores. 


O jornalista Donizeti Barbosa, uma verdadeira enciclopédia do Pouso Alegre, há 20 anos reúne fotos e dados do clube fundado em 1913. São mais de 200 páginas com fichas de escalação, imagens e curiosidades, como o registro da primeira equipe montada em 1914 e o placar da maior goleada da história da equipe: 38 X 0 sobre o Beta de São Paulo, em um amistoso em 1968.

Segundo o jornalista, foram 494 jogos oficiais do Pouso Alegre, entre eles seis jogos contra o Atlético Mineiro, que nunca venceu o rubro negro. Foram 204 vitórias, 151 empates e 139 derrotas. Seis desses jogos foram contra o "Galo", que nunca venceu o Pouso Alegre. Nem no "Mineirão" e no "Independência" e muito menos no "Estádio da Lema". (Pesquisa: Nilo Dias)



O time de 1990. (Foto: http://pousoalegrefc.blogspot.com.br/)